“A senhora faz essas denúncias porque confia na Lei Maria da Penha”, ameaçou vereador que se posicionou favorável aos empresários dos transportes

“Agora acabou o sossego dos políticos tradicionais.”. A frase foi dita pela professora Amanda Gurgel (PSTU), logo após ser eleita a vereadora mais votada de Natal, e proporcionalmente do Brasil, com quase 33 mil votos. E realmente tem sido assim desde que ela e o partido assumiram o mandato. A maioria dos vereadores não consegue nem mesmo disfarçar o aborrecimento por ter uma representante dos trabalhadores e dos estudantes na Câmara Municipal. Seja apresentando projetos que atendem aos interesses da população mais humilde, o que incomoda às oligarquias, ou denunciando o jogo sujo do parlamento, a vereadora Amanda Gurgel (PSTU) vem tirando o sono de parlamentares corruptos e ligados aos grandes empresários.

O embate mais recente ocorreu no último dia 29, terça-feira, quando a professora Amanda denunciou a existência de uma “bancada dos empresários do transporte” na Câmara de Natal. Na ocasião, o legislativo votaria, em definitivo, uma alteração na Lei Orgânica do Município garantindo a unificação da bilhetagem eletrônica no transporte coletivo (entres ônibus e alternativos) e a devolução do controle da venda das passagens para as mãos da Prefeitura.

Atualmente, a emissão das passagens é feita pelo Sindicato das Empresas de Transportes Urbanos de Natal (Seturn), sem fiscalização rigorosa, o que impede, por exemplo, que se saiba qual a taxa de lucro das empresas. A proposta de mudança na Lei Orgânica foi enviada pelo próprio prefeito Carlos Eduardo (PDT), depois de muita pressão dos trabalhadores dos transportes alternativos (Sitoparn), que chegaram a ocupar a Prefeitura, em julho desse ano, reivindicando a unificação do bilhete e o controle da venda pelo executivo municipal.

A bancada dos empresários
Entretanto, na sessão que apreciaria definitivamente a proposta, que já havia sido votada por unanimidade em outra ocasião, um conjunto de 12 vereadores decidiu apresentar uma emenda surpresa ao projeto. A emenda mantinha a venda das passagens sob o controle dos empresários, delegando à Prefeitura apenas a “fiscalização”. Também ameaçava a unificação da bilhetagem eletrônica no transporte, já que mencionava que o Seturn (empresários) e o Sitoparn (alternativos) emitiriam seus próprios bilhetes de passagens. A unificação é reivindicada pelos trabalhadores dos alternativos desde 2008, quando o sistema de bilhetagem para os ônibus foi implementado, gerando uma “quebradeira” nos permissionários do transporte alternativo.  

A apresentação da emenda causou revolta nos trabalhadores do Sitoparn, que acompanhavam a sessão nas galerias da Câmara e decidiram ocupar o prédio em protesto contra a medida que beneficiaria os empresários. A sessão foi suspensa e os 12 vereadores foram vaiados. A vereadora Amanda Gurgel (PSTU), que desde o início deu apoio à luta dos trabalhadores alternativos, gravou um vídeo denunciando a existência da tão famosa “bancada do Seturn”. Curiosamente, a mesma que manteve o veto do prefeito ao projeto do Passe Livre. “Os vereadores que assinaram a emenda disseram, pelas próprias mãos, quem é a bancada do Seturn. São os mesmos que vetaram o Passe Livre. O que aconteceu aqui foi uma vergonha.”, criticou a vereadora do PSTU.

A denúncia despertou o ódio dos vereadores que propuseram a emenda em benefício dos empresários do transporte. Na sessão seguinte, no dia 30, que retomou a discussão do projeto, pelos menos três vereadores pediram a palavra para atacar e caluniar a vereadora Amanda Gurgel (PSTU). Tentaram desqualificar o mandato, acusando a professora de “mentirosa” e anunciando que apresentariam uma representação contra ela na Comissão de Ética da Câmara, em função da denúncia. O ataque mais violento e absurdo, contudo, foi feito pelo vereador Adão Eridan (PR), que chegou a ameaçar a vereadora do PSTU sugerindo uma agressão física. “A senhora faz essas denúncias porque confia na Lei Maria da Penha. Mas não se confie demais, não. A senhora pode se arrepender.”, chegou a dizer o vereador, que assinou a emenda em favor dos empresários.

“Nenhum vereador vai me silenciar!”
Sem se intimidar, Amanda voltou a denunciar a “bancada do Seturn” na Câmara, que sempre existiu, mas ainda não havia sido identificada nessa nova legislatura. “Vocês se posicionaram em favor do Seturn. Então é bancada do Seturn, sim. E pode me processar. Porque não vai ser nenhum vereador aqui, principalmente aqueles que fazem parte da Operação Impacto, condenados, que vai me silenciar.”, rebateu Amanda Gurgel, fazendo menção ao vereador Adão Eridan, que foi condenado pela justiça, em primeira instância, por receber propina de empresários do setor imobiliário durante votação do Plano Diretor de Natal, em 2007. Da atual legislatura da Câmara, também foram pegos na Operação Impacto os vereadores Aquino Neto (PV) e Júlio Protásio (PSB), hoje líder do prefeito. Os três recorrem da sentença em liberdade.

Depois de desmascarada a “bancada do Seturn” e de realizada uma ocupação da Câmara pelos trabalhadores dos alternativos (Sitoparn), a emenda foi refeita, dando o controle da venda das passagens à Prefeitura, mas permitindo uma brecha para que o prefeito Carlos Eduardo repasse aos empresários a emissão dos bilhetes.

Após a votação, na sessão do último dia 31, as ameaças do vereador Adão Eridan ainda receberam uma resposta do movimento feminista. Mulheres de diversas organizações que também combatem o machismo, como o Levante Popular, Movimento Mulheres em Luta (MML), ANEL, Coletivo Construção, PSOL e PSTU, protestaram na Câmara de Natal contra as declarações machistas dirigidas à vereadora Amanda Gurgel (PSTU). Nos cartazes, frases como “vereador machista não nos representa” e “Adão Eridan, impactado e machista, não passará”.

O PSTU e o mandato da professora já estão tomando as medidas cabíveis para responsabilizar Eridan pela ameaça que fez. A vereadora Amanda Gurgel também entrará com uma representação na Comissão de Ética da Câmara contra o vereador machista. Em nota, a vereadora do PSTU ainda manifestou solidariedade ao vereador do PSOL, Sandro Pimentel, que também está sofrendo perseguição. “Essa é uma clara tentativa de nos intimidar e amedrontar. Estamos incomodando por denunciar os absurdos da política tradicional e seus políticos. Não vamos parar. Qualquer tentativa de cassação dos nossos mandatos será um golpe à democracia e aos trabalhadores de Natal.”, destacou Amanda.

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