“Se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu, eu conto para ele”

Nesta segunda-feira, 29, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) voltou a fazer uma declaração criminosa de apologia à tortura e aos assassinatos de opositores e da ditadura militar. Numa fala dirigida ao atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, cujo pai é um dos desaparecidos da ditadura, Bolsonaro disse: “Se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu, eu conto para ele“.

O pai de Felipe, Fernando Augusto Santa Cruz, desapareceu após ter sido preso em 22 de fevereiro de 1974 pelo DOI-CODI no Rio de Janeiro. Então com 26 anos, o pai do atual presidente da OAB integrava a Ação Popular e nunca participou da luta armada. Foi reconhecido como desaparecido político apenas em março de 2014 pela Comissão da Verdade.

A mãe de Fernando, Elzita Santa Cruz, como tantas outras mães de mortos e desaparecidos da ditadura, morreu em junho de 2019 sem sequer ter tido o direito de sepultar o próprio filho.

Bolsonaro disparou esse absurdo por conta da atuação de Felipe junto à OAB para supostamente impedir a investigação dos advogados de Adélio Bispo de Oliveira, autor da facada que atingiu o então candidato durante a campanha eleitoral. Adélio foi reconhecido como portador de transtorno mental pela Justiça e recolhido à prisão psiquiátrica.

O novo ataque de Bolsonaro não foi um rompante de indignação. Foi a reafirmação da defesa de Bolsonaro da ditadura militar e de seus métodos: a tortura, o assassinato, o estupro e o desaparecimento.

Recentemente, Bolsonaro mentiu de forma vil sobre a economista Miriam Leitão, dizendo que a atual funcionária da rede Globo não teria sido torturada. É fartamente comprovado que Miriam Leitão foi presa e, mesmo grávida, submetida a terríveis torturas. Miriam Leitão é uma economista liberal defensora dos banqueiros e da atual política econômica do governo Bolsonaro, mas recorrer a isso para atacá-la é vil, imoral e desumano.

Da mesma forma que Bolsonaro homenageou o coronel Brilhante Ulstra durante a votação do impeachment de Dilma. Ustra é um assassino e torturador reconhecido pela própria Justiça. Infelizmente, morreu de câncer sem ter sido responsabilizado por seus crimes.

Durante os 28 anos em que permaneceu parasitando o Congresso Nacional, Bolsonaro sempre defendeu a ditadura e a tortura, inclusive reforçando que a reeditaria caso chegasse ao poder. Uma placa afixada na porta de seu gabinete dizia: “quem gosta de osso é cachorro”, em alusão à busca pelas ossadas dos desaparecidos políticos. Uma vez presidente, mostra que permanece o mesmo lixo humano que sempre foi.

Abrir os arquivos da ditadura
O que possibilita que um presidente da República possa vociferar uma atrocidade dessas é o fato de que, no Brasil, a ditadura militar nunca foi passada a limpo. Ao contrário dos outros países do cone sul, aqui não houve qualquer punição a torturadores e assassinos, sequer investigação séria. A lei da Anistia estabeleceu a impunidade geral e irrestrita aos criminosos que praticaram todo tipo de barbaridade contra militantes, jovens e operários, mas também camponeses e indígenas.

Na ditadura militar, os militantes de esquerda foram punidos com execuções sumárias, torturas, estupros, exílio e toda sorte de perseguições. Já seus carrascos, agindo a mando dos EUA, nada sofreram e estão morrendo de velhice no conforto de seus lares. Mais de cinco décadas após o golpe, os arquivos da ditadura permanecem secretos e inúmeros mortos, como Fernando, continuam desaparecidos.

Esse desconhecimento da nossa história e a impunidade é o que faz com que, hoje, parcela da população, ainda que minoritária, veja a ditadura militar como alternativa diante da crise desse regime. E que verdadeiros animais como Bolsonaro profiram esse tipo de sandice. A ditadura militar não só generalizou a prática de tortura e assassinatos a opositores, mas foi tão corrupta, ou mais, que os governos que o sucedeu, aliado às grandes empresas, multinacionais, bancos e empreiteiras.

Contribuiu para isso, verdade seja dita, os governos do PT que se recusaram a abrir os arquivos da ditadura e rever a Anistia, culpabilizando e punindo os carniceiros da ditadura. Isso agora cobra o seu preço.

Fala o que sabe, covarde
Se Bolsonaro disse que sabe o que aconteceu com Fernando, em tom de deboche, por que não diz? Não diz porque é covarde e, assim como tantos outros, teme que a verdade venha à tona. Seus impropérios proferidos quando o esgoto que chama de boca se abre servem apenas para humilhar e desrespeitar os mortos e torturados da ditadura.  Porque é isso o que Bolsonaro é: ameaça e humilha os perseguidos, os pobres e os mais fracos, e se ajoelha diante de Trump, dos banqueiros e ruralistas.

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