O primeiro momento da crise foi no final de 2008, começo de 2009, com a queda livre da produção industrial e índices que se aproximaram da depressão de 1929. O segundo momento foi marcado pela intervenção dos governos, que injetaram 24 trilhões de dólares para salvar os grandes bancos e empresas.

Essa ação, inédita na história, conseguiu frear a evolução da crise, possibilitando a recuperação parcial iniciada no segundo trimestre de 2009. Mas levou à criação de uma nova e ainda mais gigantesca bolha financeira, que envolve os governos imperialistas em uma montanha de déficits públicos. É essa nova bolha que agora cobra seu preço. Os déficits da Grécia, Espanha e Portugal detonaram esse terceiro momento da crise.

Os governos imperialistas começaram uma nova ofensiva sobre os trabalhadores, com planos brutais de austeridade aplicados sob a batuta do FMI, bem conhecidos em toda a América Latina. Esses planos vão acelerar uma recessão, pondo fim à recuperação europeia. E o resultado do enfrentamento de classes (já com greves gerais na Grécia, Itália e País Basco, na Espanha) pode aprofundar ainda mais a crise. O mundo pode estar à beira de um “duplo mergulho”, uma volta ampliada da crise de 2008.

Isso inevitavelmente vai afetar o Brasil. Os reflexos imediatos já existem, mas não vai ocorrer uma crise generalizada antes das eleições. O problema deve cair no colo do governo eleito em outubro, seja Dilma Rousseff ou José Serra. E pode ser muito pior do que o que se passou em 2008.

Um país completamente dominado pelas multinacionais
O PIB cresceu no primeiro trimestre 9,6%, e se anuncia um aumento de 6% no ano. O país é uma plataforma de exportação de produtos agropecuários (como carne, soja, café e sucos cítricos) e minerais (ferro para a China, em particular) para todo o mundo, e de automóveis e eletrodomésticos para a América Latina.

Essas exportações, além do mercado interno brasileiro, justificam a importância dada pelas multinacionais ao Brasil. Na crise de 2008-2009, essas grandes empresas decidiram manter os investimentos aqui, ao caracterizar a retomada do crescimento mundial. Isso pode não ocorrer em uma nova crise.

As multinacionais participam de 67% das empresas no Brasil e controlam diretamente 49% delas. Têm o domínio absoluto (89%) do principal setor industrial (o automobilístico, incluindo autopeças), 84% do setor eletrônico (geladeiras, fogões, máquinas de lavar, etc.), maioria clara em telecomunicações e indústria farmacêutica (65%), indústria digital (62%), alimentos e bebidas (59%) e 50% da petroquímica.

Elas avançaram fortemente em setores antes dominados por empresas nacionais (agronegócio, construção civil e supermercados). E se aproveitaram das privatizações para se apropriar das antigas estatais, tendo 65% da Vale e 70% da Embraer. A Petrobras está em avançado estágio de privatização, tendo metade de suas ações em mãos de grupos estrangeiros.

São as multinacionais, portanto, que decidem para onde vai o país. O Brasil está completamente exposto às tempestades do mercado mundial, ao contrário do que afirma o governo.

Crise pode atingir um país mais endividado…
Lula convenceu os trabalhadores de que o país teria se livrado da dívida externa. Trata-se de uma grande mentira, pois a dívida segue existindo (hoje de 282 bilhões de dólares) e aumentando. O que o governo fez foi aumentar muito as reservas do país, para se aproximar do montante da dívida externa e assim poder divulgar “que a dívida acabou”.

Na verdade, trata-se de uma manobra contra o país. Os bancos estão trocando a dívida externa pela interna, investindo no Brasil para se aproveitar das maiores taxas de juros do mundo. O governo tem de trocar esses dólares por reais para garantir essa aplicação, e isso é o que eleva as reservas.

As consequências são severas. Em primeiro lugar, a dívida interna explodiu, passando nos dois governos Lula de R$ 654,3 bilhões para mais de R$ 2 trilhões em 2010. Antes o país tinha um problema com a dívida externa, agora tem outro ainda maior com a interna.

O governo entregou aos banqueiros R$ 380 bilhões em 2009, 35,6% de todo o orçamento nacional. Ou seja, de tudo que o país arrecada em impostos, mais de um terço é dado aos banqueiros. Em comparação, a educação no ano passado recebeu 2,88% do orçamento e a saúde, 4,64%.

Entre 2003 e 2009, Lula pagou aos bancos R$ 1,9 trilhão. Contando com os R$ 278 bilhões já definidos no orçamento de 2010 para esse mesmo fim, deve terminar o governo tendo pago R$ 2,2 trilhões. Ou seja, só durante o governo do PT, o país já pagou de juros o mesmo montante do conjunto da dívida (R$ 2 trilhões). Mas a dívida segue aumentando.

…e com déficit nas contas externas
Entre 2003 e 2007, o crescimento econômico internacional possibilitou superávits comerciais importantes. As contas correntes externas (tudo o que país gasta e recebe do exterior em exportações, importações, serviços, remessa de lucros) eram positivas, entrando mais dinheiro do que saindo. Foi isso que permitiu o aumento das reservas. A partir de 2008, com o início da crise, a situação mudou, com queda nas exportações e aumento nas remessas de lucros das multinacionais. Pela primeira vez desde 2002, o balanço das contas correntes foi negativo, chegando a um déficit de 28,3 bilhões de dólares. Em 2009, a situação continuou, com déficit de 24,3 bilhões. A previsão para 2010 é de déficit recorde, que pode chegar a 50 ou 60 bilhões de dólares.

Isso só poderia ser resolvido com novos investimentos estrangeiros, o que vinha ocorrendo durante o período de crescimento econômico, chegando a 45 bilhões de dólares em 2008. Mas caiu muito em 2009 (26 bilhões) e deve diminuir ainda mais em 2010 (23 bilhões). Com um déficit em contas correntes crescendo, sem possibilidade de compensação com investimentos externos, as reservas brasileiras vão cair. Voltou ao horizonte a possibilidade de crises cambiais semelhantes às do governo FHC.

Isso significa que, caso venha uma nova crise, o país vai entrar nela em situação muito pior do que na crise passada, com um endividamento maior (interno e externo) e um déficit recorde em contas correntes.

Ataques aos trabalhadores podem estar a caminho. Nem Dilma nem Serra vão falar sobre isto na campanha eleitoral. Mas é importante que os ativistas conheçam essa realidade.
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