Camisa do jovem Marcus Vinicius, morto por policiais civis no Complexo da Maré, no Rio

Projeto de Lei é apresentado no momento em que o governo Bolsonaro se vê envolvido com a milícia no Rio

O chamado “pacote anticrime” apresentado na manhã de 4 de janeiro pelo ex-juiz da Lava Jato e atual Ministro da Justiça de Bolsonaro, Sérgio Moro, inclui uma medida que, se aprovada, representaria uma verdadeira carta branca para a polícia matar e permanecer impune. Vai no sentido do que Bolsonaro defendeu na campanha eleitoral, o tal “excludente de ilicitude”. Segundo o próprio Bolsonaro explicou durante a campanha eleitoral: “Se alguém disser que quero dar carta branca para policial matar, respondo: quero sim“.

O que significa o “excludente de ilicitude”, algo que, já na primeira vista, soa estranho, como excluir algo que é ilícito? Pois a medida é isso mesmo, e já existe. Hoje, se um policial mata alguém que supostamente oferece risco a outras pessoas ou ao próprio policial, não há crime ou responsabilização. Daí a avalanche dos chamados “autos de resistência”, que é uma forma de camuflar uma execução como um ato de legítima defesa ou de “necessidade”. Basta plantar uma arma na mão da vítima e pronto (como aconteceu com a execução do militante do PSTU Gildo Rocha). Isso já é o “excludente de ilicitude”. A medida de Moro e Bolsonaro pretende ampliar essa prerrogativa para simplesmente qualquer situação.

Liberou geral
O Projeto de Lei apresentado por Moro altera o Código Penal e, além dos casos já previstos, concede ao juiz o poder de reduzir a pena pela metade ou até deixar de aplicá-la nos casos que o policial matar “sob escusável medo, surpresa ou violenta emoção“. Termos genéricos e subjetivos que pode abarcar qualquer coisa. A polícia não vai ter o trabalho nem de simular um confronto, basta alegar que estava sob o efeito de “violenta emoção”, seja lá o que for isso, e pronto.

Outro ponto alterado pelo pacote de Moro, dessa vez no Código de Processo Penal, dá ao delegado o poder de não prender o policial que matou caso ele ache que o agente agiu por “necessidade” ou “legítima defesa”. Ou seja, o policial poderá matar e, enquanto responde eventual inquérito, estará livre para ameaçar, coagir testemunhas, sumir com provas ou qualquer ação para livrar sua cara e garantir impunidade.

Conforme declarou o advogado Ariel de Castro Alves, do Conselho Estadual de Direitos Humanos de São Paulo, ao El Pais: “A proposta do ministro legitima execuções e extermínios praticados por policiais. Uma verdadeira lei do abate de jovens pobres“.

Legitimando o genocídio perpetrado pela polícia
A população pobre, principalmente a juventude negra das periferias, já sabe que a polícia não precisa de motivos para atirar e matar. Não é por menos que a polícia no Brasil é uma das que mais mata no mundo. Em 2017, foi responsável por 5.144 mortes, ou 14 pessoas por dia, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Só para se ter uma ideia, as vítimas fatais de latrocínio (roubo seguido de morte) somaram 2.460. É duas vezes mais fácil morrer nas mãos da polícia que de um assaltante.

Leia o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2018 aqui.

Não parece coincidência, ainda, que essa medida prospere justo no momento em que são reveladas relações mais que espúrias entre a família Bolsonaro e milicianos do Rio de Janeiro. Escândalo que, inclusive, Sérgio Moro não abriu a boca.

A polícia também se transforma em vítima nessa espiral de violência que, no ano passado, ceifou a vida de quase 64 mil brasileiros. Foram mortos 367 policiais em 2017. Á medida em que se vêem investidos com maior força e legitimidade para reprimir e matar, também morrem mais.

Enquanto isso, os políticos metidos ou bancados pelo tráfico de drogas, corrupção, ou a própria milícia, contam seu dinheiro no ar-condicionado de seus gabinetes.