Quando escrevíamos esta matéria, a greve bancária já entrava no seu trigésimo dia, enquanto aguardava o desenrolar do ajuizamento do dissídio no Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Nestes 30 dias de greve, a segunda mais longa da história, a base bancária enfrentou o governo do PT, banqueiros e também a Confederação Nacional dos Bancários (CNB-CUT) e os sindicatos governistas.

O traço mais distintivo dessa greve, sem dúvida, é o fato de ter sido feita à revelia e contra a direção da CNB-CUT e das direções dos principais sindicatos, que a sabotaram e enfrentaram-se com as assembléias e com os piqueteiros cotidianamente e em todos momentos decisivos.

Desde o primeiro dia até hoje, a base compreendeu que a greve estava nas suas mãos e na da Oposição, que o Sindicato a boicotava.

Parcelas massivas dos bancários também romperam com o governo Lula e com o PT, a exemplo do que ocorreu com o funcionalismo federal na greve de 2003 contra a reforma da Previdência.

“Eu, eu, eu, o sindicato se vendeu”

A greve se impôs no dia 14 de setembro, quando as assembléias de São Paulo, do Rio de Janeiro e de Brasília atropelaram as direções governistas, rejeitaram a proposta rebaixada costurada pela CNB-CUT com a Fenaban (Federação dos Bancos) e o governo, votando pela greve por tempo indeterminado.

Em São Paulo, a maior base bancária do país, o sindicato defendeu a aceitação da proposta e foi contra a greve. O que se viu então na assembléia naquela noite foi algo histórico. Mais de três mil bancários gritavam “eu, eu, eu, o sindicato se vendeu”; “você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão”; cartazes trazidos dos locais de trabalho diziam “O aumento não é o que queria? Troque a diretoria”; setores inteiros da base se perguntavam se não era possível destituir ali mesmo a direção do sindicato. A assembléia fervilhava. A Oposição Bancária defendeu a rejeição e a greve e foi ovacionada. A diretoria do sindicato quase não conseguia falar de tanta vaia. Ao final, a assembléia virou as costas para a mesa. Mais de 90% votaram pela greve já.

A sabotagem do sindicato

Já no dia seguinte, os piqueteiros se depararam com a falta de estrutura do sindicato, que nem sequer faixas e cartazes disponibilizava em número suficiente. Enquanto isso, os “interditos proibitórios” surgiam pelo país jogando a polícia contra os piquetes para derrubar a greve nos bancos privados. Perante a repressão da polícia e das direções dos bancos públicos, a Oposição e piqueteiros da base seguravam o tranco – sendo vários deles presos -, enquanto a direção do sindicato afrouxava.

Três episódios decisivos

Mas o ódio contra a CNB-CUT e o sindicato deu um salto definitivo em São Paulo com três episódios decisivos.

Primeiro, a Oposição propôs a eleição em assembléia de um representante de base para acompanhar as negociações e um comando de greve. O sindicato foi contra e buscou impedir a Oposição de falar, encerrando a assembléia, abandonando a mesa e retirando o microfone. Mas a assembléia com mais de dois mil bancários manteve-se instalada e foi dirigida mesmo sem aparelho de som pela Oposição. No dia seguinte, a direção recuou e o representante de base foi eleito.

O segundo episódio decisivo deu-se quando a Oposição, com o apoio da base, percebeu que era hora do movimento fazer uma contra-proposta para jogar o ônus da intransigência em cima dos banqueiros e do governo. A direção do sindicato, que antes havia defendido uma proposta rebaixada, passou a defender “25% ou morte” (a reivindicação original da categoria), para evitar qualquer negociação.

Por fim, a CNB-CUT e sindicatos governistas, num ato de hipocrisia, levantaram-se em todo o país contra a proposta da Oposição de que as assembléias recorressem ao ajuizamento de dissídio no TST, falando contra o suposto “atrelamento dos sindicatos ao Estado”, em defesa da “livre negociação”.

Esse tipo de argumentação, vinda dos petistas/cutistas, é uma tremenda hipocrisia, pois eles vincularam completamente os sindicatos ao Estado atrelando-os ao governo federal. A CUT e os sindicatos dirigidos por ela tornaram-se agentes do governo e de sua política econômica contra os trabalhadores.

Nós não confiamos na Justiça e devemos sempre chamar os trabalhadores a confiarem apenas nas suas próprias forças, na sua luta. No entanto, numa luta sempre podemos e devemos saber usar de eventuais divisões entre os inimigos. No caso atual, depois de mais de 27 dias de greve, o governo e os banqueiros, com a cumplicidade da CNB-CUT, negavam-se a negociar e atuavam para impor não apenas uma derrota, mas a desmoralização aos bancários.

Nessa situação, por diferentes circunstâncias, o TST tem sido o único setor do Estado a acenar com negociação.

Não há garantia alguma de que o TST, apesar de suas contradições conjunturais com o governo, vote a favor dos bancários, mas há alguma possibilidade que o faça. Seguir no caminho da CNB-CUT e do governo até o fim é derrota certa.

Embora a Justiça seja um risco, a base percebeu que confiar na “Santíssima Trindade” – formada pelo governo, pelos banqueiros e pelos sindicatos-CNB/CUT – resultaria em uma derrota certa, portanto, era melhor arriscar na Justiça.
Post author Mariúcha Fontana, da Direção Nacional do PSTU
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