Durante todo o ano de 2008, escutamos de analistas financeiros e governantes que a recessão atingiria somente os países adiantados e que os países ditos “emergentes” garantiriam um crescimento sustentado, suavizando o impacto da crise mundial

A “teoria” do descolamento dos países emergentes naufragou. Hoje, esta idéia foi abandonada por todos. Prevalece agora uma visão que estes países serão atingidos pela crise, mas não entrarão em recessão. Esta visão em pouco tempo será também abandonada. No próximo período, os países coloniais e semi-coloniais serão arrastados pela crise e sua queda aprofundará a recessão mundial.

As saídas monetárias e keynesianas não resolverão a crise
A visão predominante hoje é a de que esta crise tem uma origem financeira, na esfera dos bancos e da moeda. Segundo esta visão, houve exagero e falta de fiscalização, abrindo as portas para a especulação financeira que gerou papel podre. Os bancos ficaram “com o mico” e pararam de emprestar dinheiro para as pessoas e as empresas. Estas não compram e as mercadorias encalham nas lojas. Com isso explode a crise de superprodução.

Até agora, os governos de todo o mundo injetaram 6,8 trilhões de dólares e não resolveram nada. Este dinheiro público está servindo para que cada Estado imperialista salve “suas” corporações transnacionais da falência.

Isto não resolve porque se perdeu a confiança e diminuiu o investimento patronal. Esta crise se origina na produção, no setor industrial, que deixou de investir na produção pela diminuição dos seus rendimentos. Para retomar o novo ciclo, deverá haver uma desvalorização do capital (baixar o preço geral das fábricas, salários, mercadorias) até gerar um novo patamar de crescimento dos lucros. Como existe uma montanha de capital fictício, levará muito tempo até que a crise queime esta montanha de papel falso.

Neoliberalismo acelerou globalização, inaugurando uma nova divisão internacional
do trabalho O neoliberalismo representou um salto na superexploração do planeta pelo imperialismo. O mundo foi reordenado para servir aos interesses das grandes empresas transnacionais. Deslocou-se parte importante da fabricação de produtos (principalmente a indústria pesada e poluidora) para a China e outros países semi-coloniais. Manteve-se o controle da alta tecnologia no país imperialista. Com isso, a China se converteu na “fábrica do mundo”. O Brasil, junto com a América do Sul, foi designado como fornecedor de matérias primas e alimentos para o desenvolvimento mundial. Outros países, como Rússia, fornecem petróleo e gás.

Restauração capitalista na URSS, no Leste Europeu e na China, recolonização dos países atrasados, desnacionalização, privatização e flexibilização dos direitos dos trabalhadores. Todos estes elementos deram fôlego ao capitalismo nos últimos 15 anos.

A grande migração de investimento estrangeiro nos países coloniais e semi-coloniais, especialmente na China, Brasil, Rússia, Índia, se deu como parte desta estratégia de domínio do mercado mundial. A inserção destes países no mercado mundial foi totalmente subordinada aos interesses imperialistas.

Obama e o novo New Deal não impedirão recessão mundial
Paul Krugman, prêmio Nobel de economia, está aconselhando Obama a ir a um novo New Deal, um programa de gastos públicos para estimular a produção e o emprego. Esse plano foi realizado por Roosevelt, em 1933, para aplacar a Grande Depressão de 1929. Tal plano só poderia vingar dentro de alguns anos. Só é possível sair desta grave crise recessiva com a queima de preços das empresas e das mercadorias, até ser interessante de novo para os capitalistas impulsionarem um novo ciclo. O novo New Deal, caso Obama opte por tal plano, só terá resultado econômico dentro de alguns anos de recessão e mesmo assim será limitado.

Estados Unidos já iniciaram transferência da crise para Europa e países atrasados
Os EUA, como principal economia do mundo, têm regalias que ajudam a enfrentar a crise. Por exemplo, detêm o controle da moeda mundial, o dólar, que lhes dá a possibilidade de transferir parte do prejuízo para o mundo. Todo o capital está voltando para os EUA. Ao importar o grosso do capital mundial, exportará a crise para todo o planeta, principalmente para os países atrasados, cujo crescimento espetacular nos últimos seis anos se deve ao investimento estrangeiro. A fuga de capitais destes países e a desvalorização das suas moedas, das suas empresas, das matérias-primas, das suas mercadorias é a forma com que os EUA exportam sua crise para todo o mundo, gerando inflação e déficit. Boa parte do prejuízo que tiveram com a bolha especulativa imobiliária foi exportado para os bancos europeus. Para cada 10% de aumento do dólar, aumenta 1% inflação no Brasil.

A China está entrando em crise
A China retrocedeu ao capitalismo e ainda por cima, foi recolonizada. Transformou-se em “fábrica do mundo” por determinação do imperialismo: 12 mil empresas americanas, seis mil européias e três mil japonesas se apoderaram da China, rebaixaram o salário mundial e desta forma, são as responsáveis pelo “grande salto” chinês. Para se ter uma idéia, 10% das exportações chinesas são da Wall Mart.
Existe uma superacumulação de capital que vai explodir agora na China, em uma grave crise de superprodução. Mais de 68 mil empresas de todo o país entraram em colapso no primeiro semestre de 2008 e cerca de 2,5 milhões de trabalhadores perderam o emprego. A produção de aço na China caiu, devido a redução nas vendas de imóveis (queda de 53%) e na fabricação de carros (queda de 15%). Milhares de trabalhadores protestam todos os dias na China contra a demissão em massa que já começou a ocorrer, como produto da crise. São greves e manifestações radicalizadas, que anunciam a possibilidade de entrada em cena do proletariado chinês, que hoje é o maior do mundo.

O Brasil se converteu em uma plataforma de exportações das transnacionais
Os primeiros sintomas da crise estão comprovando uma tese: em geral, estamos exportando produtos primários (baratos) e importando produtos de alta tecnologia (caros), igual à velha economia colonial. No último mês, o Brasil foi o país que mais aumentou as importações, enquanto começou a queda das exportações. Até agora, esta relação econômica colonial estava encoberta pelos altos preços dos produtos primários (minérios e alimentos) no mercado mundial. Isto embalou o crescimento do Brasil nos últimos seis anos. Agora, a queda abrupta destes preços vai desnudar a perda da soberania do Brasil no terreno econômico.

Porque a crise mundial terá um forte impacto no Brasil?
As empresas que mais cresceram no Brasil foram as produtoras de matérias-primas (Petrobras, Vale, Aracruz Celulose, Votorantim, etc.), de alimentos, do agronegócio exportador, que é totalmente controlado por grandes empresas transnacionais, e as empresas industriais produtoras de semi-acabados (siderúrgicas, celulose etc), também controladas por multinacionais.

As duas empresas que mais cresceram e que eram o símbolo da produção nacional, agora já têm maioria de capital internacional. Tanto a Petrobras quanto a Vale tem cerca de 60% do seu capital controlado por grandes acionistas estrangeiros. Veja o que fala o próprio Lula sobre isso: “Se vocês não sabem, 62% dos dividendos de todo o investimento, de toda a renda da Petrobras são pagos na bolsa de Nova York”.

A fuga de capitais é a expressão da crise mundial no país
Nossa dependência total dos capitais internacionais (produtivos ou especulativos) se evidenciou agora, no meio da crise. As transnacionais entraram em crise nas suas matrizes e agora estão retornando com todo o capital de volta para seu país de origem. Vão salvar a matriz em detrimento das filiais.

Ao mesmo tempo, o capital especulativo, que ajudou na valorização superficial da Bolsa de Valores e na valorização de todas as empresas brasileiras (agronegócio, Petrobras, Vale etc) agora está retornado aos EUA, buscando um porto seguro. Os investidores estrangeiros já retiraram R$ 23 bilhões neste ano. O processo é tão veloz que está saindo do Brasil 22 milhões de dólares por hora! E estamos no começo desta retirada. Ainda existem 900 bilhões de dólares de investimentos dos EUA no estrangeiro e até agora só voltou pra lá 60 bilhões de dólares. Este movimento se acelerou com a crise, mas já vem de antes (Veja gráfico ao lado).

Post author Nazareno Godeiro, de Belo Horizonte (MG)
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