China, Índia e Rússia já não são mais a esperança das potências imperialistas para sair da profunda crise que atravessa a economia capitalista mundialDurante meses, escutamos uma ladainha dos economistas a serviço da burguesia. Segundo eles, os países chamados de emergentes, ou seja, Brasil, China, Índia e Rússia seriam a saída para crise internacional. Por sua produção que batia recordes, em especial no caso chinês, se tentava vender a idéia de que esses países poderiam ser uma alternativa para manter os mercados internacionais funcionando com força ou pelo menos evitando uma recessão mundial.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) acaba de informar oficialmente que esses países entraram num processo de forte desaceleração. Em outubro, o índice ficou abaixo de 100 para os três países. Isso configura a desaceleração mais expressiva dos emergentes dos últimos anos e foi vista pela OCDE como um fator relevante de risco para a crise atual.

O maior impacto foi sentido pela Rússia, cujo índice ficou em 92,4, uma queda de quatro pontos em relação a setembro. No caso da China, o recuo foi de 1,7 ponto, para 93,4. A Índia perdeu 1,1 ponto, para 94,8. Na comparação anual, esses países apresentam retrações ainda mais fortes – de 10,5 pontos na Rússia, sete pontos na China e 6,6 pontos na Índia.

Acabou a farsa do descolamento: a crise chegou à China
Aqueles que faziam a propaganda enganosa sobre o pretenso poder da China para evitar a recessão mundial omitiam um problema estrutural daquele país: seu papel na divisão internacional do trabalho que leva a uma dependência extrema da economia chinesa aos investimentos externos e às exportações. Em junho, ainda se acreditava que os preços mais baixos praticados pelas indústrias chinesas, baseados na feroz exploração da classe trabalhadora, seriam capazes de manter as exportações em níveis suficientes para manter os negócios. Mas isto não ocorreu.

O próprio Banco Mundial e os órgãos governamentais da China começaram a acender a luz vermelha. As notícias dos sites chineses mostram um agravamento muito grande. O insuspeito Fórum de Davos já declarou publicamente que espera um crescimento de cerca de 5 a 6% para 2009. A maioria dos economistas calcula um crescimento entre 5 a 8% no último trimestre de 2008 e um índice anual não maior que 8%, contra 9% previstos há apenas um mês. A crise chegou à China.

Dados da crise
Vejamos os dados da economia chinesa nos últimos meses segundo informes dos jornais especializados em economia e a agência oficial Xinhua.

Indústria siderúrgica e de transformação
As siderúrgicas chinesas cortaram pedidos de compra das mineradoras australianas e da Vale. As ações delas caíram 25%, em especial por causa dos cancelamentos de pedidos chineses. Além dos problemas de preços, o fato é que a procura na construção civil e a exportação caíram, levando os chineses a cortar pedidos de minério. Atualmente, a China é a maior exportadora de aço do mundo (um oitavo da produção de 2007), mas a exportação chinesa nos primeiros nove meses de 2008 caiu 11,6%.

Segundo a Associação de Ferro e Aço, em outubro, mais de 40% das pequenas e médias empresas fecharam nas províncias de Hebei e Henan. A falta de demanda causou uma queda de até 60% nos preços, reduzindo ainda mais a taxa de lucro. A maioria das médias e pequenas empresas metalúrgicas da província está fechando depois de ter experimentado um verdadeiro boom em 2007. Em setembro, 23 de 71 grandes e médias metalúrgicas declararam prejuízos, alcançando perdas totais de 1,15 bilhão de yuan, a moeda chinesa. Em outubro, a porcentagem dos declarantes de prejuízo aumentou para 60%.

Mesmo as maiores (Baosteel, Shougang, Angang) cortaram sua produção em 20% devido à retração e à queda na taxa de lucros.

Setor Imobiliário
Para se ter uma idéia do atual estado do setor, apenas 69 residências foram vendidas na primeira semana de outubro em Pequim, com 18 milhões de habitantes. Isso representa uma queda de 72% em relação à mesma semana do ano passado.

O mercado imobiliário é chave para os planos chineses de expandir o mercado doméstico, pois é responsável por um quarto dos investimentos internos em infra-estrutura. Mas a procura por novos imóveis caiu para o mesmo nível de dez anos atrás. Os preços ainda não caíram, mas estão tendo alta em ritmos bem menores.

Segundo a agência Xinhua, o aumento da inversão no setor imobiliário de China se desacelerou 1,9% entre janeiro e outubro. Devido à recessão no setor, a superfície de terrenos adquiridos por construtoras se reduziu em 5,6%. Os preços das casas estão caindo, semelhante ao processo de bolha imobiliária vivido recentemente nas economias dos países centrais. Há regiões, como Shenzen, em que a queda já chegou a 30% em um ano.

Indústria leve: têxtil , brinquedos, relógios
O investimento na indústria têxtil caiu abaixo da média dos últimos dez anos. Os lucros caíram para 19,4%, uma redução anual de 17,6%.

Nos últimos seis meses, ocorreu uma queda alarmante nas vendas. O fechamento provisório de pequenas e médias empresas e a mecanização das maiores criou um grande exército de semidesempregados não-qualificados na região.

A indústria de brinquedos e outras manufaturas leves, como relógios, está numa queda acelerada por uma razão: esta é a mais afetada pela queda das exportações.

Outras Exportações
A Exportação de cimento da China registrou uma queda considerável entre janeiro e agosto. Nos oito primeiros meses, as exportações de cimento tiveram uma queda violenta de 22% em conseqüência da queda da procura dos países imperialistas, em especial EUA e União Européia. Ao mesmo, a demanda do mercado interno chinês está caindo. As exportações de carne de porco no mesmo período caíram 52% em quantidade e 15% em valor.

Perspectivas
É difícil falar de recessão num país que pode ainda continuar a ter as maiores taxas de crescimento do mundo. Mas para China, que manteve a economia funcionando baseada numa expansão a todo vapor, a crise começa muito antes de haver uma recessão. Não importa o crescimento anual, mas a comparação com o ano anterior. Uma redução de taxas maiores que 10% durante cinco anos para taxas menores que 8% durante alguns anos é um golpe muito grande na economia.

Se for a 5% como já prevêem alguns organismos, é uma bomba-relógio social. O governo chinês também lançou seu pacote e fala em garantir a expansão através do reforço ao consumo. Mas com um parque produtivo voltado à exportação e uma população miserável, com um mercado de consumo baseado numa minoria, é muito difícil que isso compense a queda nas exportações, como já mostra a queda no setor imobiliário.

O mais provável é que o aumento de consumo interno não seja capaz de absorver a produção destinada à exportação. A redução da atividade econômica tende a se aprofundar.

E a classe trabalhadora?
Mas o golpe mais duro é contra os trabalhadores. A crise social já é um fato na China. Tem causado protestos de trabalhadores com alguma repercussão na imprensa. A região mais conturbada é justamente a da foz do rio Pérola, chamada de “fábrica do mundo”. As cenas de milhares de trabalhadores chegando ao local de trabalho e encontrando sua fábrica fechada e apenas um aviso dos patrões que estavam suspensos correram o mundo.

Milhões de trabalhadores estão ficando sem emprego em todo o país. Mas na China, ficar sem emprego é ficar sem nenhuma renda. Muitas vezes, significa ficar sem casa, pois as moradias para os trabalhadores migrantes, em boa parte das empresas das zonas de exportação, são nas próprias instalações das empresas.

Soma-se a isso a pobreza extrema, a superexploração nas empresas, como as tristemente famosas minas de carvão que matam um número absurdo de trabalhadores por falta de equipamentos e cuidados com a saúde do trabalhador. Agora o desemprego em massa empurra as massas a reagir. Elas não têm Previdência nem subsídio para desemprego.

A ditadura chinesa persegue, prende e tortura os trabalhadores que protestam, mas crescem as revoltas explosivas e as rebeliões de cidades contra os abusos dos patrões e do governo. Já houve casos de queima de delegacias e de prefeituras, como o caso típico do operário de uma das empresas que demitia.

Após ser torturado por policiais, conseguiu sair vivo. Ele se vingou matando os cinco policiais que o torturaram. Preso e submetido a inquérito pela ditadura do PCC seu caso virou um alvo de campanhas por sua libertação, com manifestações na cidade, abaixo-assinados pela internet etc.

Não está claro como vai ser a reação da classe. Os sindicatos são simples agências do regime. Isso joga contra a desorganização. Mas o governo do PC Chinês está muito preocupado com uma possível explosão e pediu um pouco de tolerância à sua própria polícia, por medo de que uma repressão faça estourar uma gigantesca revolta popular. Uma entrada em cena do gigantesco proletariado chinês pode marcar uma virada nas lutas da classe operaria de todo o mundo contra os ataques do capitalismo em decadência