Deputado petista era vice-presidente da Câmara até ser envolvido com doleiro e esquema de desvio de verbas

Um jatinho e um passeio em família em João Pessoa (PB). Assim como há alguns anos um Land Rover virou o pivô de um escândalo que mostrou as relações espúrias entre dirigentes do PT e empresários, desta vez a viagem num jatinho foi o que revelou um esquema de corrupção envolvendo o deputado André Vargas (PT-PR), e o doleiro Alberto Youssef. Longe de ser um deputado qualquer da base petista, Vargas era até dias atrás vice-presidente da Câmara.

Por que um doleiro, envolvido em uma série de casos de corrupção, emprestaria um jatinho para um deputado viajar com a família para a praia? Quando foi revelada essa estranha cortesia, o deputado afirmou se tratar de algo normal, como se emprestar jatinhos fosse a coisa mais normal e descompromissada do mundo. “Conhecer alguém há 20 anos não é crime. Alberto Youssef é empresário de minha cidade. Dono do maior hotel da cidade. E os encontros, contatos e relações se deram dentro da legalidade“, divulgou em nota no começo do mês. O que o deputado petista se esqueceu de dizer foi que Youssef não era um mero empresário e que as relações que estabelecera com ele estão muito longe de qualquer “relação republicana”.

Alexandre Youssef foi preso no dia 17 de março na Operação Lava-Jato da Polícia Federal, que levou à prisão também o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa, no dia 20. A operação investiga lavagem de dinheiro e desvio de recursos na Petrobrás, cujo montante pode chegar a nada menos que R$ 10 bilhões. O doleiro mantinha uma série de empresas com contratos firmados com a Petrobrás que, acredita-se, sejam fraudados. Paulo Costa, por sua vez, foi preso com documentos que indicam repasses a políticos, possivelmente para despesas de campanhas eleitorais. Paulo Roberto recebeu de Youssef um Land Rover Evoque, mostrando que os políticos corruptos não possuem um gosto lá muito original.

“Vai valer a tua independência financeira. kkkk”
As investigações da Polícia Federal, por outro lado, revelam uma relação entre Vargas e Youssef que ultrapassam a mera amizade. Diálogos entre os dois interceptados durante o levantamento mostram que o deputado petista ajudou uma empresa de Youssef, o laboratório Labogen, a conseguir um contrato de R$ 31 milhões com o Ministério da Saúde. A empresa, claro, é de fachada. Em sua defesa, Vargas apenas disse que havia achado o projeto “interessante”. “Achei que era bom para o país, era bom para a economia“, afirmou à imprensa.

Se André Vargas achou o projeto bom para o país, com certeza ele achou muito melhor para si próprio. Num dos diálogos entre o  político e o empresário, em meio aos esforços para viabilizar o contrato entre o laboratório e o Ministério da Saúde, o doleiro afirma: “Cara, estou trabalhando, fica tranquilo, acredite em mim. Você vai ver quanto isso vai valer tua independência financeira e a nossa também, é claro, kkkkk“. 

Percebendo o cerco se fechar e vendo que não havia resposta plausível para as provas que apareciam, André Vargas renunciou à vice-presidência da Casa, se licenciou do mandato e, por fim, com a corda no pescoço, anunciou a sua renúncia para esse dia 15 de abril. O deputado ainda tentou resistir, espalhando a ameaça que, se caísse, levaria gente graúda junto. Dirigiu ameaças especialmente ao ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha (pré-candidato ao governo de São Paulo), a Gleisi Hoffmann e o seu marido, o ministro das Comunicações Paulo Bernardo, mas não teve jeito. Mesmo com a renúncia, porém, Vargas continua com o processo aberto no Conselho de Ética da Câmara, podendo ter o mandato cassado e ficando inelegível por oito anos.

O fundo da questão
O escândalo que atinge os contratos fraudados da Petrobrás, do Ministério da Saúde, empresas e políticos não traz nada de novo. Mostra como, nove anos após o mensalão, o PT continua utilizando as estatais para se financiar e para conquistar a “independência financeira” de seus quadros. Mostra, mais uma vez, a profunda degeneração política do Partidos dos Trabalhadores que, no poder, repete de forma sistemática as velhas práticas da direita e dos governos anteriores. Reafirma a degeneração moral dos dirigentes do partido que, para garantir seu modo de vida burguês e um jatinho para viajar nas férias, não pensa duas vezes antes de atacar as verbas da Saúde, num país em que se morre nas filas dos hospitais públicos.

Quando o PT fez a sua opção pelas grandes empresas, bancos e empreiteiras, fez também a sua opção pela corrupção. Financiado pelo grande capital privado, uma vez eleito, tem que garantir o retorno desse investimento. Quando explodiu o escândalo do mensalão, o PT ensaiou uma autocrítica. Agora, com vários de seus dirigentes atrás das grades, a história se repete. Vai ser o que agora? Um novo “golpe da direita”? A verdade é que as opções escolhidas pelo partido, e os compromissos assumidos, se revelam agora um caminho sem volta.

E a direita?
A direita, por sua vez, já explora o escândalo para se beneficiar eleitoralmente e avançar a privatização sobre a Petrobrás. No entanto, a direita não tem nenhuma moral para denunciar o que quer que seja. O governo de Geraldo Alckmin (PSDB), em São Paulo, chafurda no escândalo do cartel dos trens e metrôs. Um negócio bilionário que, se não é o maior, é um dos maiores casos de corrupção da história do país. Já em relação à Petrobrás, o discurso hipócrita dos tucanos não explicam que é justamente através dos contratos com as empresas privadas que se dá a maioria dos casos de corrupção.

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