O movimento operário brasileiro vive um importante momento de reflexão política que pode ser sintetizado na necessidade de superação política do PT e da CUT e UNE, transformadas em correias de transmissão da política do Estado burguês e do imperialismo.

Vivemos uma reorganização que está apenas começando, mas já apresenta seus resultados com o surgimento de novos partidos, organizações sindicais e fóruns de debate. A busca de novas alternativas define esse momento particularmente rico do movimento operário brasileiro.

Como antes, será a estratégia que guiará a tática. Caso a nova vanguarda das lutas e as organizações criadas por elas não identifiquem a base material que levou à degeneração de suas “velhas organizações”, esse processo nas “novas” alternativas será mais acelerado do que ocorreu com PT e a CUT.

Neste artigo abordaremos um aspecto dessa discussão, a estratégia frente à democracia burguesa e as confusões na esquerda sobre o tema.

Estado e Regime
Para o marxismo, as Forças Armadas são a principal instituição do Estado. É a garantia da defesa da propriedade privada, seja no cotidiano das lutas parciais, ou em situações revolucionárias que questionam a dominação burguesa e o seu controle sobre a consciência das massas.

Não há dúvida de que quando as ações do proletariado superam os limites impostos pela democracia burguesa, ameaçando a propriedade privada, a burguesia impõe o regime de terror contra as massas.

O fato de que o Estado tem como instituição fundamental as Forças Armadas não significa que a condução dos negócios cotidianos da burguesia se apóie sempre nessa instituição. O Estado é um conjunto de instituições, mas a classe que está no poder não as utiliza sempre da mesma forma para governar. “O regime político é a combinação ou articulação específica das instituições estatais, utilizadas pela classe dominante, ou por um setor dela, para governar” (Nahuel Moreno, As Revoluções do século XX, Ed. José Luís e Rosa Sundermann). Para definir um regime político, devemos responder às seguintes perguntas: qual é a instituição fundamental do governo? Como ela se articula com as demais instituições estatais? A partir desse critério proposto por Moreno, definimos qual o regime vigente.

O Estado burguês desenvolveu vários tipos de regimes: a monarquia absoluta e as monarquias parlamentares, as repúblicas, as ditaduras (militares, onde o exército é a instituição chave, ou as fascistas, originadas pelos bandos armados). Por fim, as democracias burguesas, onde o parlamento é a principal instituição.

Em geral, há confusão entre o que são as liberdades democráticas e o que é o regime democrático-burguês e seus instrumentos de dominação e manutenção da propriedade.
Essa “confusão” leva a enaltecer a democracia burguesia e a não vê-la como um dos principais instrumentos da burguesia para deter processos revolucionários.

Ao não distinguir esses dois elementos, os partidos que se reivindicam marxistas passam a adotar estratégias opostas em relação ao Estado e ao regime democrático-burguês.

Democracia e liberdades democráticas
Trotsky diz que “para os operários, a redução da jornada de trabalho é a pedra fundamental da democracia, porque é a única forma possível de ter participação real na vida social do país”. (Escritos, T.II,Vol.1, p.43).
Quando os trabalhadores conquistam o direito de organizar sindicatos e partidos, ou seja, o direito a se organizarem como classe, podemos afirmar que esse fato se constitui em uma conquista democrática, uma ampliação das liberdades dentro da sociedade.

Mas esse fato não pode nos confundir com a democracia burguesa como regime. Essa é uma das formas que tem a burguesia de exercer sua ditadura ante toda a sociedade. Suas regras de alternância no governo pelas eleições periódicas, a ilusão da separação dos poderes do Estado, é tão somente uma forma de permitir a alternância entre os distintos setores da burguesia no controle do Estado.

A democracia burguesa é o melhor regime para a burguesia, na medida em que permite que os distintos setores burgueses se alternem no controle do Estado sem apelar para a guerra civil.

Enquanto existirem as classes sociais, a democracia sempre será interna à classe que controla a sociedade. Qualquer regime, independente do grau de liberdade que ofereça às outras classes da sociedade, será sempre uma ditadura sobre a classe oprimida.

Qualquer analista burguês, quando se refere ao grau de liberdade de um país, sempre se refere às liberdades individuais. Mas os indivíduos se relacionam na sociedade através da classe a que pertencem. Um burguês pode desfrutar da liberdade de ir e vir, pois pode comprar a qualquer momento um avião, pode se candidatar a deputado, pois tem como financiar a campanha, enfim, a posse da propriedade privada lhe oferece ampla liberdade.

Os operários, em contrapartida, caminham até o trabalho, se o salário não dá para pagar a passagem e alimentar a família, não podem ser candidatos a deputado, a não ser que um burguês financie a campanha. Por isso, somente ampliando sua organização como classe é que os oprimidos podem desfrutar de alguma liberdade na democracia burguesa.

Portanto, democracia e liberdade são dois conceitos que se relacionam, mas não significam a mesma coisa. As liberdades democráticas que os trabalhadores arrancaram da burguesia não podem se confundir com os instrumentos do regime democrático-burguês, cujo objetivo é manter a ditadura da burguesia.

É exatamente esse detalhe que faz uma profunda diferença na hora em que os partidos e organizações definem sua política. O partido revolucionário se apóia nas liberdades democráticas e defende sua ampliação. No Brasil, não somente defendemos a existência dos sindicatos, mas o direito democrático da organização por local de trabalho, negado pela burguesia.

A luta dos sem-terra, por exemplo, é uma luta democrática pelo acesso à propriedade da terra que o capital nega à maioria da população rural.

Essa defesa, entretanto, jamais se confunde com a defesa das instituições do regime democrático-burguês. A principal ideologia da democracia é a crença de que as eleições são capazes de destruir a ditadura burguesa.

Toda a estratégia de reformas do PT passava por controlar uma das instituições do Estado, o governo. O resultado foi sua incorporação ao regime, que transformou o PT em uma correia de transmissão dos interesses do imperialismo.
Post author João Ricardo Soares, da Secretaria Nacional de Formação do PSTU
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