(Resende - RJ, 17/08/2019) Presidente da República, Jair Bolsonaro durante o desfile militar.rFoto: Marcos Corrêa/PR

Bolsonaro parece estar mais próximo de uma definição sobre o seu projeto de Bolsa Família “turbinado” em substituição ao auxílio-emergencial, que já cortou pela metade e tem validade só até o final deste ano. “Se não aparecer nada, vou tomar aquela decisão que o militar toma“, disse à imprensa nesta terça-feira. E a decisão tão corajosa que o presidente quer tomar é a de tirar bilhões da Educação, dos aposentados e dos pensionistas para garantir sua reeleição.

Após ter decretado a “proibição” de qualquer discussão sobre o “Renda Brasil”, projeto queimado antes mesmo de ter sido concluído por propor tirar dinheiro do abono-PIS, do BPC (Benefício de Prestação Continuada – pago a idosos carentes) e do congelamento das aposentadorias, o governo simplesmente mudou o nome do programa e dirigiu seus ataques contra aqueles que considerou mais vulneráveis: as crianças e os mais idosos. Agora, porém, não é uma tática de “jogar um verde” para ver se cola. Trata-se de proposta oficial do governo, apresentada junto aos líderes do Congresso.

A proposta de financiamento do “Renda Cidadã” retira 5% dos recursos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), o mesmo que o governo tentou enterrar no Congresso Nacional em agosto passado. Na prática, isso significaria desviar R$ 8 bilhões das verbas destinadas à Educação básica. Segundo a revista Exame, isso poderia afetar 17 milhões de alunos de 2,7 mil municípios, sobretudo os mais pobres que dependem dos repasses do fundo.

17 milhões de estudantes seriam afetados pela medida Foto: Caco Argemi / CPERS – Sindicato

A outra parte do custeio do programa viria do pagamento dos chamados “precatórios”, dívidas judiciais que o governo tem a obrigação de pagar. Grande parte dessas dívidas são de ações pedindo revisão de aposentadoria ou de pensão, que já foram julgadas. A proposta do governo limita o pagamento desses precatórios em 2% da receita líquida no ano, o que significa na prática retirar R$ 39 dos R$ 55 bilhões previstos para 2021. Isso vai adiar indefinidamente o recebimento dessa dívida. Ou seja, muitos morrerão sem receber o que têm direito.

O ataque à Educação e aos aposentados e pensionistas serviria para Bolsonaro tentar manter parte do apoio que angariou nos últimos meses devido ao auxílio-emergencial de R$ 600. O mesmo que ele propunha que fosse, originalmente, de R$ 200. A tal “Renda Cidadã”, no entanto, não seria nem próxima ao atual auxílio-emergencial, que já era insuficiente. O plano prevê a inclusão de 6 milhões de famílias no Bolsa Família, que hoje atende 14,2 milhões. O valor pago a esses pouco mais de 20 milhões de beneficiários ficaria entre R$ 200 e R$ 300, a depender do Orçamento.

O valor é menor que a metade do auxílio-emergencial, e o montante de beneficiários menos de um terço dos 65 milhões que recebiam o benefício no auge da crise, antes dos recentes cortes do governo. Trata-se, assim, de um duplo ataque: faz um corte bilionário à Educação básica e dá calote nos aposentados, e, ao mesmo tempo, deixa milhões na miséria, ao Deus-dará numa crise que o próprio governo armou.

Mesmo assim, o mercado e grande parte da imprensa reagiram com temor ao anúncio do governo. As bolsas desabaram e os analistas da burguesia analisam como “populismo” e “pedalada fiscal” o Renda Cidadã, mostrando que a crise afeta também o andar de cima.

R$ 600 para todos que precisem até o fim da crise

Bolsonaro quer manter sua popularidade e, ao mesmo tempo, não mexer nos lucros dos banqueiros e grandes empresários, nem ao menos os privilegiados como a cúpula das Forças Armadas. Por isso se desdobra para não mexer no teto dos gastos e na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), atacando crianças pobres e aposentados . No entanto, se atacasse os lucros dos bilionários, teria dinheiro não só para o seu programa desidratado, mas para manter o auxílio-emergencial de R$ 600 para todos os 65 milhões, até o fim da pandemia e da crise econômica. É incrível ainda que, ao mesmo tempo em que faz essa proposta obscena, o governo esteja articulando no Congresso o perdão de R$ 1 bilhão da dívida das grandes igrejas.

É necessário e urgente garantir renda aos desempregados, precarizados e a todos que estão na pobreza e miséria, vítimas ainda da alta inflação dos alimentos. Assim como os pequenos negociantes e empresários arrasados pela crise. Mas Bolsonaro quer uma proposta eleitoreira que atende, de forma insuficiente, apenas pequena parte dos que necessitam, e ainda “tirando dos pobres para dar aos miseráveis”, como ele hipocritamente havia rejeitado. É preciso tirar dos bilionários, dos ricos, dos banqueiros e grandes empresários. Só taxando os lucros e fortunas dos bilionários já seria suficiente para arcar com os gastos do auxílio-emergencial de R$ 600 até o fim da crise.

Isso, porém, seria ainda insuficiente para sairmos desse quadro de catástrofe social que o governo aprofundou com a pandemia. É preciso garantir renda, empregos, salários e direitos. E para isso, atacar os lucros dos de cima. Reduzir a jornada de trabalho sem redução dos salários, abrindo novos postos, e revogar a reforma trabalhista, pondo em ação um plano de obras públicas para prover emprego aos desempregados.

Os recursos para isso passam por, além de taxar os ricos, reestatizar as empresas privatizadas, sob o controle dos trabalhadores, assim como o sistema financeiro, rompendo com a entrega do país e o domínio das multinacionais, que mandaram mais de R$ 1 trilhão de lucros para fora só entre 2010 e 2018.

O país precisa de um projeto revolucionário e socialista frente à crise capitalista.

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