Nos dias que seguiram ao massacre no Complexo do Alemão, no dia 27 de junho, no Rio de Janeiro, os jornais noticiaram 19 mortos num só dia de confrontos, aulas suspensas nas escolas, postos de saúde fechados, transportes interrompidos. Enfim, uma situação de verdadeiro caos social.

Estas notícias poderiam ser sobre a criminosa ocupação estadunidense no Iraque, ou do massacre cotidiano que o estado de Israel promove na Palestina, ou, ainda, da vergonhosa ocupação brasileira no Haiti, mas são notícias sobre a ocupação da Polícia Militar e da Força Nacional de Segurança nas comunidades cariocas do Complexo do Alemão e da Vila Cruzeiro. Da mesma forma que são falsas as justificativas apresentadas para a ocupação do Iraque, da Palestina e do Haiti, também é falso o argumento que diz que a ocupação das comunidades carentes do Rio é uma medida eficaz para combater o tráfico de drogas e garantir a segurança pública da maioria da população.

Manipulação da opinião pública: a grande imprensa mente
É possível que a maioria da população fluminense caia no “canto de sereia”, disseminado pela totalidade dos grandes meios de comunicação, dizendo que as ocupações militares são uma forma de combater a criminalidade. Porém também é grande o número de trabalhadores que residem nestas comunidades – ou em locais próximos a elas – que sabem que tudo não passa de mais um golpe de marketing dos governos estadual e federal, apoiado pela Prefeitura do Rio. O objetivo é passar uma imagem de combate ao tráfico de drogas e à violência, tentando estabelecer uma falsa sensação de segurança, principalmente durante os jogos Pan-Americanos, que começam no próximo dia 13 de julho nesta cidade.

O tráfico de drogas é um grande negócio capitalista, com braços infiltrados no interior do aparelho do Estado, comprando policiais, juízes e políticos. Basta observar o noticiário atentamente para ver que sempre existem alguns membros do aparelho do Estado envolvidos em esquemas montados pelo tráfico.

Portanto, longe de representar uma medida que aumenta a segurança pública, a ocupação de algumas comunidades carentes representa, mais uma vez, a criminalização dos setores mais empobrecidos da classe trabalhadora. Menos de 1% dos moradores destas comunidades são envolvidos com o tráfico e a criminalidade. É gente que ganha a vida trabalhando dignamente, ganhando salários arrochados e cada vez com menos direitos trabalhistas.

A verdadeira causa da violência: a pobreza
Além da exploração enfrentada diariamente por estes trabalhadores, eles ainda são vítimas de assassinatos protagonizados pelas forças policiais. Afinal, somente 6 dos 19 mortos (dados oficiais) dos conflitos do dia 27 de junho nas comunidades do Complexo do Alemão tinham antecendentes criminais. Se levarmos em conta os dados desde o início da ocupação militar na região (a Vila Cruzeiro está ocupada desde o início de maio), já são mais de 70 mortos, a maioria inocentes, reconhecidamente donas de casa, trabalhadores e estudantes.

Não que seja correto e justificável o assassinato de jovens pobres e negros que, sem alternativa de acesso à educação e a empregos de qualidade, se envolvem com o tráfico de drogas. Os episódios no Rio de Janeiro revelam que a Justiça no Brasil tem um caráter explicitamente de classe: para a juventude negra e pobre, é a morte por balas ditas “perdidas” e para os criminosos de colarinho branco, como o atual presidente do Senado Renan Calheiros, é a mais descarada e criminosa impunidade.

A única medida realmente eficaz de combate à violência é o investimento na geração de empregos e na melhoria dos serviços públicos, como educação e saúde. A ocupação que o Estado deve fazer nas comunidades não é policial e sim social. Todos sabem que o crescimento do tráfico nestas comunidades se explica, em última instância, pela ausência do Estado através de serviços públicos de qualidade, justamente na parcela mais pobre da cidade.

Vejamos novamente o resultado da ocupação absurda que a PM faz há quase dois meses na Vila Cruzeiro. O saldo dos conflitos foi 49 mortos – a maioria sem antecedentes criminais -, escolas e postos de saúde sem funcionar, coleta de lixo e transportes interrompidos e toque de recolher. Não é obvio que esta situação de verdadeiro caos social é um grande combustível para alimentar a violência e o tráfico de drogas no futuro?

Por que, ao invés do “Caveirão” (blindado de guerra usado pela PM do RJ nas comunidades), não são garantidas escolas públicas de qualidade, em horário integral, com profissionais bem remunerados? Por que, ao invés de “balas perdidas”, não são garantidos hospitais e postos de saúde funcionando permanentemente, com materiais adequados e profissionais de saúde?

A explicação é simples, embora cruel. É que governos como os de Lula, Sérgio Cabral e César Maia preferem mascarar a sua irresponsabilidade com os serviços públicos para a população mais pobre, jogando a culpa pela violência na parcela da população mais privada das oportunidades básicas de acesso à educação, saúde e empregos de qualidade.

É bom lembrar que no mesmo dia em que a PM e a Força Nacional de Segurança ocupavam o Complexo do Alemão, a Assembléia Legislativa do RJ aprovava as PPPs (Parceria Público Privada) para as áreas de educação e saúde. Isso revela, mais uma vez, que os políticos burgueses vêem na falência dos serviços públicos uma grande oportunidade de aumentar os lucros da burguesia, que, aliás, é quem financia as campanhas milionárias destes mesmos políticos.

Somente um governo realmente dos trabalhadores pode enfrentar os verdadeiros culpados pela criminalidade crescente nos grandes centros urbanos brasileiros. Os culpados têm nome e sobrenome: são os banqueiros, os latifundiários, os empreiteiros, enfim os que lucram cada vez mais, deixando a miséria para a maioria dos trabalhadores. É para essa burguesia que governam Lula, Cabral e César Maia, verdadeiros “amigos dos ricos e inimigos do povo pobre”.

Somente acabando com a sangria de recursos públicos destinados todos os anos ao pagamento dos juros das dívidas externa e interna e sobretaxando pesadamente os lucros astronômicos dos grandes empresários é que obteremos os recursos públicos necessários para garantir saúde, educação, saneamento e empregos de qualidade para todos e, assim, combater verdadeiramente as causas da violência.

Descriminalização das drogas: um debate que precisa entrar na agenda política
A grande imprensa, ao invés de apoiar, acriticamente as investidas policiais em comunidades carentes, deveria dar espaço a um debate que segue sendo represado em nossa sociedade. O tráfico de drogas é um grande negócio capitalista cada vez mais institucionalizado. É tolice pensar que as drogas e as armas que são encontradas nos morros cariocas chegam aqui sem o apoio e a cobertura do aparelho do Estado. O Estado não combate a fundo o tráfico de drogas porque é um negócio lucrativo que enriquece a cada ano juízes, policiais e políticos.

A legalização e a descriminalização das drogas, com o assistência médica gratuita aos dependentes na saúde pública, seria uma forma mais eficaz de combate ao tráfico do que as medidas “marqueteiras” aplicadas pelos sucessivos governos. Não se trata de fazer apologia ao consumo das drogas, mas sim tratá-lo como um caso de saúde pública e não de polícia, lembrando que em alguns países o uso das drogas não é considerado crime, com as drogas sendo distribuídas em doses reguladas pelo Estado.

Tratar o consumo de drogas como crime é continuar dando combustível a um grande negócio internacional que lucra milhões de dólares. A descriminalização das drogas, somada a uma política de geração de empregos e de garantia de serviços públicos de qualidade para a parcela mais pobre da população, seria uma medida que realmente atacaria o tráfico de drogas e d