Em Belém do Pará existe um cenário eleitoral bastante diferente da maioria do país. A candidatura de Edmilson Rodrigues, da Frente Belém nas Mãos do Povo (PSOL, PSTU e PCdoB), à prefeitura figura em primeiro lugar em todas as pesquisas de intenção de voto, com 47% da preferência. Edmilson está muito a frente das demais candidaturas da direita, como o PSDB e o PMDB (que oscilam entre 11% e 15%), e mesmo do PT que não passa dos 2%.

A indignação da maioria dos trabalhadores e do povo pobre de Belém com os governos e partidos tradicionais é canalizada por Edmilson Rodrigues. Em 10 anos de governo da frente-popular, é a primeira vez que estamos vendo um fenômeno eleitoral de uma ruptura de massas, à esquerda, com o PT. Para nós, socialistas, essa seria uma grande oportunidade para fortalecer a organização direta e as mobilizações dos trabalhadores e construir com as massas da cidade um programa e um horizonte de ruptura com a burguesia e com o capitalismo.

O apoio de Marina
As pesquisas indicam a possibilidade real da primeira vitória do PSOL da em uma eleição majoritária, o que coloca uma grande responsabilidade a este partido. Por outro lado, as pressões para que se abandone um programa classista são cada vez maiores. Recentemente, Edmilson recebeu o apoio público de Marina Silva durante um evento na cidade. O candidato se pronunciou publicamente sobre o significado desse apoio da seguinte forma: “A Marina representa o esforço pela construção de um projeto de futuro, um projeto sustentável. Foi ministra, foi uma das senadoras mais atuantes do Congresso, é uma referência nacional na luta ambiental e mesmo assim, possui uma humildade que faz com que não perceba a totalidade da importância que tem. Estou muito feliz e grato em ter esse reconhecimento da Marina” (O Liberal, 28/08/2012).

Marina é vista como uma defensora do meio ambiente por sua história junto aos movimentos populares. Mas hoje não expressa mais os interesses da classe a qual um dia pertenceu. Quando era ministra do governo federal se consumaram alguns grandes ataques ao meio ambiente. Um exemplo foi a transposição do Rio São Francisco. Enquanto os movimentos sociais apoiavam o Dom Luiz Cappio, em sua greve de fome contra a transposição, Marina Silva declarou apoio ao projeto, dizendo que era “uma decisão absolutamente técnica”. Também foi no seu mandato que se deu a liberação dos transgênicos.

Quando foi candidata à presidência da república, em 2010, seu vice foi o empresário Guilherme Leal, presidente da Natura, aliado muito diferente daqueles de outros momentos, tais como Chico Mendes e os inúmeros trabalhadores rurais que se enfrentaram com o poder dos grandes capitalistas extrativistas. Infelizmente, Marina tem demonstrado mais compromisso com os grandes empresários do que com o meio-ambiente. E hoje não representa o esforço pela construção de um projeto de futuro sustentável.

Programas compensatórios
Outro elemento importante é o programa bolsa-escola. O centro da intervenção de Edmilsom nas atividades de campanha tem sido a defesa da reedição do programa Bolsa-Escola no valor de um salário mínimo. Embora seja através dele que milhões de brasileiros desempregados que vivem com menos de R$ 70 reais mensais consigam alimentar suas famílias, este é um programa social compensatório que não ataca a fundo o problema da desigualdade. Os programas sociais compensatórios criaram uma espécie de neoclientelismo institucional que, ao invés de combaterem a pobreza, acabam por perpetuá-la, pois não se combate as causas, mas sim os efeitos da desigualdade social. Não pode ser que a estratégia da esquerda para combater a miséria seja criar um programa social compensatório.

Limites do programa democrático-popular
A maioria da direção do PSOL defende o programa democrático-popular como um suposto meio para se chegar ao socialismo. Para implementar esse programa, seus defensores consideram necessário fazer alianças “táticas” com setores burgueses “progressivos” e implementar medidas que busquem amenizar (ou humanizar) os efeitos nocivos do capitalismo. Assim, se poderia acumular forças para uma futura ruptura socialista.

Ora, em primeiro lugar é importante dizer que não existem setores burgueses progressivos, pois os diversos segmentos da burguesia estão articulados entre si a nível internacional e sempre se unificam quando se trata de explorar a classe trabalhadora. Além disso, não existe nenhum exemplo histórico de que é possível governar para as duas classes ao mesmo tempo e destruir o Estado burguês compartilhando o poder com a burguesia, submetido às suas leis e sob seu poderio econômico, político e militar.

A estratégia de construir um governo de colaboração de classes por dentro das instituições do capitalismo sempre resultou na preservação do próprio capitalismo. O exemplo do PT no governo é emblemático. Lula se elegeu em 2002 dizendo que iria fazer a reforma agrária com uma canetada, mas o país ainda convive com a chaga de 4,8 milhões de famílias sem-terra e com o absurdo de 1% dos grandes proprietários detendo 46% das propriedades rurais. Dilma se elegeu fazendo um discurso contra as privatizações, mas já privatizou os hospitais universitários, a previdência dos servidores federais e vários aeroportos e estradas.

A construção de um programa de transição deve partir das necessidades mais sentidas pelos trabalhadores, mas deve apontar para a independência de classe e a estratégia socialista, ou seja, o fim da propriedade privada dos meios de produção e a democracia operária como horizontes estratégicos.

Rompendo limites
A emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores, como nos ensinou Marx e Engels e a experiência da Revolução Russa. O programa democrático-popular não passa de uma maquiagem de um programa burguês com tonalidades avermelhadas. Não é possível garantir salário digno e melhores condições de trabalho para os servidores municipais sem romper com a Lei de Responsabilidade Fiscal, que drena recursos públicos para o pagamento da dívida aos banqueiros. Não é possível garantir transporte público de qualidade e passe-livre para estudantes e desempregados se as empresas não forem estatizadas e colocadas sob controle dos trabalhadores e usuários. O poder nunca vai ser diretamente exercido pela maioria enquanto seguir existindo uma Câmara de Vereadores que funciona controlada pelas leis e interesses dos grandes empresários, latifundiários e banqueiros.

Em síntese, enquanto a propriedade privada dos meios de produção e as instituições do regime burguês permanecerem intactas, sob controle de uma minoria, nenhuma mudança real a favor dos trabalhadores poderá ser efetivada, por mais que se amplie a cobertura de programas sociais compensatórios.
Post author Atnágoras Lopes, da Direção Nacional do PSTU
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