No último sábado, dia 27, um grupo de cerca de 60 pessoas organizou um violento ataque contra lésbicas, gays, travestis e emos que costumam se reunir em frente ao shopping ABC. Sob os gritos de “quem for gay vai apanhar”, os agressores, muitos conhecidos como carecas, espancaram, jogaram ao chão e chutaram sem dó os LGBTs que estavam no local. Dentre os vários feridos, um menino foi levado de ambulância para o hospital.

Sobre a condução do caso pela polícia, segundo entrevista da vereadora Heleni Paiva (PDT), que está acompanhando o processo, a polícia civil se negou a realizar BOs (boletins de ocorrência) alegando que os jovens “não são vítimas”.

Para nós do PSTU esse fato, como tantos outros, é muito significativo. Para explica-lo, é preciso aprofundar quatro elementos.

Lamentavelmente, a atuação de grupos homofóbicos e racistas em São Paulo e na Grande São Paulo não é novidade. Ao que parece, vem crescendo nos últimos tempos como expressão da barbárie para a qual caminhamos. Aqui se encontram algumas das piores ideologias produzidas e alimentadas pelo capitalismo, como o pensamento nazi-fascista, a homofobia, o racismo etc.

Um segundo elemento não pode passar em vão. O conjunto das ideologias que orientam a ação de tais grupos recebe o respaldo dos setores mais reacionários da igreja católica e das evangélicas, com seus vociferantes discursos e campanhas contra nós, defendendo que somos uma anormalidade, uma ameaça aos valores morais como a família e a propriedade privada. É importante lembrar que estes representantes do pensamento medieval atuam de dentro do Estado burguês, via sua frente única antigay denominada bancada católica e evangélica do congresso nacional. Eles usam o aparato de Estado, assim como suas empresas de comunicação, para fomentar o ódio e a intolerância.

Em terceiro, encontra-se o próprio Estado burguês, inevitavelmente impregnado pela hipócrita e preconceituosa moral burguesa, que faz vista grossa para casos como este, tão bem expresso pela atitude da polícia civil negando-se a realizar os BOs. Aqui, não podemos omitir o papel do governo Lula que, para cooptar setores do movimento LGBT para a via morta da burocracia estatal, realiza atividades formais e falsas como a conferência nacional para elaboração de políticas públicas para LGBTs, ocorrida recentemente, onde a grande maioria das exigências do movimento foram reconhecidas pelo governo. Entretanto, este nada faz de concreto para resolver nossos problemas.

Por fim, é preciso discutir com atenção o papel de boa parte do movimento gay. Obedecendo a lógica do capital e da “indústria cor-de-rosa”, a tradição das paradas – que começou exatamente como uma violenta rebelião de rua contra o preconceito e a violência que sofremos, em 1969 em Stonewall nos Estado Unidos – se transformou num dia de festa sem conteúdo político, de reivindicação ou de denúncia, chegando ao absurdo de serem proibidos carros de som com este propósito, tal como ocorrido no episódio do veto ao carro da Conlutas na última parada de São Paulo.

Além disso, e em total coerência com a lógica de cooptação pelo Estado, setores crescentes do movimento apostam agora nas eleições, chamando gays e lésbicas a votarem num absurdo arco de candidatos que vai desde partidos de esquerda até representantes da direita mais tradicional e preconceituosa que existe neste país. Com isso, tentam nos transformar em massa de manobra eleitoral de políticos e governos comprometidos com as igrejas e o capital, semeando ilusões no discurso de avanço na “cidadania”, de reconhecimento do Estado, de luta por dentro das instituições “democráticas” etc.

Assim, a combinação destes elementos criam as condições necessárias para a realização destes atentados contra os homossexuais. Gangues fascistas de “pit-bulls” da burguesia, setores reacionários das igrejas que usam descaradamente tanto o Estado como seus meios de comunicação para respaldar e fomentar tais ações, um governo demagógico de joga uma cortina de fumaça sobre suas contradições para silenciar os movimentos e, por fim, setores do próprio movimento que, prostituídos para o capital e o parlamento, tentam de todas as formas apagar qualquer vestígio da real história de luta e resistência do movimento LGBT.

Os gays e lésbicas da classe trabalhadora e da juventude precisam entender que o episódio do ABC, assim como o dos sargentos gays do exército, ou o atentado contra um jovem negro na rua Augusta em São Paulo há poucos meses, ou ainda os inúmeros casos de violência e assassinatos de travestis e transexuais pelo país à fora, não são casos isolados.

Estamos convencidos de que a crescente onda de “terrorismo antigay” é a ponta de um iceberg. É a expressão mais imediata de uma estrutura opressão e exploração que se articula desde o Estado, o clero e os salões da burguesia, sob a conivência de grupos cooptados, e se entrelaçam como uma ampla engrenagem que cria o pano de fundo necessário para a violência contra nós.

Deste modo, a alternativa posta para lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transgêneros é a organização e a luta concreta. A retomada das paradas de luta, ao estilo de Stonewall, não só contra as gangues neofascistas, mas também denunciando a demagogia do governo, o papel nefasto destas igrejas, a conivência do Estado e a homofobia dos aparatos repressivos, desde as polícias até as Forças Armadas. Os jovens LGBTs que sofreram este irracional ataque no ABC, assim como os demais gays e lésbicas que sofrem cotidianamente com a violência, precisam se organizar e resistir, compreendendo que por traz dessa violência existe a articulação de interesses das classes dominantes, do capital e dos porta-vozes da moral burguesa.

Para nós, do PSTU, a única forma de acabar com tais atentados é atingir as profundas raízes das quais se alimentam a homofobia e o preconceito, ou seja, o sistema que coloca estes setores no centro do poder econômico e político, o capitalismo, seu Estado e suas instituições. Cada vez mais, a luta contra a opressão, é, inevitavelmente, uma luta socialista.