Ministro Romero Jucá, devedor do INSS, usa a mentira do déficit para limitar o acesso ao auxílio-doençaO povo votou em mudanças, acreditando na esperança que o governo Lula alterasse a política econômica do país segundo as premissas constitucionais da defesa intransigente da soberania, do respeito integral à dignidade da pessoa humana, da exigência e fiscalização do Estado para que haja responsabilidade social do capital à prevalência dos valores sociais do trabalho, com a erradicação da pobreza e da marginanalidade e redução das desigualdades sociais e regionais (CF, arts 1º, 3º, 7º), 170 e 193).

Preferiu, todavia, a continuidade da política ortodoxa que levou as diversas economias à ruína, a Àsia, a Argentina, dentre outras, produzindo 20 anos de mediocridade econômica na América Latina, como sintetiza Elio Gaspari na Folha de S. Paulo, “O FMI foi um bode empulhador“ (30/03/05).

Assim, mostrando-se um dos maiores defensores dos interesses do capital especulativo no Brasil, o governo Lula acaba de editar a Medida Provisória Nº 242 e o Decreto Nº 5.399 de 24 de março de 2005, ambos publicados no Diário Oficial da União em 28 de março.

A referida legislação, um pacotão tão nefasto aos interesses dos trabalhadores quanto a primeira reforma Previdenciária deste governo, que liquidou conquistas históricas dos servidores públicos, constitui um criminoso golpe, feito na calada da noite, enquanto todas as atenções estão voltadas para a luta de resistência contra o desmantelamento do movimento sindical e dos direitos trabalhistas e, ainda, das universidades públicas.

É criminosa essa ação deste governo. O que Lula e o PT acabam de fazer é aumentar de quatro meses para um ano a carência para concessão de auxílio-doença e impor, o que até agora não existia, carência, também de um ano, para a concessão de auxílio-doença acidentário (benefício concedido ao trabalhador em caso de doença). Ao mesmo tempo, as regras impostas pelo governo petista reduziram os valores pagos pelo INSS a título destes benefícios.

Como bem observado pelo professor e jurista João José Sady, “introduzir a carência para percepção do benefício acidentário é uma monstruosidade. O empregado vitimado por um acidente grave e que ficará meses sem poder trabalhar vai ter que sobreviver de esmola. A carência, em geral, é uma afronta ao princípio da dignidade humana. Neste andar da carruagem, vamos acabar decidindo quem deve viver e quem deve morrer, com base em critérios atuariais“.

O que Lula faz com este pacotão é condenar milhares de trabalhadores brasileiros, doentes ou vítimas de acidente de trabalho e, portanto, sem condições de trabalhar, à miséria e mendicância. Medidas terríveis que poderão inclusive agravar o estado de saúde destas pessoas, cabendo responsabilização do Estado, pelos danos então ocasionados, inclusive a indenização por dano moral.

Não há nada que justifique essa atitude do governo petista, muito menos o batido argumento de redução de déficit do sistema previdenciário, tão mentiroso quanto a justificativa do companheiro de Lula, Bush, para justificar sua invasão ao Iraque.
Isso porque, considerando o sistema de seguridade social como um todo, conforme define a Constituição Federal de 1988, ou seja, considerando a Saúde, a Previdência e a Assistência Social como parte de um mesmo sistema, bem como os gastos e arrecadação para área, o que temos não é déficit, mas sim superávit. Em outras palavras, se arrecada mais do que se gasta!

A grande questão é que mesmo sem renovar com acordo com o FMI, o governo Lula se comprometeu com o sistema financeiro internacional a manter as metas de superávit primário acordada com o Fundo. Esse superávit, responsável por grande parte das mazelas em que estamos mergulhados (caos na saúde, nas rodovias, na educação pública e um longo etc), é o dinheiro dos impostos destinados a atender as necessidades do povo brasileiro, mas não gastos pelo governo, que é utilizado para pagar juros da dívida externa.

O que o governo Lula não fala, e tampouco a mídia, é que este ataque aos direitos previdenciários dos trabalhadores está a serviço de garantir este maldito superávit primário, ou seja, o pagamento dos juros cobrados pela agiotagem internacional!
Encerro fazendo minhas as palavras do médico pneumologista e do Trabalho, Jefferson Benedito Pires de Freitas, presidente da Comissão de Doenças Ocupacionais e Ambientais da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Professor da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo, citadas em artigo do amigo e jurista da classe operária Luiz Salvador, publicado na revista “Consultor Jurídico”, no dia 25.

“Mais uma decepção com um governo que se elegeu com propostas de mudança. Um governo que se dizia dos trabalhadores, dia após dia apenas reproduz políticas neoliberais, reproduzindo tudo aquilo que condenou e o fez se eleger em 2002. Agora quem deve padecer mais uma vez são os mais fracos da cadeia. A tal reforma da Previdência anunciada no dia de hoje demonstra de forma cabal mais uma traição a todos aqueles que depositaram seu voto no PT. Ora em vez de se combater a fraude, identificando e punindo os fraudadores, se pune toda uma população que é beneficiária da Previdência, cujo único “crime“ que cometeu foi adoecer e tentar por isto sobreviver com que lhe é de direito.

Não é digno para quem sempre combateu injustiças ao chegar ao poder, renegar todo seu passado, fazer alianças com as forças políticas mais retrógradas da nação a quem sempre combateu nos seus 25 anos de luta (ou seriam 23, descontando os 2 de governo da situação) e que para combater as fraudes da Previdência a primeira medida anunciada de forma pomposa é a modificação do auxílio-doença. Será que os ex-companheiros desconhecem a situação de inúmeros trabalhadores que gravitam no desemprego, que não conseguem se inserir novamente no mercado formal de trabalho, que estão a procura de trabalho a 1, 2, 3 anos e por conta disto não conseguem readquirir sua situação de segurado e todo o tempo de contribuição que muitos já tem não serve para nada.

Será que os ex-companheiros desconhecem a situação de inúmeros trabalhadores portadores de doenças relacionadas ao trabalho, seqüelados por acidentes do trabalho ou mesmo doença comum e que por estarem desempregados não conseguem auferir recursos para continuar contribuindo com a Previdência e que com muito sacrifício, muitas vezes com ajuda externa (se quiserem exemplo, mato a cobra e mostro a cobra) de profissionais que atendem estes trabalhadores, tentam contribuir com a Previdência por 4 meses para readquirirem a condição de segurado e fazerem jus a um mísero salário-mínimo, para tentarem sobreviver, uma vez que se encontram desempregados e doentes.

Que partido é este que se diz dos trabalhadores, mas apenas mantém, implementa e aprofunda uma política de perda de direitos dos trabalhadores já iniciados nas gestões anteriores? Vocês não têm o direito de tirar o sonho de milhares de pessoas que acreditaram em mudanças e pensaram que pela primeira vez o jogo se não mudasse de placar, pelo menos endureceria bastante para aqueles que sempre exploraram esta população. Militando há mais de 15 anos na área de Saúde do Trabalhador, só posso afirmar que a decepção, o desânimo, a falta de perspectiva, o clientelismo, a constatação do oportunismo freqüente, só são superados com medidas como esta anunciada, pois ao invés de nos atirar de vez no poço, reacende nossa chama de indignação“.

Portanto, à luta ativistas do movimento social e juristas comprometidos com a classe trabalhadora. Mais do que nunca se faz necessário derrotar este governo e suas reformas neoliberais.

*Adriano Espíndola Cavalheiro é advogado em Uberaba (MG), especialista em Direito do Trabalho e Direito Sindical e militante do PSTU.