Existe uma enorme confusão sobre o sistema financeiro e sua relação com a crise. Setores da esquerda falam do capitalismo especulativo, que seria mau. Isso significa que existiria um capitalismo bom. Mas o capitalismo é um só.

Hoje, existe uma ligação muito estreita dos departamentos financeiros das grandes indústrias e redes de comércio com a especulação. Como um dos reflexos da queda da taxa de lucros, os capitalistas deslocam cada vez mais seus lucros para a especulação, na busca de lucros maiores. Trata-se do que Marx caracterizou como o capital fictício.

Só a produção real, no entanto, gera valor. Os ganhos do capital fictício são um jogo no qual, se alguém ganha, outro tem de perder. A especulação pode crescer da mais-valia criada pelo trabalho produtivo. Durante um período, porém, cresce como uma gigantesca pirâmide em que as pessoas vão ganhando enquanto conseguem adesões de outras.

Quando os ganhos no capital fictício são desproporcionais em relação ao mundo real, a pirâmide desaba. Acontece, como agora, uma crise que queima uma montanha de capital fictício e se estende à produção.

Com a globalização, este processo deu um duplo salto. Por um lado conseguiu uma enorme massa de mais-valia, ao reduzir os salários e as conquistas dos trabalhadores e impor a restauração no Leste. Com a redução das taxas de lucros, o deslocamento para a especulação financeira cresceu muito.

A desregulamentação imposta pela globalização levou a um completo recuo de qualquer controle estatal sobre o sistema financeiro. São as próprias instituições financeiras que controlam o mercado, como os famosos graus de risco.

As três maiores agências classificatórias de risco (Standard & Poor, Moody’s e Fitch) ganham muito para definir quem pode emprestar pra quem e a qual taxa de juros. Por exemplo, o grau de investimento dado para o Brasil foi uma definição de uma agência privada de classificação de risco, a Standard & Poor’s.

Ocorreu, também, outra mudança fundamental no funcionamento dos bancos. Antes, eles aceitavam depósitos e emprestavam dinheiro a empresas e pessoas físicas. Cobravam os empréstimos que faziam com juros maiores, tirando daí seus lucros.

Hoje, isso mudou. Entrou em cena em larga escala a securitização ou titularização. Os bancos transformaram as dívidas em títulos negociados no sistema financeiro. Um banco, por exemplo, transforma toda a sua carteira de hipotecas num título que é negociado por outra instituição.

Essa terceirização das dívidas permitiu um descolamento impressionante nos últimos 30 anos do sistema financeiro. Só o mercado de derivativos, uma forma de especulação, era, em 2006, seis vezes maior que o PIB mundial, ou seja, o valor de tudo o que foi produzido nesse ano. Nos EUA, os ativos financeiros passaram de cerca de 450% do PIB em 1980 para 1.000% em 2007.

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