Rosa e José Luís Sundermann foram barbaramente assassinados há 10 anos. Até hoje os responsáveis pelo crime continuam em liberdadeNo dia 12 de junho, de 1994, foi brutalmente assassinado o casal José Luís e Rosa Sundermann. José Luís era dirigente do Sindicato dos Servidores da Universidade Federal de São Carlos e dirigente nacional da Fasubra. Rosa era dirigente da Convergência Socialista na região e havia sido eleita para o Comitê Central do PSTU, no congresso de fundação do partido, uma semana antes de seu assassinato.

Rosa e José Luís foram assassinados por serem dois lutadores socialistas e abnegados ativistas no combate à exploração. Eles acreditavam na possibilidade de uma revolução social que acabasse com a fome e a miséria em nosso país e no mundo. Por este motivo, trabalhavam cotidianamente na construção de um verdadeiro partido revolucionário que fosse capaz de organizar esse processo.

Os dois sempre estiveram presentes nas lutas sociais e mobilizações, enfrentando os interesses dos poderosos, a quem mais interessaria o duplo assassinato. Ainda assim, não são todos os que estão dispostos a correr os riscos que envolvem tal crime. Somente aqueles poderosos que, por já estarem envolvidos em atividades criminosas, sem nunca terem sido punidos, acreditam que um crime a mais ou a menos não faz diferença.

Esse tipo de perfil se encaixa com o de fazendeiros, latifundiários e agentes da repressão do Estado, que atuam em regiões do país onde o conflito armado e a impunidade de mandantes de crimes são comuns.

Um crime cometido por profissionais

Rosa e José Luís foram encontrados mortos em casa, às 3h30min da madrugada. A porta estava aberta, as luzes acesas e a televisão ligada. José Luís estava caído de lado, com duas perfurações de bala no lado esquerdo da cabeça. Provavelmente, ele estava sentado em frente à televisão, quando o assassino entrou, pela porta aberta, e deu-lhe um tiro fatal na cabeça. O assassino conhecia José Luís, e sua fama de valente, sem medo de enfrentar os inimigos. Por isso, buscou um ângulo em que José Luis não pudesse ver de onde, e de quem, veio o tiro. O segundo tiro foi dado à queima-roupa. Rosa estava caída ao seu lado. Ela viu José Luís ser morto e tentou se defender; o primeiro tiro atingiu-lhe o antebraço; como não a matou, o assassino aproximou-se, quebrou-lhe o maxilar, com a coronha do revólver, encostando a arma em sua cabeça e atirando.

Somente assassinos frios e calculistas invadem uma casa, na calada da noite, de maneira silenciosa, sem que os vizinhos vejam ou ouçam nada, e matam com tal precisão e frieza. As características do crime indicam uma execução cuidadosamente planejada e executada por profissionais.

As investigações policiais concluíram que nada foi roubado da casa, sequer talões de cheque ou cartões de crédito. Tudo isso pode ser constatado no Inquérito Policial, aberto há 10 anos.

Entidades exigem apuração rigorosa

O Instituto José Luís e Rosa Sundermann, o movimento popular, familiares, especialistas em direitos humanos, parlamentares, entidades estudantis e sindicais de várias categorias profissionais, a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e a Ordem dos Advogados do Brasil pressionaram pela realização da investigação. Tudo isso está constatado nas reivindicações apresentadas no Inquérito Policial; com pedidos de acareações, oitivas (audiências para ouvir testemunhas) e diligências (investigações com deslocamento policial). No entanto, sempre houve relutância policial para realizá-las. Investigar a possibilidade de crime político ou de vingança política motivada, era a linha indicada pelas entidades, devido às evidências e denúncias, mas nunca a investigação ocorreu de forma incisiva.

Apesar de ainda não se ter evidências de quem foi o autor do crime, há suspeitas plausíveis de quem foi o autor intelectual, ou seja, o mandante. Mas essas evidências não foram levadas em conta.

Passados 10 anos, a Polícia Civil do Estado de São Paulo tem conduzido as investigações de forma esquiva e omissa. As fotos da cena do crime foram queimadas misteriosamente e, em muitas
ocasiões, as autoridades policiais se recusaram a seguir a linha de investigação defendida pelas entidades que reivindicam a apuração do duplo assassinato.

A própria polícia da região chegou a admitir que não tinha capacidade de solucionar o crime e pediu reforços. A equipe especializada do Departamento de Homicídios e Proteção a Pessoa da Capital foi solicitada para assessorar as investigações na cidade. A solicitação não foi aceita.

* Advogados, membros do Instituto José Luís e Rosa Sundermann, que vêm acompanhando as investigações desde o início. Já trabalharam neste caso com os advogados Idibal Piveta e Sandro Fernandes.

  • O Estado é responsável pela impunidade

    A prática do Direito Internacional tem estabelecido que atos como omissão em investigações podem dar lugar à responsabilidade internacional do Estado. Isso porque as violações de direitos humanos também ocorrem por incapacidade ou pela negativa do Estado em tomar medidas.

    Na verdade, em muitos casos, analisados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e pela Corte Internacional de Justiça, em Haia, o Estado é responsabilizado pelas condutas ilegais ou negligentes que são feitas por seus agentes dentro do seu território.

    As recorrentes violações dos direitos humanos, a existência de grupos de extermínio, a violência no campo, persistem porque o Estado não prioriza as investigações. É o caso de Rosa e José Luis.

    Os direitos humanos não abarcam simplesmente o direito à vida, mas também o direito à proteção judicial, fazendo com que a impunidade seja uma de suas violações mais graves.

    Sendo assim, não nos restam dúvidas. O governo do estado de São Paulo e o governo brasileiro são culpados pelos assassinos de José Luis e Rosa continuarem em liberdade. O crime correu no governo Itamar Franco e não foi solucionado. Por oito anos de FHC, os responsáveis continuaram impunes. E, agora, no governo Lula, nenhum passo foi dado em direção à apuração do assassinato de Rosa e José Luís.

    Por isso, não nos calaremos. A campanha continua e exigimos:
    Justiça.
    Apuração do crime.
    Punição exemplar para os culpados.

    Post author Américo Gomes e Fabiana Amaral, do Instituto José Luis e Rosa Sundermann
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