Foto: OAB-RJ

Manifestações democráticas contrastaram com ofensiva dos governos e da grande mídia


A manhã desta terça-feira, 22, começou agitada no Rio. Com um ato marcado pela ampla unidade dos setores democráticos da política fluminense, a OAB-RJ recebeu, em sua sede, no Centro do Rio, o ato “Em defesa da democracia – Contra a criminalização da liberdade de manifestação”.
 
O auditório da seccional ficou pequeno. Ali estavam parlamentares de esquerda, ativistas de direitos humanos, jovens estudantes, sindicalistas, militantes feministas, advogados e uma gama de bravos lutadores e lutadoras em defesa da democracia, do direito à reunião e à organização política.
 
Os informes e relatos de arbitrariedades promovidos pelo governo do Estado do Rio são alarmantes. Vão desde a invasão de casas de militantes sem mandado de busca, com confisco de livros e documentos pessoais, até inquéritos intermináveis, no intuito de perseguir politicamente aqueles que defendem uma sociedade mais justa e fraterna.
 
Em sua fala, o presidente do PSTU-RJ, Cyro Garcia, contextualizou a repressão que vivemos nos dias atuais: “O Rio de Janeiro vive com mais intensidade esse recrudescimento da criminalização dos movimentos sociais, mas esse é um processo nacional. Em Porto Alegre, nosso companheiro Matheus Gordo teve sua casa invadida, documentos e livros confiscados e é acusado de formação de quadrilha. Em São José dos Campos, interior de SP, o companheiro Renatão foi processado pela mesma juíza que ordenou o massacre do Pinheirinho, por organizar um tradicional bloco de carnaval do Sindicato dos Metalúrgicos da região.”
 
Ao final do ato, foram organizadas comissões de diálogo com os movimentos sociais, com profissionais do Direito, e outra comissão que reúne os parlamentares, para organizar a luta em defesa da democracia nos mais diversos âmbitos de atuação. Antes de a atividade encerrar, chegou a informação que a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) acabara de abrir um inquérito disciplinar contra a deputada estadual Janira Rocha (PSOL-RJ) por esta ter dado carona à advogada Eloísa Samy ao sair do Consulado do Uruguai, onde foi pedir asilo na segunda-feira.
 
Mídia criminaliza e faz o serviço sujo dos governos
Em matéria publicada no jornal O Globo, são feitas acusações a diversos sindicatos, como o Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe-RJ) e o Sindipetro-RJ, por envolvimento com os ativistas acusados. Além de notoriamente inverídica, a reportagem tem perigosas implicações para a relação entre meios de comunicação e liberdades democráticas.
 
Segundo O Globo, a investigação da polícia civil “revelou indícios do envolvimento de sindicatos no financiamento de protestos”. Os supostos indícios “foram usados para abrir um novo inquérito, com o objetivo de chegar aos financiadores”. Ainda, segundo a reportagem, foram lançados coquetéis molotov contra os integrantes da Força Nacional de Segurança.
 
O Sepe-RJ, em nota, refuta as acusações do jornal, afirmando que suas reivindicações são elaboradas pelo conjunto da categoria dos educadores por meio de assembleias e que nelas não constam “apoio do sindicato a atos violentos e de dilapidação do patrimônio público ou privado”. O sindicato diz, ainda, que nada é decidido de forma secreta ou clandestina, já que as reivindicações “são amplamente divulgadas pela imprensa do sindicato, através da página oficial do Sepe-RJ na internet ou quando a Coordenação Geral é chamada para entrevista”.
 
Já o Sindipetro-RJ, em nota assinada por seu secretário-geral, Emanuel Cancella, rejeita “as distorções trazidas na matéria ‘A conexão sindical’ do Jornal O Globo desta terça-feira, 22 de julho, que busca criminalizar movimentos sociais e manchar o nome e a história de luta da nossa entidade”. Além disso, diz que a suposta ajuda dada a manifestantes, na verdade, se tratava de auxílio dado a atos políticos legais, como “o protesto contra o leilão de Libra e outras manifestações, como os atos contra a privatização do Maracanã, em defesa da Aldeia Maracanã, contra a demolição da Escola Municipal Friedenreich, do Célio de Barros e do Parque Aquático Julio Delamare. Consideramos legítimo o apoio à livre expressão dos movimentos sociais na luta por direitos sociais e por uma vida melhor. Nada disso é proibido pelas leis brasileiras”.
 
Por fim, o Sindipetro questiona a ética editorial da reportagem, “que deu um péssimo exemplo de jornalismo ao publicar matéria baseada em inverdades e sem ouvir a versão dos fatos do alvo de seu ataque, neste caso, nós do Sindipetro-RJ”.
 
Quanto às escolhas da matéria, um aspecto da nota assinada por Cancella é sintomático: a falta de provas sobre a suposta violência dos manifestantes contra a Força Nacional de Segurança (FNS), no ato contra o leilão de Libra, na Barra da Tijuca. “Diferente do que fala a matéria, também vale destacar que a violência no ato contra o leilão de Libra partiu da força policial. Temos toda a manifestação gravada e nos colocamos à disposição para comprovar essa grande inverdade da matéria”. Ou seja, a reportagem de O Globo não apenas não ouviu todas as partes envolvidas, como não foi a fundo na apuração dos fatos.
 
Nós, do PSTU do Rio, estivemos presentes ao ato e não vimos nem coquetéis molotov, nem que a violência tenha partido dos manifestantes. Ao contrário, foi a FNS que investiu contra os ativistas, que pouco fizeram além de se proteger das bombas de gás e balas de borracha.
 
Cabe então perguntar: o que deseja o jornal O Globo com essa linha editorial? As suas tão propaladas isenção e credibilidade podem ser levadas a sério diante de acusações sem fundamento? Sua suposta imparcialidade leva a que só um dos lados da questão seja ouvida? Ou trata-se de validar a tentativa de criminalizar os movimentos sociais por meio de um discurso que diz que quem vai às passeatas é vândalo e que sindicatos, fóruns de ativistas ou partidos são quadrilhas?
 
À noite, ato cultural pede libertação dos presos políticos
No fim do dia, outra manifestação, realizada também no centro do Rio, pediu liberdade aos presos políticos. Reunidos em frente ao Tribunal de Justiça, os ativistas lavaram a escadaria do prédio em protesto às prisões arbitrárias e em alusão do caso de Rafael Braga. Ele, preso por supostamente portar explosivos e detido no complexo penitenciário de Bangu, estaria na verdade levando detergente em sua mochila.
 
Apesar da forte presença policial, o ato – que marchou do TJ até a Cinelândia, onde um show aconteceu – transcorreu em calma. A propósito da presença da PM, chegou a nosso conhecimento que uma profissional de imprensa ligada à esquerda foi continuamente provocada pelos policiais, que diziam a ela que “isso não ia dar em nada”, “que todo mundo ia mofar na cadeia”, entre outras afrontas.
 
Também presente no ato à noite, Cyro Garcia falou da criminalização dos movimentos sociais e da necessidade de se desmilitarizar a polícia. “Exigimos liberdade imediata a todos os lutadores da classe trabalhadora e arquivamento dos processos em curso”, disse.