Logo que chegou ao Brasil, o papa Bento 16 fez questão de mostrar que não veio a passeio. Antes mesmo de pisar em solo brasileiro, o papa já havia defendido a excomunhão de políticos favoráveis à descriminalização do aborto. Tal posicionamento ficou claro com o apoio aos bispos mexicanos que recentemente excomungaram deputados pró-aborto da Cidade do México.

Em seguida, o papa disparou uma série de declarações ultraconservadoras ligadas ao comportamento sexual e ao casamento: condenou a utilização da camisinha, defendeu abstinência sexual e castidade antes do casamento e atacou o divórcio. Disse ainda que o sexo depois do matrimônio deve ter apenas “fins reprodutivos”. As declarações desconcertaram até mesmo alguns teólogos da Igreja Católica.

Bento 16 também atacou duramente o setor mais progressista da Igreja na América Latina, a Teologia da Libertação, que ele combateu durante os anos 80 e 90. Assim, procurou fortalecer o setor mais à direita da instituição na abertura da Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe (Celam), para demarcar terreno nas discussões que serão travadas por 280 bispos em Aparecida do Norte (SP) até o dia 31. Em seu discurso, o papa disse que a Igreja não pode se envolver em política. Pura hipocrisia. Ao longo de toda a visita, o papa se utilizou de valores religiosos para tratar de questões de Estado, como a própria discussão do aborto, ou ainda, o retorno do ensino religioso nas escolas.

A visita de Bento 16 ao Brasil buscou fortalecer o setor mais conservador da Igreja em torno de uma agenda moralista-conservadora e hipócrita. O objetivo é conter a perda de fiéis do catolicismo para outras confissões, um fenômeno crescente. Em 1979, na ocasião da primeira visita de João Paulo 2°, cerca de 89% da população se dizia católica, número que caiu para 74%.

Como escreveu Leonardo Boff, teólogo da libertação afastado da Igreja pelo então cardeal Joseph Ratzinger, a Igreja que Bento 16 pretende construir “é necessariamente de poucos (…) Mas esses poucos devem ser santos, zelosos (…) Ocorre que esses poucos nem sempre são bons. Haja vista os padres pedófilos”.

A Papa não é pop
Nem mesmo toda a campanha da mídia, comandada pela Rede Globo, pôde esconder o anacronismo de Bento 16. A emissora esforçava-se em apresentar o papa como uma figura simpática e sensível. De nada adiantou. Vários jornalistas e colunistas atacaram duramente suas declarações conservadoras. Sem o carisma de João Paulo 2°, as celebrações com Bento 16 não atraíram o público esperado. Na missa de canonização de Frei Galvão, por exemplo, esperava-se mais de 2,5 milhões de pessoas. O evento atraiu menos de 800 mil. Na tão alardeada missa dominical, realizada na Basílica de Aparecida, o público teria sido de aproximadamente 150 mil. Os organizadores esperavam pelo menos 500 mil fieis. Fotos da imprensa mostravam vários lugares vazios na celebração.

A visita do papa mostrou que a Cúria Romana nunca ficou tão distância da realidade concreta do povo brasileiro. Bento 16 retorna ao seu mundo virtual no Vaticano sem deixar nenhuma saudade.

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