O Brasil zerou sua dívida externa e já é agora credor. Foi o anúncio realizado com estardalhaço pelo governo Lula no dia 21 de fevereiro, através do ministério da Fazenda e do Banco Central. Apenas um olhar mais atento basta para ver que o Brasil, não se Segundo os dados do governo, o total de ativos do país em dólares já supera a dívida externa do setor público e privado. Isso significaria que toda a dívida externa poderia ser paga utilizando apenas as aplicações do setor público e privado no exterior.

O total de ativos do país teria superado o valor da dívida externa em U$ 4 bilhões, no final de janeiro. Não por acaso, o anúncio foi realizado em meio à crescente crise financeira e econômica que se espalha no mundo a partir dos EUA. O esforço é apresentar o Brasil como uma ilha de tranqüilidade imune aos efeitos da crise.

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ex-deputado do PSDB e presidente do BankBoston, em nota à imprensa, comemorou o resultado. “Essa melhora significa que estamos superando gradativamente um longo período caracterizado por vulnerabilidade e crises”, afirma. Já o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que o país está mais próximo do grau de investimento (investiment grade), espécie de selo de qualidade concedido pelas agências de classificação de risco aos países bons pagadores de suas dívidas.

O clima ufanista foi comprado pela imprensa. “Agora são os gringos que devem ao Brasil”, estampava a capa do jornal Correio Braziliense. O resultado serviu como justificativa da política neoliberal do governo Lula. Segundo esse discurso, a política fiscal austera permitiu o pagamento da dívida externa. “Sem a adoção de nenhuma das propostas históricas do PT para o problema (moratória, auditoria ou plebiscito), a dívida externa deixou oficialmente de ser um peso na economia brasileira”, iniciava a matéria do jornal O Globo sobre o assunto.

Como as reservas são acumuladas?
A chamada dívida externa é o conjunto da dívida contraída no exterior pelo setor público e as empresas aqui instaladas. No setor privado, é contabilizada como dívida externa tanto a dívida das empresas nacionais quanto aquelas tomadas por filiais das multinacionais.

Já as reservas internacionais são os depósitos do Banco Central em moeda estrangeira, principalmente o dólar. Quando há um investimento estrangeiro no país, o BC toma esses recursos e repassa o equivalente em moeda nacional. Já quando as empresas remetem lucros às suas matrizes no exterior, por exemplo, elas trocam o real pelo dólar guardado no Banco Central. Ou seja, as chamadas reservas internacionais são a garantia de que o governo e as empresas aqui instaladas honrarão seus compromissos no exterior.

E como o governo consegue acumular esses recursos em moeda estrangeira? Além da balança comercial favorável, ou seja, os dólares que entram no país através das exportações, o governo concedeu total isenção de imposto aos investimentos estrangeiros. Os especuladores podem injetar dólares no país sem o menor custo, o que aumentou o investimento externo.

Grande parte das reservas, porém, vem do chamado superávit primário, a economia que o governo faz cortando investimentos e aplicando uma política de arrocho nas contas públicas, tirando recursos de setores como saúde e educação.

Dívida externa x dívida interna
O governo Lula apenas trocou a dívida externa pela interna, a juros maiores. Desta forma, a dívida interna do país está a inacreditáveis R$ 1,2 trilhão, ou 65% do PIB, ou o valor de tudo o que país produz em um ano. O governo paga aos títulos da dívida interna a juros de 12,8% ao ano, maiores que a taxa básica de juros.

O resultado divulgado pelo governo e comemorado pelo conjunto da imprensa, ao invés de demonstrar o acerto da política neoliberal, comprova o aprofundamento dessa política realizada pelo governo Lula, que beneficia apenas os mesmos setores de sempre: banqueiros e investidores estrangeiros. Além disso, desde 2006 o Brasil é formalmente “credor” da dívida externa. O anúncio do governo, além do efeito eleitoral, visa tranqüilizar os especuladores.

Economia dependente
A conjuntura mundial que permitiu a acumulação das reservas está se alterando rapidamente. A crise financeira deve diminuir o montante de investimentos estrangeiros. A demanda por exportações, oriunda principalmente da China, também sentirá os efeitos da recessão norte-americana.

Seguindo sua política econômica pró-imperialista, o governo, através do Banco Central e sua equipe econômica, já anunciou que manterá a meta de superávit e, diante das turbulências internacionais, ameaça aumentar a taxa de juros.

Se existe alguma mudança, principalmente no que se refere às bandeiras da esquerda, é que precisaremos falar de “dívida pública” ao invés de tão somente “dívida externa”. De resto, continua tudo como está, só que pior. A exigência de ruptura com o imperialismo e do não pagamento das dívidas segue atual. O que é economizado para pagar juros deve ser investido no povo brasileiro, o maior credor de todos os governos deste país, incluindo o de Lula.