A CSP-Conlutas tem como tema de seu I Congresso Nacional o lema: “Avançar na organização de base”. Para embasar este tema é importante reviver as lutas do movimento operário brasileiro e recordar suas histórias, particularmente durante o período da ditadura militar, quando os trabalhadores lutaram por suas reivindicações como aumento salarial e direito de organização, e também contra o regime autoritário.

Por isso a central realizará um ato durante seu I Congresso, cujo tema será “Ditadura Militar, anistia política e direito de organização de base” no sábado, dia 28 de abril, às 20 horas na Estância Árvore da Vida, na cidade de Sumaré (SP).

Esta é uma iniciativa da CSP-Conlutas e suas entidades, destacadamente o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e a Federação Sindical e Democrática dos Metalúrgicos de Minas Gerais, e terá como convidados além de entidades filiadas a outras centrais e movimentos, representantes da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de São Paulo.

Crimes de lesa-humanidade
não podem ser anistiados

No dia 19 de março o jornal Folha de São Paulo publicou um editorial com o titulo “Respeito à Anistia”. Nele o jornal defendeu que a “Iniciativa de denunciar militares por seqüestros durante a ditadura militar é tentativa canhestra de burlar uma decisão do Supremo” . Afirmando que, quando julgou a Lei da Anistia em 2010, o STF (Supremo Tribunal Federal) entendeu que “seus efeitos se aplicam tanto aos integrantes de organizações da luta armada quanto aos agentes do Estado que tenham cometido crimes políticos ou conexos” .

Por isso atacou a iniciativa do Ministério Público Federal do estado do Pará de pedir a prisão do coronel da reserva Sebastião Curió, por seqüestro qualificado de cinco pessoas na guerrilha do Araguaia. Baseados no preceito legal de que seqüestro é considerado um crime permanente, e como os corpos dos militantes não foram encontrados, o ato criminoso persiste até hoje. A tese foi rejeitada na primeira instância, mas os procuradores vão recorrer.

Para a Folha, “ao buscar punição para militares anistiados, tenciona o ambiente já dificultoso para instalação da Comissão da Verdade” . Para ela o objetivo da comissão é de somente dar acesso a documentos do período de 1946 a 1988 para clarear o registro histórico e não punir os criminosos e torturadores da ditadura militar. O jornal Globo acompanhou o tom da Folha, no editorial “Sem vencidos e vencedores”.

Notadamente, a decisão do STF além de incorreta é ilegal, pois reverte o conceito de como devem ser julgados os crimes contra a humanidade ocorridos em qualquer ditadura, particularmente quando envolve crimes como ocultação de cadáver ou seqüestro. Uma legislação não pode estar acima da defesa dos cidadãos contra um Estado que tortura, seqüestra, estupra e assassina. Não pode servir para protegerem criminosos ou encobertar crimes.

O Brasil, além disso, reconhece o conceito de “crime contra a humanidade”, por isso deve aceitar a jurisprudência das instâncias penais internacionais. Com isso a legislação nacional deve se subordinar aos acordos internacionais jurídicos.

Os tratados internacionais e a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, aos quais o Brasil está submetido, determinam que crimes de lesa-humanidade (tais como a tortura) são imprescritíveis e impassíveis de anistia.

Tanto é assim que esta Comissão Interamericana da OEA decidiu que o Estado brasileiro deve investigar a morte do jornalista Vladimir Herzog, ocorrida no DOI-Codi de São Paulo, em 1975. E o Brasil foi condenado pela mesma Corte pelo desaparecimento de militantes na Guerrilha do Araguaia.

Por fim, o artigo 1º, parágrafo 2º da Lei da Anistia afirma: “Excetuam-se dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal”.

Portanto, os envolvidos em terrorismo de Estado devem sim devem ser punidos. Senão de fato esta anistia somente valerá para um lado. Pois os que lutaram contra a ditadura, cometeram atos contra um regime de exceção, e em geral, já foram punidos.

A não punição dos envolvidos em crimes do regime militar configura violação de convenções internacionais ratificadas pelo Brasil. Devem ser punidos não somente os criminosos que realizaram diretamente os crimes, mas também os que os apoiaram e financiaram, de maneira que fiquem intimidados a não repeti-los.

Comissão Parlamentar da Verdade, Memória e Justiça
Insatisfeitos com a lentidão da presidente Dilma Rousseff em indicar os nomes e instalar a Comissão da Verdade, que apesar de criada há quatro meses não teve nem sequer seus membros designados para iniciar seus trabalhos, parlamentares decidiram criar uma investigação paralela ao governo.

É a Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça formada pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e coordenada pela Deputada Luiza Erundina (PSB). Ela é autora do projeto que revê a interpretação da Lei da Anistia para punir os criminosos que agiram na ditadura.

Quando o Congresso Nacional aprovou, em 1979, a Lei da Anistia, por apenas cinco votos, constituía na época um avanço, pois os militares estavam enfraquecidos, mas ainda mantinham o controle do país, e intimidavam os lutadores sociais.

Os criadores da Comissão da Verdade impõem uma série de limites. Além de querer manter em sigilo os depoimentos das testemunhas, seu relatório final não será encaminhado à Justiça.

Isso deve ser mudado no sentido desta comissão identificar os agentes do Estado que participaram da repressão política para sua responsabilização, julgamento e punição exemplar.

Além de determinar oficialmente que o que houve no país por parte das organizações que lutavam contra a ditadura, ao invés de atos terroristas, pura e simplesmente, foram atos de uma luta de resistência.

Para que isso ocorra organizações de Direitos Humanos, sindicatos e entidades populares, devem se mobilizar e exigir que a Comissão da Verdade seja independente do governo, tenha orçamento condizente para a execução desse trabalho e reconhecimento da sociedade. Para que possa julgar e punir criminosos, ou então entregá-los nas mãos do poder judiciário. Somente assim a CNV não frustrará as expectativas da população e se fará justiça.

Américo Gomes é advogado com especialização em Política e Relações Internacionais, membro da Comissão de ex-presos e perseguidos da Convergência Socialista e do ILAESE