Colonos recebem até US$ 300 mil para deixar suas casas

Enquanto oito mil colonos são retirados, muro da vergonha segue sendo erguidoA retirada dos oito mil colonos da Faixa de Gaza, que teve início no dia 15 deste mês, deve terminar até a próxima semana, pelos planos do exército israelense. As cenas de desocupação – com judeus entricheirados atrás de sinagogas e roubando armas do exército – nem de longe se comparam à prática de castigos coletivos, nas quais bulldozers são utilizados para demolir casas ocupadas por palestinos. A violência dos extremistas israelenses vinha sendo anunciada há muito tempo, e, salvo exceções, não pegou de surpresa as forças armadas de Israel. Dos 498 manifestantes anti-retirada presos até o dia 17, ao menos 451 já haviam sido soltos.

O show que Ariel Sharon, primeiro-ministro de Israel, preparou para a retirada dos colonos e a recente renúncia do ultradireitista Benjamin Netanyahu alimentaram a falsa idéia de que o governo de Israel teria abandonado a linha dura contra os palestinos. Mas, na verdade, o que Sharon está fazendo é cumprir o plano acertado com Bush e Mahamoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina, patrocinado pela ONU, que consolida a ocupação israelense sobre o território palestino.

Entre as medidas do plano, estava a devolução da Faixa de Gaza, para dar ao mundo a idéia de que um acordo entre invasores e invadidos é possível. No entanto, a operação mostra justamente o contrário, que é impossível a existência de dois Estados, Israel e Palestina, no mesmo território que pertence aos palestinos e foi ocupado pelos judeus. A operação retirada está polarizando a sociedade israelense, cuja ampla maioria vem se mobilizando contra a retirada dos colonos judeus. A situação é tão crítica que nem mesmo essa migalha – a promessa de retirar os 8 mil judeus de Gaza – vem sendo aceita pela poderosa direita israelense e os judeus ortodoxos sionistas. Acham que é concessão demais aos palestinos e, por isso, chamam Sharon de traidor e gritam “agora Gaza, amanhã Jerusalém”.

Crise no exército
A política de Sharon até agora foi comprar a adesão dos colonos para que abandonem suas casas em Gaza. Esses colonos sempre foram sua base de apoio, beneficiados com polpudos subsídios financeiros. São fanáticos antiárabes que querem expulsar os palestinos de toda a antiga Palestina e tomar suas terras, como já fizeram seus antecessores no território que pertencia à Palestina histórica, hoje ocupado por Israel. Mas, para garantir seu plano de expandir as colônias na Cisjordânia e rodear toda Jerusalém de assentamentos judaicos, Sharon precisou “sacrificar” alguns daqueles que o respaldaram.

Seu plano está batendo de frente com a resistência desses colonos, que se recusam a sair, alegando “direitos bíblicos” sobre a terra. Na semana passada, um extremista judeu entrou atirando num ônibus lotado de palestinos e deixou três mortos. Foi linchado pela multidão. A crise atingiu as fileiras do exército. O jornal Haaretz informa que há um crescente número de soldados israelenses que estão desertando por se recusarem a atirar contra os colonos judeus. O governo teme inclusive a formação de uma milícia independente, com desertores armados, que saiam matando palestinos.

A situação ainda está incerta, mas o que já está ficando claro é que se abriu uma crise no exército, o que pode ser crucial para Israel, um Estado militarista ocupante que tem, como nenhum outro, as forças armadas como pilar central para sua manutenção.

Reduzir os custos da ocupação
O que um assassino confesso como Sharon estaria pretendendo com a retirada dos judeus de Gaza? Curvar-se diante da resistência palestina? Devolver os territórios ocupados e assim abandonar o projeto da Grande Israel que sempre defendeu? Isso está bem longe dele. Com a devolução de Gaza, Sharon quer livrar-se de um problema militar grave: a proteção dos 8 mil colonos judeus, que vivem cercados por 1,3 milhão de palestinos, o que exige a presença permanente de tropas expostas a riscos em um território que não é central para o projeto de expansão sionista. Ele quer garantir a concentração dos recursos militares na ocupação da Cisjordânia e reduzir as perdas constantes que significa manter Gaza desde a segunda Intifada. Está jogando todo o peso na construção do muro, com o qual pretende emparedar os palestinos nos seus territórios que, em vez de estarem sendo devolvidos aos palestinos, estão, na verdade, sendo transformados em campos de concentração. “A retirada é uma farsa, mas o muro é real”, diz o jornalista Israel Shamir, em artigo publicado em Rebelión. “As IDF (exército israelense) vão construir outra cerca de segurança em torno da Faixa de Gaza. Ao final, o sistema incluirá três cercas, com sensores eletrônicos e ópticos de última geração, assim como metralhadoras com controle remoto. O sistema deve estar pronto em um ano, com um custo total de US$ 220 milhões pagos, claro, pelo contribuinte dos EUA”.

Só a luta pode retomar os territórios
Sharon já mandou o exército cercar a área para evitar qualquer levante palestino e Mahmoud Abbas exortou os palestinos a manterem a calma e aceitarem passivamente seu confinamento. Como lembra Israel Shamir, “a retirada é apenas parte do jogo; sempre é seguida por uma invasão, como em uma violação. Gaza continuará sendo uma prisão, sem ao menos um vínculo aéreo ou marítimo com a liberdade. Gaza não pode subsistir sozinha. Os gazanos terão apenas uma pequena oportunidade de sobreviver lavrando os campos que antes pertenciam a suas famílias, porque os fazendeiros israelenses preferem os tailandeses, mais baratos e pouco exigentes. Gaza se converterá no lugar de exílio preferido dos ativistas palestinos da Cisjordânia e Jerusalém, uma grande prisão, um lugar de sepultamento”.

Isso é o que Sharon reserva aos palestinos sob sua tutela: aceitar a perda de todos os direitos e viver como escravos em sua própria terra, num regime de apartheid. A única saída para a Palestina é a continuidade da resistência e da luta pela devolução imediata de todo o território palestino. A bandeira dos dois Estados, assumida pela liderança da ANP com Abbas à frente, dá a justificativa para consolidar a ocupação do território palestino por Israel e submeter os palestinos à repressão permanente do Estado gendarme sionista. Só a velha bandeira da OLP da Palestina laica, democrática e não racista em todos os territórios palestinos usurpados desde 1948, uma Palestina aberta aos judeus que aceitem a convivência com os árabes em um único país, e, portanto, o fim do Estado racista de Israel poderá garantir uma vida digna aos palestinos.

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