“A iniciativa privada é a protagonista do PAC”, afirma o governoEm determinado momento das mornas eleições de 2006, Lula, então candidato à reeleição, abriu larga margem sobre seu adversário, o tucano Geraldo Alckmin. Não contando com nenhuma medida em seu programa de governo que o diferenciasse do candidato do PSDB, o candidato petista centrou sua campanha no ataque às privatizações de FHC. Dito e feito. Lula passou a subir na intenção de votos e, amparado no medo da “volta da direita”, levou fácil as eleições.

No entanto, agora, o governo do PT resolveu tirar de vez a máscara e promover uma nova rodada de privatizações. Se antes a entrega de setores públicos ao capital privado ocorria de forma enviesada através das Parcerias Público-Privadas (PPP), agora a privatização se dá às claras. A rodada de licitações iniciada pelo governo inclui obras de infra-estrutura, num total de 66 obras até 2008, negócios que envolvem mais de R$ 48 bilhões.

O pacote de privatização conta com a venda de, entre outras coisas, estradas, ferrovias e portos. A principal venda será a de duas usinas hidrelétricas do complexo do rio Madeira, avaliadas em R$ 19 bilhões. A rodada de privatizações faz parte do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) lançado por Lula no início do ano. O próprio governo admite que o principal pilar do plano é a concessão de obras e serviços públicos à iniciativa privada. “Não podemos dizer que o PAC é um projeto estatal. O PAC é demandado pelo governo e executado pela iniciativa privada. A iniciativa privada é a protagonista do PAC”, afirmou recentemente a atual ministra da Casa Civil, Dilma Roussef.

Os primeiros alvos
A nova farra das privatizações teve início no último dia 3 de outubro, com a concessão da ferrovia Norte-Sul, que liga Belém (PA) a Anápolis (GO). A licitação concedeu o direito de exploração sobre o trecho de 720 quilômetros que parte do Maranhão e segue até Palmas, capital do Tocantins. A Vale do Rio Doce comprou a estrada de ferro por R$ 1,48 bilhão.

A ferrovia começou a ser construída ainda durante o governo Sarney, sendo paralisada depois de escândalos no favorecimento das licitações das obras. Lula, para agradar o agora senador José Sarney, deu seqüência às obras. Agora, depois de investimentos graúdos realizados no decorrer de anos pelo orçamento público, o governo entrega sua exploração ao capital privado. Essa é a lógica das privatizações.

Mais pedágios
Foi a mesma lógica que predominou no último dia 9, quando o governo entregou à iniciativa privada um lote de sete estradas federais, incluindo a Fernão Dias, que liga Belo Horizonte (MG) a São Paulo e a Régis Bittencourt, que vai de São Paulo a Curitiba (PR). Cinco dos lotes, incluindo as duas principais rodovias, foram comprados pela multinacional espanhola OHL, que adquiriu os direitos de exploração das estradas pelos próximos 25 anos.

Com a série de praças de pedágios que as empresas espalharão pelas rodovias, ficará mais caro viajar. Só no trecho entre a capital paulista e a paranaense, por exemplo, a OHL vai fincar seis pontos de pedágio. Na Fernão Dias, serão oito.

“O presidente Lula está muito satisfeito”, chegou a afirmar o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, após a venda. O governo anunciou as privatizações como uma verdadeira vitória, argumentando que as empresas investiriam pesado na manutenção das rodovias. Pouco divulgado, no entanto, foi que grande parte do investimento privado será financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ou seja, assim como ocorreu no governo FHC, o dinheiro público será usado para financiar o lucro privado.

Segundo o próprio vice-presidente da empresa espanhola no Brasil, Felipe Ezquerra, o BNDES financiará até 70% dos investimentos que o grupo deve fazer nos primeiros anos da concessão. Pode parecer estranho, mas é a lógica das privatizações. A lógica do governo Lula.