O cenário é insólito: de um lado encontraremos o presidente da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Haroldo Lima, do PCdoB, responsável pela organização de todos os leilões realizados no governo Lula para entrega de nosso petróleo às grande multinacionais. Está aliado com Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), que apresentou uma emenda ao marco regulatório do governo Lula, aprovada na Câmara por 369 votos contra 72. Eles defendem alterações na distribuição de royalties do Pré-Sal de maneira que favoreçam estados e municípios onde não há produção.

Do outro lado está o governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral (PMDB), que denuncia que, se a emenda for aprovada no Senado, seu estado deverá perder uma receita de R$ 7,5 bilhões por ano.

O governo do Rio organizou uma marcha no dia 17 de março que, segundo estimativas, reuniu entre 50 e 80 mil pessoas. Majoritariamente bancada pelo aparato do Estado, com direito a ponto facultativo aos servidores e requisição de trabalhadores das obras do PAC, com ônibus de graça para levar todo mundo.
Lula espertamente, buscando turbinar a difícil candidatura de Dilma Roussef, não queria entrar na discussão e nem mesmo votar os royalties neste ano. Sabia que iria dividir a base governista: “em ano de eleição todo mundo quer fazer gracinha”, disse.

Um ativista desavisado poderia ficar em dúvida sobre de que lado estar. Mas tudo não passa de uma grande farsa.

Ibsen Pinheiro e Haroldo Lima querem holofotes num ano eleitoral, pouco importando se a medida prejudicaria ou não a população dos estados produtores. Cabral e o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), fazem uma campanha demagógica e hipócrita, tentando criar uma espécie de “nacionalismo fluminense” preconceituoso contra os estados do Nordeste, tentando usar a população como massa de manobra.

Entregaram tudo e agora querem brigar pelas migalhas
O novo marco regulatório mantém a entrega do petróleo às multinacionais, agora em regime de partilha. Praticamente não existe mudança entre este regime e o de concessão. Além disso, 29% do Pré-Sal já foi leiloado.

Para se ter uma ideia do tamanho da entrega, o campo de Tupi, localizado em Santos, pode chegar a 12 bilhões de barris. Com o barril cotado a 70 dólares, significa uma renda de 840 bilhões dólares. Segundo a ANP, no bloco Pão de Açúcar o volume de petróleo estimado é de pelo menos 5 vezes mais, isto é 60 bilhões de barris, e tudo isso já foi abocanhado pela ExxonMobil, Chevron, Shell, Galp, Repsol e Hess.
Os royalties significam de 5% a 10% da produção de petróleo. Os deputados aprovaram o aumento do percentual para 15% nas áreas do Pré-Sal. A União fica com quase 40% do bolo. Outros 52% ficam nos locais onde há a extração. O restante, quase 8%, fica entre os demais estados e municípios.

No epicentro da polêmica, portanto, estão recursos que somaram, no máximo, 5 bilhões de dólares no ano passado. Quer dizer, estão entregando 4,2 trilhões de dólares para as multinacionais e fazem escândalo com 5 bilhões.

Se o monopólio estatal do petróleo, derrubado por FHC, fosse retomado, e a Petrobras fosse totalmente estatizada, toda a renda petroleira ficaria em nosso país. Com isso poderíamos investir na construção de casas populares e saneamento, por exemplo. Além do que o transporte coletivo ficaria mais barato, pois a gasolina e o diesel poderiam ser vendidos a um preço muito mais baixo e os alimentos, transportados em caminhões e aviões por todo país, seriam vendidos a um preço menor.

Querem é mais dinheiro para a corrupção
Em 2008, a União ficou com algo em torno de R$ 10 bilhões, mas a maioria deste dinheiro foi destinada ao pagamento de juros da dívida. O Rio recebe cerca de R$ 7 bilhões em royalties por ano. E o município de Campos dos Goytacazes, no norte fluminense, R$ 400 milhões anuais.

A população carente destes municípios se pergunta: aonde foi este dinheiro? Ele não se reverte em benefício para a população que sofre com serviços públicos precários.
Esse dinheiro é usado para compra de políticos, depositado em contas na Suíça e para dar lucro para as empreiteiras que tocam as obras do PAC, das Olimpíadas e da Copa.
As organizações populares, os sindicatos, os partidos da classe trabalhadora e suas associações devem exigir o controle destes e de todos os recursos do Estado. Deliberando e fiscalizando sua utilização.

A partir daí poderemos decidir se as cidades produtoras poderão ou não receber recursos extras, e quais realmente sofrem impacto social e ambiental devido a essa produção. É um absurdo que organizações de nossa classe participem deste tipo de
manifestação.

Contra o novo marco
Além do regime de partilha, o novo marco regulatório propõe uma capitalização da Petrobras que representa uma verdadeira entrega. Serão dados 350 bilhões de dólares em petróleo da União, sem qualquer ônus, aos 67,2% acionistas da Petrobras
(40% estrangeiros).

Já o Fundo Social vai fortalecer o mercado financeiro, pois determina que somente o rendimento das aplicações financeiras será destinado às áreas sociais. Assim, o fundo vai proporcionar “rentabilidade e liquidez”.
Não pode ser que este Congresso, conhecido como um antro de corrupção, decida sobre os destinos do Pré-Sal.

Por isso exigimos do governo Lula que seja convocado um plebiscito nacional em 2010, para decidir sobre como deve ser a extração e produção de todo o petróleo e como será a repartição dos lucros.

Monopólio da produção e Petrobras 100% estatal
Queremos o monopólio da produção de petróleo exercido unicamente por uma Petrobras 100% estatal, sob controle dos trabalhadores e dos movimentos sociais, que possam desenvolver uma administração estratégica das reservas, direcionando-a para a satisfação das necessidades da população. Que sirva também para diminuir as emissões de gases poluente e desenvolva a pesquisa em energias limpas alternativas.
Exigimos o fim dos leilões e a retomada das reservas leiloadas sem indenização às multinacionais que já ganharam demais.

Queremos a extinção da ANP e o fim do Conselho Nacional de Política Energética. Estamos contra a criação da PetroSal. Para isso propomos a realização de uma “Jornada de lutas pela soberania nacional”, com atos, greves e manifestações.

Post author Américo Gomes, do Instituto Latino-Americano de Estudos Sócio-Econômicos (ILAESE)
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