Cem dias de chuva não bastaram para que governantes agissemAs chuvas castigam o estado de Santa Catarina há mais de cem dias. Neste final de semana, se intensificaram. Pela imprensa, sabemos que pelo menos 33 pessoas morreram devido a desabamentos e enchentes. Na TV e na rádio, governadores, prefeitos e outras autoridades anunciam medidas para socorrer as vítimas.

Pelo tamanho da tragédia, que já desabrigou mais de 19 mil pessoas e deixou quatro cidades isoladas, percebe-se que elas chegaram tarde demais e que havia muito pouco preparo para enfrentar a situação. Isso depois de cem dias de chuvas torrenciais. Segundo cálculos da Defesa Civil, o número de afetados pela enchente é de mais de 1,5 milhão de pessoas.

Neste domingo, eu seguia de ônibus em direção ao Paraná, pela BR 101. Ao passar por Itajaí (SC), uma das cidades mais castigadas pelas chuvas, paramos próximo do que sobrou da rodoviária, praticamente coberta pela água.

Lá de dentro um grupo de mulheres (algumas grávidas) e crianças carregando malas e sacolas atravessam o estacionamento com água na altura dos joelhos. Passam pelo estacionamento onde há carros cobertos pela água. Algumas entram em nosso ônibus e contam que suas casas estão alagadas e que pretendem fugir para outras cidades no Paraná, buscando refúgio com familiares.

À frente, cruzamos com mais destruição. Cidades inteiras debaixo d´água. Pequenos barcos cruzam ruas e avenidas, desviando de carros, postes e placas de trânsito. O famoso balneário Camboriu é um dos poucos lugares onde a enchente não causou grande destruição. Os prédios e condomínios de luxo não estão inundados e se encontram vazios nesta época do ano.

Na rodoviária da cidade, pessoas se amontoam para fugir. Um pouco mais à frente, porém, uma barreira e o alagamento da pista impedem que os veículos prossigam. Outro alagamento na BR-101, na altura de Tijucas, impede também que as pessoas voltem para Florianópolis. Dez trechos de rodovias estaduais e nove de federais estão interditados em razão das chuvas.

Na estrada, um integrante da Defesa Civil relata algumas histórias de resgate de pessoas da região e diz que temos de voltar. De volta à rodoviária de Camboriu, as pessoas se preparam para passar a noite. Lembro dos prédios de luxo que continuam secos e vazios esperando o verão.

Na hora do almoço de hoje (segunda-feira) já era possível pelo menos retornar a Florianópolis. Mas a BR 101 segue bloqueada nas duas pontas. Uma das mulheres, grávida de nove meses, que estava no ônibus foi obrigada a vender sua passagem para dar de comer aos seus três filhos. Ela foi deixada pra trás sem dinheiro e com dores na barriga.

Era possível pelo menos minimizar os impactos desta tragédia. As autoridades e governos tiveram cem dias para atuar preventivamente, removendo a população em áreas de risco e mobilizando o possível em infra-estrutura para atender os desabrigados. Mas só resolveram fazer alguma coisa no centésimo primeiro dia de temporais.