O presidente iraniano cancelou visita ao Brasil. Ele, que é conhecido por declarações preconceituosas e pelo autoritarismo, fez uma análise correta ao classificar Israel como um Estado racistaO presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, é conhecido por declarações preconceituosas, que refletem de forma cristalina a condução autoritária daquele regime islâmico contra as lutas dos trabalhadores e oprimidos. No entanto, todo o barulho que a mídia e os países imperialistas fizeram recentemente não tem nenhuma relação com tais manifestações preconceituosas, por um simples motivo: as últimas declarações de Ahmadinejad foram embasadas na mais correta análise sobre o Estado de Israel, isto é, aquela que toma a única perspectiva legítima: a dos palestinos, vítimas desse Estado.

A identificação do regime iraniano com os palestinos perseguidos e oprimidos tanto dos territórios históricos palestinos ocupados por Israel quanto fora dele – no refúgio do Líbano, Jordânia e Irã – é uma questão importante para os governantes iranianos. Esse regime atualmente autoritário é o herdeiro, ainda que desfigurado e renegado, da Revolução Iraniana de 1979, cujo grande tema foi a expulsão do imperialismo da região.

O papel de Israel é, em essência, fazer o serviço sujo do imperialismo no Oriente Médio. Por isso, por trás de todas as declarações de Ahmadinejad há o mesmo cálculo político. Na declaração à Conferência da ONU, isso ficou explícito: “Os governos antissionistas devem ser encorajados e apoiados com vistas a erradicar esse racismo bárbaro e para que se reformem os mecanismos internacionais hoje existentes”. Contudo, ter o mesmo cálculo político não significa igualar todas suas declarações, por um simples motivo: umas são certas, outras erradas.

Os revolucionários diferenciam as declarações de Ahmadinejad
Quando Ahmadinejad proclama que nunca existiu o Holocausto – o extermínio nazista que executou das formas mais bárbaras milhões de judeus -, os revolucionários só podem rechaçar tal absurdo. Pois ali os judeus mortos não eram os sionistas que constituíram Israel, mas principalmente os judeus pobres e oprimidos.

Eram precisamente os judeus contra os quais os sionistas ergueram sua doutrina, buscando diferenciar-se da tradição marxista dentro da comunidade judaica. Eram os judeus que envergonhavam os sionistas, porque eram proletários e comerciantes pobres e apoiavam a esquerda. Eram os judeus cujos apelos de apoio militar e político para a luta contra o nazismo os sionistas ignoraram. Além deles, no Holocausto estavam também os marxistas, os socialistas, os ciganos e os homossexuais.

Mas quando Ahmadinejad denuncia os crimes do Estado de Israel como a mais pura manifestação da essência desse Estado – isto é, racista, genocida e colonialista -, os revolucionários não podem senão concordar, pois nada mais é do que a verdade. Uma verdade inextirpável da cabeça dos palestinos, que sofrem a barbárie sionista diariamente.

A tomada de consciência sobre a essência do Estado de Israel esteve ao alcance de todos os habitantes do planeta na mais recente ofensiva bélica israelense sobre os palestinos de Gaza, no ano-novo de sangue que esse Estado promoveu. Não bastasse a ofensiva e seus milhares de mortos e feridos, Israel prossegue seu bloqueio de fronteiras e ataques sistemáticos aos túneis escavados para “traficar” alimentos para dentro de Gaza.

Prossegue também a demolição de casas e plantações na Cisjordânia para a construção de assentamentos israelenses dentro dos últimos pedaços de terra palestina restantes. Junto ao muro de oito metros e aos postos de controle israelenses, os assentamentos e suas estradas visam tecer uma rede mortal que rapidamente asfixie os palestinos e os expulse.

Israel perdendo a batalha pelos corações e mentes
Israel vem perdendo apoio dia a dia. Os trabalhadores de todo o mundo sentem sua simpatia se acumular em favor dos palestinos. Isso se espalha entre os setores de classe média, como professores e estudantes universitários. Aos poucos, se constitui uma rede de solidariedade que já tem uma missão declarada: promover toda forma de boicote ao sionismo e ao Estado de Israel.

Atenta à essa movimentação, a mídia pró-sionista tenta confundir a opinião pública, expondo como porta-vozes máximos da luta contra Israel os regimes mais cruéis e autoritários do Oriente Médio, isto é, Irã e Síria. No caso de Ahmadinejad, desloca os contextos em que fez as suas declarações mais sensatas. Não é demais lembrar que sua última declaração se deu na Conferência da ONU Contra o Racismo, conhecida como Durban II.

A Folha de S. Paulo divulgou uma versão do discurso que incluía uma menção à “ambígua e dúbia questão do Holocausto”, ao passo que na transcrição disponibilizada pela BBC e PressTV, inquestionavelmente mais sérios que a Folha, esse trecho não contém essa menção: “De fato, em compensação pelas terríveis consequências do racismo na Europa, [as nações europeias e os EUA] ajudaram a implantar no poder, na Palestina, o mais cruel e repressivo regime racista”.

Recorrendo a falsificações grosseiras, a mídia tenta justificar o abandono da reunião pelos diplomatas dos países imperialistas, que não teve outra motivação senão a de esvaziar a reunião para não expor Israel e os EUA – que nem mesmo apareceram.

Agora a mídia aproveita-se das poucas e pequenas manifestações de sionistas em São Paulo e Rio de Janeiro para expor a “grande” comoção que a visita de Ahmadinejad estaria causando. Esse mote humanitário da mídia certamente não estava tão atento aos atos muito maiores em defesa de Gaza, muito menos noticiados.

Esse lobby sionista não se limita à mídia: tentou também cooptar os movimentos sociais de diversidade sexual e de direitos humanos. Apesar de um apelo inicial ter corrido listas de e-mail e a mídia ter noticiado a presença de outros grupos além dos sionistas nos protestos, a verdade é que os movimentos sociais não apoiaram em massa a movimentação, por perceber quão incômodo é um aliado como o Estado de Israel.

Mesmo assim, Ahmadinejad cancelou sua visita. O que parece uma vitória completa do lobby pró-Israel é muito mais uma manifestação das contradições do presidente iraniano. Ao não conseguir esconder sua faceta repressora e deixar apenas a antiimperialista e antissionista, não pode ter confiança em si mesmo e prefere não atrair atenção negativa que possa servir de munição à oposição iraniana às vésperas das eleições presidenciais em que é candidato.

Defesa da soberania iraniana, repúdio ao governo opressivo
Perante a ofensiva midiática e diplomática contra o governante iraniano que disse a verdade, a política dos revolucionários não pode ser outra senão a defesa da verdade: Israel é sim um Estado racista. Estamos todos contra o imperialismo e o sionismo agressor.

Essa posição não significa ignorar a opressão que sofrem os trabalhadores, os gays e lésbicas, os ateus e os socialistas sob o regime iraniano e o governo de Ahmadinejad. Não brindamos nenhum apoio a um governo que busca reaproximar-se do imperialismo, enquanto pratica demagogia com a luta palestina. Um governo que acolhe no discurso o grito iraquiano por liberdade, mas opera acordos por baixo do pano para manter a estabilidade do regime fantoche pró-americano.

Nossa esperança é com o redespertar, cada vez mais próximo, dos lutadores de esquerda iranianos, que têm a grande tarefa de retomar a Revolução Iraniana, maior insurreição de massas desde a Revolução Russa, do ponto em que ela foi interrompida e traída pelos aiatolás burgueses. Só um Irã socialista pode estar verdadeiramente voltado para a melhoria das condições de vida das massas persas e árabes e para a derrocada do imperialismo e do sionismo!