Parlamentares também recuam e propõem reajuste de `apenas` 28%, algo que a maioria dos trabalhadores não teve nos últimos anosO Supremo Tribunal Federal decidiu no dia 19 suspender, ainda que provisoriamente, o reajuste de 91% aos parlamentares, de R$ 12.800 para R$ 24.500. O Congresso pautou novamente o assunto para votar o aumento através de um decreto legislativo. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB/SP), deve submeter a questão ao plenário ainda neste dia 20. O Senado decidiu aguardar a decisão da Câmara.

Entretanto, diante da polêmica e indignação geradas nos últimos dias em razão do aumento de 91%, as bancadas parlamentares resolveram recuar e propor um aumento de `apenas` 28%, o que elevaria os salários para cerca de R$ R$ 16,5 mil. O novo valor é defendido por ser o acúmulo da inflação no período. Mas é importante lembrar que a maioria dos trabalhadores não teve sequer esta reposição inflacionária em todos os últimos anos.

Ao contrário do que vinha sendo propagado por Aldo Rebelo, não haverá nenhum corte nas verbas extras que os parlamentares recebem todo mês. Atualmente são pagas várias cotas mensais, entre verba indenizatória (R$ 15 mil), para contratação de assessores (de R$ 50 mil a R$ 87 mil) e cota aérea, que inclui parlamentares do Distrito Federal. Além disso, deputados e senadores recebem 15 salários anuais.

Enquanto isso, as centrais sindicais e o governo já fizeram um acordo neste dia 20 para `reajustar` o salário mínimo para R$ 380. A bancada governista no Congresso propunha um salário mínimo de R$ 367. O PSDB/PFL, por sua vez, defendia R$ 375. Agora, a CUT está comemorando os ridículos R$ 380 fechados na negociação. Todos alegam que um aumento superior a esse pode “estourar” os gastos públicos e aumentar o rombo da Previdência – leia-se “estourar” os compromissos com o pagamento dos serviços da dívida pública.

Todo esse debate se dá menos de um ano depois de um período de intensa crise política, na qual os escândalos de deputados sanguessugas e mensaleiros ocupavam as primeiras páginas de jornais todos os dias. Como se já não bastasse tudo o que os picaretas sugam ilegalmente dos cofres públicos para seus bolsos, agora resolveram legalizar o mensalão.

Indignação e protestos
A indignação da população cresce desde que foi aprovado o aumento exorbitante aos deputados e senadores. Manifestos na internet, cartas aos jornais e revistas, protestos de rua, abaixo-assinados e atos individuais foram feitos nos últimos dias contra a atitude dos parlamentares de aumentarem seus próprios salários em 91%. Até mesmo a CUT governista e a Força Sindical tiveram que se mover e fazer abaixo-assinado e atos em várias partes do país contra a decisão. Mesmo assim, essas entidades se limitam a defender um reajuste um pouco menor menor aos picaretas, algo que eles mesmos já estão propondo.

Dentre os atos individuais, destacou-se o da pensionista baiana Rita de Cássia Sampaio de Souza, que esfaqueou com uma peixeira nas costas o deputado federal Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), na tarde de 18 de dezembro. “Estou muito revoltada com a classe política. Eles têm tudo, altos salários, mordomias, e eu nem sequer consigo sacar o meu FGTS“, afirmou. Ela foi presa em flagrante e autuada por tentativa de homicídio.

No mesmo dia pela manhã, um homem havia se acorrentado a uma pilastra do Salão Azul do Senado, quase em frente ao gabinete do presidente Renan Calheiros (PMDB-AL), em protesto contra o aumento de 91% do salário dos congressistas. Willian Carvalho é servidor aposentado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e cientista político formado pela Universidade Federal de Minas Gerais.

“Alguém está louco e eu acho que não sou eu. Precisamos chamar os senhores deputados à razão antes que comecem a jogar bomba no Congresso. É o Parlamento mais caro do mundo. Eles estão se distanciando cada vez mais da nação“, disse Willian. Ele poderá ser acusado de perturbação da ordem e desobediência, com pena de prisão por um mês a um ano e multa.

Dobrar o salário mínimo, acabar com a mamata dos picaretas
Não é suficiente suspender os 91% e manter um reajuste de 28%, somado a todos os privilégios que os parlamentares já possuem. É preciso que os deputados e senadores recebam salários equivalentes aos dos trabalhadores, compatíveis com os de operários especializados. Também é urgente acabar com todos os privilégios dos parlamentares, instituindo o fim dos foros privilegiados e dos sigilos bancário e fiscal. É preciso ainda acabar com a impunidade desse Congresso de picaretas, instituindo a revogabilidade dos mandatos e a prisão e confisco de bens para todos os corruptos e corruptores.

O debate sobre o salário mínimo deveria se pautar nas necessidades de vida do trabalhador e de sua família, conforme está previsto na própria Constituição. O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) calcula que hoje o mínimo deveria valer R$ 1.447, para satisfazer as exigências mínimas definidas pela Constituição. É preciso dobrar o salário mínimo de imediato, com objetivo de chegar ao valor do Dieese.