Folha de S. Paulo, 25/08/2002FÁBIO ZANINI
da Folha de S.Paulo

Pela segunda vez candidato do ultra-esquerdista PSTU à Presidência, o metalúrgico José Maria de Almeida, 44, pretende fazer da campanha eleitoral um movimento para construir um novo partido que “resgate os valores da fundação do PT“.

Zé Maria, como se apresenta na campanha, diz já ter iniciado contatos com desgarrados das alas radicais do PT, partido com o qual rompeu na primeira metade da década de 90, muito antes de iniciado o processo de aproximação acelerada de Luiz Inácio Lula da Silva com setores do centro.

“Muita gente vai sair do PT se Lula governar atrelado ao PL“, afirma o candidato.

Grande parte da campanha do PSTU será de denúncia ao PT, que Zé Maria acusa de estar traindo os ideais da classe trabalhadora. “Pelo menos os outros candidatos são autênticos. O [José] Serra é candidato dos banqueiros e assume isso“, declara.

O tom de crítica chega ao ponto de Zé Maria prever que um eventual governo Lula não seria diferente do atual.

“Se fizer um governo com as forças políticas que o estão apoiando, Lula não será em sua essência diferente de Fernando Henrique“, afirma.

Mas, numa aparente contradição, o PSTU afirma que pode recomendar o “voto crítico“ em Lula num segundo turno. “Há um histórico de parceria nossa com o PT nos movimentos sociais, além do fato de Lula ser uma autêntica liderança surgida entre os trabalhadores“, afirma.

É justamente em cima do eleitorado de esquerda decepcionado com a guinada de Lula que o PSTU espera crescer. Na última eleição, Zé Maria teve 200 mil votos, ou 0,3%. Agora, espera fazer muito mais. Pesquisas de intenção de voto chegam a dar a ele 2%.

Para ele, a maior dificuldade é “romper o bloqueio da mídia“ às propostas do PSTU. “O desafio é levar nossa mensagem para o eleitorado que se identificaria conosco. Podemos ser muito maiores do que o eleitorado que hoje declara voto em mim“, afirma.

Plataforma radical
A plataforma de governo do PSTU é fiel a sua tendência leninista-trotskista. São prioridades o rompimento com o capital internacional e com o FMI, a estatização (sem indenização) de grandes propriedades rurais, empresas e bancos, a redução da jornada de trabalho para 35 horas semanais e o assentamento de 4,5 milhões de famílias sem-terra num prazo de quatro anos.

Zé Maria sente calafrios ao ver sua proposta de um Estado “gigante“ comparada à União Soviética. “Não há comparação. Nossa diferença é que somos pela democracia e liberdade partidária.“

No multipartidarismo preconizado pelo PSTU, no entanto, só haveria espaço para partidos de trabalhadores. “Não haverá partidos de elite simplesmente porque não haverá mais elite“, explica.

Há ainda na plataforma do PSTU a rejeição à Área de Livre Comércio das Américas e mesmo ao Mercosul, acordos que só “beneficiam multinacionais“. O partido é um dos organizadores de um plebiscito contra a Alca, recentemente abandonado pelo PT.

“Há riqueza no Brasil, ela só precisa ser redirecionada do pagamento da dívida para o desenvolvimento nacional“, afirma Zé Maria.

Casa de amigos
Questionado se suas medidas não transformariam o Brasil num pária internacional, ele é enfático: “Ser pária é ter um povo miserável, com milhões sem ter o que comer.“

O PSTU orçou sua campanha em R$ 200 mil -o PSDB chega a prever R$ 60 milhões. Todo o financiamento, segundo o presidenciável, será feito via contribuição de cerca de 2.000 filiados.

Em seu marketing de legenda anti-burguesa, o PSTU enxerga como virtude as limitações de campanha. Zé Maria não faz questão de esconder que viaja prioritariamente de ônibus e que não se hospeda em hotéis, mas na casa de simpatizantes em diversas cidades.

No comitê onde deu entrevista à Folha, no bairro do Paraíso (São Paulo), janelas quebradas e material gráfico pelo chão emprestam um ar de diretório estudantil.

Na parede, um cartaz preparado com cartolina e canetinha chamava para um evento político. Ao lado, outro cartaz pregava oposição “sem trégua“ ao governo Marta Suplicy.

Em posição de destaque, lá estava também reprodução da famosa foto de Lenin discursando para bolcheviques na praça Vermelha, em Moscou.

Na versão original, obviamente, aquela com Trótski ao lado do palanque, não a imagem que teve o revolucionário apagado por stalinistas, anos depois.