Há indícios de envolvimento de 283 parlamentares nas compras fraudulentas de ambulâncias. CPI só irá durar 30 dias, para não atravessar período da campanha eleitoralNesta quarta-feira, 14 de junho, depois de uma queda de braço de várias semanas, o Congresso criou a CPI mista para investigar os envolvidos no caso dos “sanguessugas”. Os partidos têm até a próxima terça-feira para indicar os membros da comissão. Fernando Gabeira (PV-RJ) deve ser o relator e Antonio Biscaia (PT-RJ) é o mais cotado para assumir a presidência da comissão.

O escândalo da máfia das ambulâncias veio à tona às vésperas do período eleitoral, complicando a imagem do Congresso mais uma vez. Desde o surgimento das denúncias, formou-se uma espécie de acordão entre os muitos deputados envolvidos para barrar a formação da CPI. O Congresso já havia remetido o caso ao procurador-geral da República Antonio Fernando Souza. Entretanto, as contradições abertas pela disputa entre PT e PSDB-PFL acabaram levando a que o requerimento pela abertura da CPI fosse assinado por 175 deputados e 32 senadores, números acima do necessário.

No dia 1º de junho, o Ministério Público Federal encaminhou à Justiça Federal uma denúncia contra 81 suspeitos de fazer parte do esquema. Essa denúncia e a própria criação da CPI partem das investigações da Polícia Federal, que concluíram a existência de uma fraude milionária na compra de ambulâncias e equipamentos hospitalares com dinheiro do Orçamento da União em prefeituras de seis estados (Acre, Amapá, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná e Rio e Distrito Federal). Nessas compras, o superfaturamento chegava a 110%, sendo que a propina resultante disso era dividida entre todos os envolvidos. A quadrilha teria movimentado pelo menos R$ 110 milhões entre 2001 e 2005.

Os acusados são enquadrados por crimes de corrupção ativa e passiva, fraude em licitações, crimes contra a ordem tributária e formação de quadrilha. Segundo o Ministério Público, o esquema envolve assessores parlamentares, servidores do governo federal, empresários e prefeitos, além de parlamentares e ex-parlamentares. A quadrilha liderada pelo empresário Darci Vedoin, dono da Planam, agia nos gabinetes do Congresso e do Ministério da Saúde.

Entre aqueles que não possuem imunidade parlamentar, vários já estão presos. A história veio a público quando, no dia 4 de maio, a Polícia Federal efetuou 44 prisões, como resultado da chamada Operação Sanguessuga, que vinha investigando o esquema há meses. Os suspeitos presos no dia 4 haviam sido soltos após decisão do TRF (Tribunal Regional Federal), que estendia o habeas corpus concedido a Carlos Rodrigues, ex-deputado pelo PL do Rio de Janeiro, aos demais presos na operação. No dia 24, no entanto, a presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministra Ellen Gracie, revogou a decisão e a polícia iniciou uma recaptura.

Se assessores e funcionários estão sendo presos, por outro lado, os parlamentares envolvidos não devem sofrer punições, mesmo com a criação da CPI. Entre os denunciados estão dois integrantes da Mesa da Câmara, Nilton Capixaba (PTB-RO) e João Caldas (PL-AL), e dois ex-líderes de bancada, Pedro Henry (PP-MT) e Paulo Baltazar (PSB-RJ). Há fortes indícios de envolvimento de pelo menos 45 deputados, número obtido com base na contabilidade da Planam e nas escutas telefônicas feitas pela Polícia. Entretanto, é provável que o número de parlamentares envolvidos seja muito maior.

Em seu primeiro depoimento, a ex-servidora da saúde Maria da Penha Lino, uma das suspeitas presas na operação, listou, de cabeça, 80 deputados e um senador envolvidos. Entretanto, posteriormente, ela entregou uma lista com os nomes de 283 parlamentares envolvidos. A relação estaria agora com o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes.

Tal lista teria sido obtida pois Maria da Penha teria feito um cópia de segurança dos computadores da Planam, que conteria não só a relação dos 283 parlamentares mas também a emenda, valor, município para quem foi destinada a ambulância e quem estava acompanhando execução do Orçamento.

Precavidos
Apesar do grande número de parlamentares envolvidos e da gravidade das acusações, o acordão estabelecido no Congresso atrasou a instalação de uma CPI. Ainda que tenha sido instalada agora, há um acordo para que a CPI trabalhe por 30 dias, prorrogáveis por mais 30. O regimento prevê que as CPIs durem entre 180 e 360 dias. Mas este prazo foi reduzido porque os parlamentares envolvidos, apesar de não terem conseguido evitar o escândalo, não querem ver tais investigações estampadas nos jornais em plena campanha eleitoral. A melhor opção foi fazer uma CPI a toque de caixa, rumo às eleições e à pizzaria.

Além disso, sabe-se que os parlamentares estão entre amigos e que, a exemplo dos resultados de todas as CPIs instaladas no ano passado, o mais provável é que prevaleça a pizza. No final, os maiores sanguessugas do país, que sugam as verbas públicas não só neste esquema das ambulâncias, permanecem impunes. Devem aparecer no horário político nos próximos meses, buscando votos para poder continuar sugando dos cofres públicos.