Redação

A ação da Polícia Federal contra o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), nesta terça-feira, 26, expõe, ao mesmo tempo, um caso escandaloso de corrupção no estado em meio à pandemia e o colapso da saúde pública, a interferência e aparelhamento da PF por Bolsonaro, além dos casos de corrupção que atingem o presidente e a sua família.

A chamada operação Placebo foi cumprida pela Polícia Federal a pedido da Procuradoria Geral da República (PGR), com base em investigações do Ministério Público. As evidências de superfaturamento em contratos do estado na saúde são fortes, incluindo a compra superfaturada de respiradores com rombo calculado em R$ 1 bilhão, e apontam para um esquema muito parecido ao do ex-governador Sérgio Cabral, que utilizava um escritório da então primeira-dama, Adriana Ancelmo, para lavar o dinheiro da corrupção. Ao que tudo indica, Witizel operava da mesmíssima maneira, agora com um escritório de advocacia de sua esposa, Helena Witzel. O mesmo empresário envolvido nos esquemas de Cabral, Mário Peixoto, aproximou-se de Witzel ainda durante a campanha eleitoral e está agora no centro do atual caso.

Witzel, por sua vez, se diz vítima de perseguição por parte de Bolsonaro. E, aqui também não faltam motivos para acreditar nisto. A deputada bolsonarista Carla Zambeli (PSL-SP) adiantara, no dia anterior, que haveria operações contra governadores em entrevista à Rádio Gaúcha. Nesse mesmo dia, Bolsonaro fez uma visita ao Procurador-Geral da República, Augusto Aras, responsável por investigar o presidente e pelo inquérito sobre os desvios no Rio. O presidente, aliás, nem disfarçou sua satisfação com a ofensiva contra seu desafeto político, parabenizando a PF pela operação.

Tudo o que reforça o que havia denunciado o ex-ministro Sérgio Moro, de que Bolsonaro atuava para intervir e comandar diretamente a cúpula da Polícia Federal para se safar das investigações contra ele e a sua família e, agora, para atingir seus adversários. Reafirma o seu projeto de transformar a PF num instrumento de polícia política a favor de seu governo corrupto, miliciano e genocida.

A briga entre Witzel e a família Bolsonaro está fazendo emergir de forma ainda mais contundente isso. Quando o governador disse que Flávio Bolsonaro deveria já estar preso, este respondeu o chamando de ingrato e afirmando que Witzel o procurava insistentemente durante as eleições, através de Queiroz. “Botava assessor para ligar para ele para saber onde eu estava. (…) Sabia que o Queiroz estava do meu lado, trabalhando. Um cara correto, trabalhador, dando sangue por aquilo que ele acredita“, afirmou o Zero Um, revelando o que pensa atualmente do miliciano desaparecido.

Nessa briga, os dois têm razão. A família Bolsonaro é corrupta e miliciana, não só Flávio como seu pai e seus irmãos deveriam estar presos, e já mostraram que não pouparão esforços para se autopreservar. E Witzel é um corrupto descarado que não hesita em assaltar os cofres públicos num momento em que o estado, e o país, vive a sua pior crise sanitária e social. Hipócrita, o governador se elegeu pegando carona na família Bolsonaro e com um discurso fascistoide, quem não se lembra do discurso do então candidato ao Palácio das Laranjeiras em que a placa em homenagem à Marielle foi quebrada?

Bolsonaro, aliás, não vai pensar duas vezes antes de utilizar esse caso para atacar as poucas medidas adotadas nos estados contra a pandemia, dizendo que são justificativas para corrupção. “Narrativa” já disseminada por sua tropa e milícias digitais num momento em que o país alcança a dianteira no ranking de mortes diárias por coronavírus. Todos eles deveriam estar compartilhando uma cela em Bangu.

A alegria de Bolsonaro, porém, não durou muito. A operação da PF comandada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre Moraes, nesta quarta, 27, no âmbito do inquérito das fake news, por sua vez, atinge vários deputados bolsonaristas, incluindo a deputada Zambelli. Mostra que a crise política nas alturas se aprofunda e que Bolsonaro tem muitos motivos para se preocupar.