Em discursos após a sua reeleição, Hugo Chávez afirmou que a Venezuela iniciava “a fase de construção do socialismo”, lançou a proposta de construir o PSUV (Partido Socialista Único da Venezuela), anunciou a nacionalização da CANTV, de empresas de energia, um canal de televisão e a transformação em “empresas mistas” das concessões outorgadas as multinacionais na Faixa Petroleira do Orinoco. Tais anúncios tiveram grande impacto na América Latina. O Correio Internacional dedica esta edição a uma análise da realidade venezuelana e apresenta a posição da LIT-QI frente aos fatos

As nacionalizações
Seguramente, o maior impacto foi causado pelo anúncio das nacionalizações (a primeira delas acaba de se concretizar com a compra da empresa elétrica EDC) que foi recebida com entusiasmo pelo povo venezuelano e as massas latino-americanas. O que é lógico, depois de muitos anos de privatizações, governos como o de Chávez ou de Evo Morales parecem começar a marchar na direção contrária.

Mesmo com o caráter profundamente limitado e parcial imposto por ambos os governos, essas nacionalizações contêm um elemento progressivo: recuperam para o Estado parte do patrimônio nacional que estava nas mãos das empresas imperialistas que saqueavam o país. Nesse sentido, podemos dizer que são um triunfo, embora parcial, da luta de muitos anos dos povos desses países.

O caso da CANTV
Essa empresa telefônica era uma estatal até 1991, quando foi privatizada e comprada pelo consórcio Venworld Telecom, dominado pela empresa norte-americana Verizon Comumications Inc. Ao adquirir a CANTV, o grupo multinacional reduziu drasticamente o quadro de funcionários: aposentou 8 mil trabalhadores e se comprometeu a pagar as aposentadorias de acordo com as leis venezuelanas (não menos de um salário mínimo). Como não cumpriu o acordo e pagou muito menos do que deveria, os aposentados iniciaram ações judiciais e uma série de mobilizações.

Por outro lado, além dos negócios telefônicos, a compra das ações da CANTV na Venezuela, pagas em bolívares, e sua venda na bolsa de Nova York se converteram em uma forma “legal” de retirar divisas do país. Como se isso não bastasse, os proprietários da CANTV apoiaram o golpe de abril de 2002 e o lockout patronal ocorrido no ano seguinte.

Uma ação Muito limitada
Pelas razões expostas acima, as nacionalizações da CANTV e das empresas de eletricidade são mais do que justificadas. Entretanto, acreditamos que é necessário analisar o caráter profundamente limitado e parcial dessas medidas.

Em primeiro lugar, não é uma “nacionalização sem indenização”, mas sim uma compra, de acordo com as normas aceitas pelo direito burguês e os critérios capitalistas.

No caso da CANTV, a Verizón colocou suas acões à venda como parte de um plano de reestruturação continental. Mas o que irritou o governo dos EUA foi o preço que deveria ser pago pela companhia, já que Chávez declarou que descontaria a dívida com os aposentados porque o Estado venezuelano tinha assumido seus encargos.

Já na compra da companhia elétrica EDC foram pagos US$ 730 milhões. Os jornais dizem que “a operação não causou maiores controvérsias com a firma norte-americana. O representante da empresa e firmante do acordo, Paul Narran, afirmou que ‘acredita fortemente na Venezuela e na EDC como empresa’” (Clarín, 10/2/07).

Em segundo lugar, as nacionalizações não se estendem a outros setores chaves da economia, onde as empresas imperialistas têm muito peso, como a produção petroleira (ver box) ou a indústria automobilística, dominada pela GM, Ford, Mitsubishi e Toyota (com grandes benefícios por parte do Estado venezuelano).

Por outro lado, o governo não fala de nenhum tipo de controle por parte dos trabalhadores sobre as empresas nacionalizadas. Por isso, é muito provável que nelas se repita um tipo de negócio que vários quadros do chavismo fazem hoje na PDVSA e em outras áreas do Estado (negócios que começaram a formar a chamada “burguesia bolivariana”) .

Avançar na mobilização
A conclusão é que estas nacionalizações, embora contenham elementos progressivos, não são parte de uma verdadeira política antiimperialista do governo de Chávez, muito menos um passo em “direção ao socialismo”.

Para avançar nesse caminho seria necessário que as empresas fossem expropriadas sem indenização e não compradas (seus proprietários já saquearam o país muito mais do que investiram). Ao mesmo tempo, se realmente apontassem para recuperar a soberania econômica, essas medidas deveriam se estender aos outros setores da economia, especialmente a área petroleira. Finalmente, para que essas nacionalizações realmente beneficiem os trabalhadores e as massas, devem ser postas sob o controle democrático dos trabalhadores e suas organizações, como os sindicatos de cada setor e a UNT (União Nacional de Trabalhadores).

Não acreditamos que Chávez avance nessas medidas. Ao contrário. Opinamos que ele se opõe a elas. Entretanto, o povo venezuelano confia em Chávez. Por isso, chamamos aos trabalhadores e as massas venezuelanas a se organizarem e se mobilizarem para exigir que Chávez aplique esta política. Se Chávez não levar adiante essas medidas, as mobilizações permitiriam que os próprios trabalhadores tomem em suas mãos essa política.

Post author César Neto e Nacho Silva, de Caracas
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