Cartazes dos desaparecidos na ditadura
Indymedia Chile
Redação

Marcha em homenagem às vítimas da ditadura de Pinochet termina em repressão e morteNa noite do dia 11 de setembro, violentos embates entre manifestantes e policiais agitaram Santiago do Chile, quando terminava uma marcha de protesto pelos 32 anos do golpe de Estado que derrubou o governo Salvador Allende, comandado pelo general Augusto Pinochet, sob auspícios da inteligentsia do imperialismo norte-americano. A marcha, com mais de 20 mil pessoas percorreu 25 quadras – em um trajeto que separa a Praça dos Hérois do túmulo do ex-presidente chileno, no Cemitério Geral de Santiago. No local, seria realizado um ato em homenagem aos presos, “desaparecidos” e outras vítimas de uma das mais sangrentas ditaduras da América Latina.

Os manifestantes enfrentaram um forte operativo policial, com mais de 10 mil “carabineiros” fortemente armados. Os primeiros atritos deram-se nas redondezas do Cemitério, logo após o término da manifestação. Houve 87 manifestantes detidos e um morto, além de 21 policiais feridos e um oficial em estado grave. O ministro do Interior, Francisco Vidal, cinicamente atribuiu a culpa – depois de 49 detenções – a “100 ou 150 infiltrados” na marcha que seguia pacificamente.

A violência se espalhou por vários pontos da cidade, principalmente em bairros operários. Um manifestante – jovem de 17 anos, Cristian Castillo – foi atingido por uma bala no coração em Pealolón, a sudeste da capital. A juventude levantou barricadas de fogo e lançou coquetéis molotov contra veículos blindados da polícia. A radicalização dos protestos também fez com que 68 mil residências ficassem sem energia, devido à derrubada de cabos elétricos e postes.

“Nem esquecimento, nem perdão”
A política do presidente Ricardo Lagos de engavetar os processos por violações aos direitos humanos e aplicar indultos aos repressores condenados pela Justiça aumentou a revolta e deu o tom da manifestação. A marcha contornou a sede do governo, o Palácio da Moeda, local que foi quase destruído por bombardeios da força aérea golpista e de onde o corpo sem vida de Allende foi levado, escoltado por militares. Depois de 32 anos, as feridas seguem abertas e a exaltação de Lagos por perdão e esquecimento não fizeram mais do que exacerbar ainda mais os ânimos.

A advogada Carmen Herz, responsável por numerosos processos contra repressores, advertiu sobre “as terríveis conseqüências” que implicariam uma política de “ponto final”. Ao largo de três quilômetros, somaram-se mais de 20 mil manifestantes. Entre suas palavras-de-ordem estavam o rechaço aos indultos e as mensagens de repúdio ao presidente Lagos, além das faixas em memória de Allende e dos cartazes e bandeiras de esquerda.

O outro 11 de setembro: Chile, 1973
O cineasta britânico Ken Loach, diretor de ‘Terra e Liberdade´, foi convidado para filmar um curta-metragem sobre o 11 de Setembro dos EUA. Loach não tratou do atentado que derrubou as torres gêmeas e fez seu filme sobre outro 11 de Setembro, o que, em 1973, deu início à uma ditadura no Chile que ceifou a vida de mais de 3 mil pessoas.

Este 11 de Setembro ainda está presente na memória dos chilenos. Além das faixas com “Lagos traidor” e “Verdade e justiça”, mais visíveis da marcha, não foram poucos os manifestantes que diziam que “Allende vive no coração dos chilenos”.

Em 1970, Salvador Allende chegou ao poder encabeçando a Unidade Popular, uma Frente Popular – governo de colaboração de classes entre Trabalho e Capital – do Partido Socialista e do Partido Comunista em aliança com setores burgueses. Apoiado na esperança de milhões de chilenos (e de militantes exilados de todo o mundo), o governo Allende protagonizou um dos períodos mais intensos da política do país. A partir dos trabalhadores organizados, a Frente Popular chegou a medidas que deixaram o nome de Allende marcado na memória dos chilenos. O governo chegou até a estatizar minas de cobre – algo inimaginável na Frente Popular de Lula, por mais que seus defensores tentem compará-los.

Mas a natureza da Frente Popular determinou o seu destino. Comprometido a defender o Estado capitalista, o governo da Unidade Popular pregou aos operários que confiassem nos oficiais “constitucionalistas” da alta hierarquia militar. Mais do que isso, Allende confiou ao general Pinochet o controle das Forças Armadas logo após uma tentativa frustrada de golpe.

Em 1973, Pinochet liderou um sangrento golpe de Estado que esmagou os movimentos sociais, os sindicatos e a esquerda no Chile, resultando em milhares de presos, torturados, “desaparecidos” e assassinados. Ao diluir a situação revolucionária e os organismos de duplo poder – os “cordões industriais” – Allende abriu caminho para uma sangrenta derrota histórica dos trabalhadores chilenos: o golpe e o massacre liderados por Pinochet.