Metalúrgicos da GM fecham a Dutra contra a ameaça de demissões

No último dia 26 houve finalmente o desfecho de mais um capítulo da luta contra a ameaça de demissões em massa da GM. A última reunião de negociação entre o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e a General Motors, a 12ª reunião desde que a empresa anunciou a decisão de demitir, durou quase 10 horas. Além dos representantes do sindicato e da montadora, a reunião também contou com a presença de representante do Governo Federal e da prefeitura da cidade.

Ao final, o acordo arrancado da GM estabelece a continuidade do MVA (Montagem de Veículos Automotores), uma das fábricas da planta de São José e que a montadora ameaçava desativar, demitindo todos os seus 1800 operários a partir do dia 28 de janeiro. O acordo estende o lay-off (suspensão do contrato de trabalho em que estão 750 trabalhadores) por mais dois meses, com o pagamento integral dos salários. Ao final desse período, se a empresa demitir esses funcionários, terá que pagar indenização de 3 salários, além dos direitos trabalhistas. Destes 750 trabalhadores, cerca de 150 são lesionados ou estão prestes a se aposentar, por isso voltarão necessariamente para dentro da fábrica, pois contam com estabilidade.

Com isso, a fábrica retoma a produção do modelo Classic, que havia sido suspenso, e o funcionamento do MVA até pelo menos dezembro de 2013. O acordo prevê ainda investimentos de R$ 500 milhões na planta de São José até 2017. Em contrapartida o acordo prevê, entre outras medidas, a extensão da grade salarial que já era vigente para o setor de manuseio (apoio), para alguns setores da produção (motores e transmissão). Esta grade tem um piso menor que o pago aos que trabalham diretamente na montagem de veículos e só poderá ser aplicada aos trabalhadores que forem contratados a partir de agora. Serão estabelecidas formas de evitar que os antigos funcionários sejam substituídos por novos.

Também há mudanças no controle da jornada de trabalho. O acordo autoriza, em momentos de alta na produção, a empresa a convocar os trabalhadores para trabalhar até duas horas a mais por dia, mediante pagamento de horas extras. Nos momentos de baixa da produção, a empresa poderá dar folga de, no máximo, um dia por semana para os empregados, totalizando um máximo de 12 dias no ano. Estas folgas serão compensadas posteriormente pelos empregados.

Foi o acordo possível, nas condições de relações de forças existentes. Não é o acordo que queríamos fazer. A extensão do lay off por mais dois meses garante que não haja demissões agora, mas não impede que a montadora demita estes companheiros dentro de 60 dias (com exceção dos lesionados e dos trabalhadores que estão perto de se aposentar), pagando uma multa de 3 salários para cada um. Foi o máximo a que conseguimos chegar, graças à mobilização dos trabalhadores, à resistência do sindicato e ao apoio que recebemos de várias entidades no Brasil e em outros países. Ou seja, conseguimos impedir o fechamento da fábrica, mas a luta contra as demissões dos trabalhadores que estão agora em lay-off ainda não terminou.

Ofensiva da GM
A atual ofensiva da General Motors começou em abril de 2012, quando a montadora divulgou seu plano de fechar o MVA, transferir a produção do Classic para outras plantas e demitir 1890 trabalhadores. O sindicato dos metalúrgicos e a CSP-Conlutas empreenderam então uma campanha em defesa dos empregos e exigindo a intervenção do Governo Federal, uma vez que a multinacional norte-americana recebe isenção fiscal do governo. Após uma dura batalha com a empresa, conseguiu-se suspender temporariamente as demissões, substituindo-as por lay-off com duração de 3 meses, que foi posteriormente prorrogado por mais dois meses até janeiro deste ano.

Nesse período, 300 trabalhadores aderiram ao PDV (Programa de Demissão Voluntária) aberto pela GM. No final do lay-off, no entanto, a montadora não só não recuava de seu plano de fechar a fábrica e demitir 1600 operários, como colocava no horizonte, a médio prazo, o fechamento da própria planta na cidade.

Em São José dos Campos, assim como ocorreu em 2008 quando a empresa tentou impor o Banco de Horas, o sindicato foi bombardeado por todos os lados. Uma campanha que uniu amplos setores da grande imprensa e o empresariado tentava responsabilizar o próprio sindicato pela ameaça de demissões. Reverberando o discurso da empresa, repetia-se à exaustão a falácia de que os “altos salários” recebidos pelos trabalhadores da GM estariam elevando os custos da empresa e inviabilizando sua permanência na cidade.

Com isso, a GM não planejava apenas atacar os trabalhadores, seguindo sua estratégia de redução de custos e reestruturação que impõe em todo o mundo. A multinacional tinha também como alvo a entidade que é referência nacional de luta e de sindicalismo combativo.

Mobilização impediu fechamento da fábrica
O sindicato e os metalúrgicos, por sua vez, não baixaram a cabeça para as ameaças da montadora e realizaram diversas mobilizações. Lutas que incluem atrasos na entrada, passeatas pela cidade e caravanas a Brasília, duas paralisações de 24 horas, e um longo etc. No último dia 22, os metalúrgicos fecharam a Via Dutra por duas horas, fazendo com que a ameaça de demissões fosse notícia em todo o país. No dia 23, houve um dia de ação global contra os ataques da GM, impulsionado pelo sindicato e com mobilizações na Alemanha, Espanha, Argentina e Colômbia.

Tudo isso foi muito importante, pois foi essa pressão dos trabalhadores que impediu que a GM fechasse a fábrica e demitisse 1800 trabalhadores. A campanha em defesa dos empregos também conseguiu tirar do horizonte a perspectiva de fechamento da planta. Mas isso não foi suficiente. O isolamento imposto à luta dos metalúrgicos da GM incidiu na própria consciência dos trabalhadores, levando a que não houvesse disposição de comprar um enfrentamento mais radicalizado com a empresa e que impusesse o retorno imediato de todos. Só uma greve por tempo indeterminado poderia criar condições para chegarmos a este patamar, o que geraria também condições para uma pressão mais efetiva sobre o governo. Mas não havia disposição dos trabalhadores para tanto.

O Governo Federal se limitou a mediar as negociações e se omitiu diante da ameaça de demissão em massa, mesmo a montadora se beneficiando da isenção do IPI. Nem mesmo uma declaração contra as demissões, como Dilma fez em 2012, ocorreu desta vez. Já a CUT, Força Sindical e a CTB agiram para isolar ainda mais os trabalhadores de São José e fizeram coro com a fábrica ao condenar o “radicalismo” do sindicato. Isso porque essas centrais praticam em suas bases todos os mecanismos de flexibilização exigidos pela GM e demais montadoras, como as grades salariais rebaixadas, banco de horas, etc.

Longe de ser um bom acordo, foi o possível diante dessa dura situação e não teria sido possível caso não houvesse mobilização. Além disso, garante mais tempo para seguir na luta contra as demissões e em defesa dos direitos dos metalúrgicos da GM. Os trabalhadores perceberam que foram até o limite de suas forças e o acordo teve a aprovação de mais de 95% das assembleias. Perceberam ainda que, para romper o isolamento imposto a anos de luta dos metalúrgicos de São José, é necessário reforçar a luta por um contrato coletivo nacional que impeça as empresas de fazer chantagens sobre os empregos e os direitos dos trabalhadores.

Leia abaixo os principais pontos do acordo:
(Fonte: Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região)

  • Investimento de R$ 500 milhões direcionados às áreas do Powertrain (motores e transmissão), Estamparia e S10, no período de 2013 e 2017.
  • Produção do Classic até dezembro, com 750 trabalhadores. Após esse período, haverá nova negociação.
  • Férias coletivas entre os dias 29 de janeiro a 14 de fevereiro para os trabalhadores da produção do Classic.
  • Quem está em layoff terá extensão do processo por dois meses. Ao final, se a empresa demitir, terá que pagar uma multa de três salários. O trabalhador poderá optar por sair imediatamente e receberá cinco salários, além dos direitos trabalhistas.
  • Renovação das cláusulas sociais na data-base da categoria para 2013 a 2015. As cláusulas econômicas serão negociadas em setembro. Nesse período não haverá abono.
  • PLR igual a de 2012 mais R$ 3.200, totalizando cerca de R$ 16 mil. Em maio, haverá negociação das metas. A primeira parcela será de R$ 6,6 mil.
  • Discussão entre GM e Sindicato sobre formas de antecipação da aposentadoria para quem estiver prestes a se aposentar.
  • A GM se compromete a negociar, em primeiro lugar, com o Sindicato, caso haja projeto de investimento em um novo veículo no Brasil.
  • Nova grade salarial para funcionários admitidos a partir da assinatura do acordo, apenas na fábrica de componentes (Powertrain, Estamparia e Plástico), com piso de R$ 1.800.
  • Jornada de trabalho que possibilita duas horas extras por dia e trabalho extraordinário aos sábados, alternadamente. Poderá haver folga em até 12 dias por ano, que serão compensados posteriormente.
  • Reaproveitamento de lesionados em atividades compatíveis, devendo ser definidas em conjunto com o sindicato.
  • Garantia do nivel de emprego até dezembro de 2013 no MVA e dezembro de 2014 para o restante da planta de São José dos Campos.
  • Ajuste na cláusula de nível de emprego da área de manuseio de materiais, de 1203 para 900 empregados.
  • Garantia de renovação/extensão dos acordos de jornadas diferenciadas de trabalho (6 x 1; turno de revezamento e jornada de domingo mediante pagamento de hora extra e com folga na semana) pelo período de dois anos.
  • Inclusão em cláusula de acordo coletivo, reconhecendo que o período de minutos que antecedem e sucedem a jornada contratual, limitados a 40 minutos diários, não serão considerados como tempo a disposição da empresa. Na hipótese de ocorrer desligamento da fábrica, o Sindicato ajuizará ação referente ao período anterior a esta negociação.
  • O acordo terá duração de dois anos.