(Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Um dia depois da votação no Chile que decidiu por uma nova Constituição no lugar da antiga, escrita e posta em prática durante a ditadura de Pinochet, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), veio a público defender uma nova Constituição para o Brasil. Mas de sinal inverso ao que a população chilena luta nas ruas há um ano.

Enquanto os trabalhadores e a juventude do Chile lutam por direitos sociais mínimos, como saúde, educação e aposentadoria públicas diante da privatização generalizada promovida pela ditadura chilena, o líder do governo Bolsonaro no Legislativo acha que a Constituição brasileira já garante muitos direitos. “Acho que devemos fazer um plebiscito como fez o Chile, para que possamos refazer a carta Magna e escrever muitas vezes as palavras deveres, porque a nossa Carta só tem direitos“, afirmou o deputado.

Para Barros, é esse “excesso de direitos” que estaria tornando o país “ingovernável”. Não é a gestão de um governo genocida responsável por 155 mil mortes que colocou o Brasil no topo dos países mais atingidos pela COVID-19. Aliás, o líder do centrão é adepto da chamada “imunidade de rebanho”, que é simplesmente deixar a doença rolar, e matar quantos tiver que matar. Tampouco é o avanço avassalador do desemprego, da pobreza e da miséria, resultados direto da política de seu governo. Não, para ele o problema é que você tem “muitos direitos”.

Quando assumiu a liderança do governo na Câmara, resultado da aproximação de Bolsonaro com o centrão, Barros elegeu a reforma administrativa como prioridade, e quem seriam seus inimigos? A COVID-19? O desemprego? Os bilionários que enriquecem em plena pandemia? Não, Ricardo Barros disse que iria enfrentar a “corporação dos servidores públicos”, para ele os grandes vilões do país.

Quando se refere a servidores públicos, Barros, evidentemente, não está incluindo os deputados e seus salários de R$ 33,7 mil, com os R$ 111 mil mensais de verba de gabinete que os parlamentares recebem para gastar a seu bel prazer.

O histórico da liderança de Bolsonaro ajuda a entender a sua peculiar noção de “direitos” e “deveres”. Dono de seis mandatos consecutivos na Câmara, Barros transitou com desenvoltura por diversos governos. Ocupou a liderança do então governo FHC, foi vice-líder nos governos Lula e Dilma, antes de ocupar o ministério da Saúde do governo Temer, entre 2016 e 2018. Período no qual é denunciado por um desvio de R$ 19 milhões.

Segundo a Procuradoria da República do Distrito Federal, o ministro pressionou para que houvesse uma compra desse valor referente a medicamentos para doenças raras. Os medicamentos nunca chegaram. Ricardo Barros também é denunciado por compra de votos na eleição de 2018, motivo pelo qual chegou a ter seu mandato cassado pelo TRE do Paraná. A decisão foi anulada, mas ainda corre ação do Ministério Público Eleitoral.

Finalmente, um escritório do deputado foi alvo de busca e apreensão pedido pelo Ministério Público do Paraná no mês passado. A investigação se refere a fraudes na contratação de energia eólica.

Fim dos direitos

A fala esdrúxula de Ricardo Barros foi contemporizada pelo governo, mas reflete bem a política do governo Bolsonaro em sua intenção de acabar com o que resta de direitos. Desde os direitos trabalhistas, minados pelos governos anteriores e reduzidos a pó por Bolsonaro, passando por direitos sociais, até a proteção ao meio ambiente e às populações indígenas. Não é por menos que Paulo Guedes seja um entusiasta da Constitução chilena, seu sonho é privatizar absolutamente tudo e transformar o Brasil num Chile piorado de dimensões continentais, proporcional à sua miséria e desigualdade.

Assim como Guedes, Ricardo Barros defende a “desindexação” do Orçamento para financiar o “Renda Brasil” no próximo ano. O programa é uma forma de “turbinar” o Bolsa Família e abranger mais 6 milhões às atuais 14 milhões de famílias atendidas hoje. Além de deixar ao leu algo como 40 milhões restantes que hoje dependem do auxílio emergencial, o dinheiro para esse programa viria das verbas da Saúde e Educação que, por hora, são “carimbadas” e têm destino obrigatório.

Como se vê, Ricardo Barros, assim como esse governo, defende mesmo o fim de todos os direitos. Menos o de continuar roubando e vivendo dos privilégios do cargo enquanto promove o desemprego, a fome e a miséria.

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