Compra dos votos de deputados da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) não é caso isolado. Parlamentares cobram caro para não investigar`PlenárioNa semana passada, a revista Veja publicou uma matéria acrescentando novos personagens ao escândalo Waldomiro Diniz, ex-assessor do ministro José Dirceu que cobrava propinas para beneficiar bicheiros. Nas gravações obtidas pela revista, membros da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro), que investiga esquemas fraudulentos no período em que Waldomiro presidia a Loterj, negociam quanto custaria para interferir nos rumos da investigação. O deputado federal André Luiz (PMDB-RJ) aparece cobrando propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira para “convencer” os deputados da CPI a minimizarem as acusações contra o bicheiro no relatório final e impedir que os deputados da Alerj questionassem o relatório na votação do plenário.

R$ 100 mil por cabeça

Em uma das gravações, André Luiz cobra do advogado do bicheiro US$ 1 milhão para evitar que seu cliente seja indiciado no relatório final. Durante a negociata, surge repentinamente na sala onde estavam, nada menos do que o presidente da CPI, o deputado estadual Alessandro Calazans (PV).

Em outra gravação, o deputado aumenta o valor da propina, pedindo R$ 4 milhões para livrar a cara do bicheiro. Como o relatório seria examinado no plenário, o deputado argumentou que agora seria preciso comprar o voto de 40 dos 70 deputados estaduais: “São 40 deputados a 100 (mil) cada um. Dá 4 milhões”. André Luiz, que aumentou seu patrimônio em 735% nos anos em que foi deputado estadual, afirma ter conexões com o presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB) e com inúmeros outros deputados. Questionado sobre como funcionaria o “mercadão” da compra de votos, André Luiz declarou: “Vou sentar no gabinete da minha esposa (deputada estadual) e ficar manipulando as coisas, chamando fulano, sicrano”.

Gravações comprometem governo do PT

André Luiz revela que participavam do esquema, inclusive, membros do governo federal. Por exemplo, Rogério Buratti, ex-assessor de Palocci acusado de pedir propina a uma multinacional para intermediar contratos com a Caixa Econômica Federal, não apareceu ao depoimento ao qual foi convocado, e nenhum dos deputados da Alerj reclamou da sua ausência. O deputado explica ainda como o antigo colega de Waldomiro, o petista Marcelo Sereno, não foi convocado para depor: “Picciani sabe que Marcelo Sereno era caixa do PT no Rio e, se aproveitando disso, negociou cargos para que ele não fosse convocado”. O deputado picareta completa dizendo como foi feito o pagamento para que a CPI não convocasse Marcelo Sereno: “Houve duas nomeações negociadas diretamente com a Casa Civil. Uma para um fundo de pensão e outra numa estatal”.

Alerj: um antro de picaretas

Na Alerj funciona uma verdadeira indústria de cobrança de propinas de CPIs. O deputado federal André Luiz é apenas um dos picaretas, que levou a pior ao ser pego. Por trás deste bode expiatório, há um enorme esquema sujo e corrupto. Entre 1999 e 2001 foram realizadas 26 CPIs na Alerj, sendo que André Luiz fez parte de sete delas. Dessas 26 CPIs, apenas quatro foram encaminhadas para o Ministério Público, as demais foram arquivadas.

SAIBA MAIS

Relembre o caso Waldomiro e a CPI da Loterj

A revista Época, em fevereiro deste ano, denunciou as ligações do assessor do ministro José Dirceu, Waldomiro Diniz, com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, de quem teria cobrado propina para campanhas eleitorais do PT e de Rosinha Garotinho. A revista teve acesso ao conteúdo de uma fita de vídeo gravada em 2002 pelo próprio bicheiro.

Na época, Waldomiro era presidente da Loterj, cargo que obteve no governo Garotinho, então no PSB, e no qual foi mantido na gestão de Benedita da Silva (PT).
Waldomiro pediu uma comissão de 1% do valor dos contratos. Em troca, o então presidente da Loterj garantiu ao bicheiro o monopólio da exploração das máquinas de apostas online, chegando a oferecer a Cachoeira a possibilidade de reescrever o edital de licitação conforme sua conveniência.

CPIS SÃO FONTE DE CORRUPÇÃO

O caso da Alerj apenas expõe a ponta do iceberg do funcionamento das CPIs no Brasil. Em alguns momentos é correto exigir CPIs para investigar tal ou qual caso, mas é preciso identificar os limites dessa instituição. Criadas para apurar e investigar denúncias sobre fraudes e corrupção, as comissões acabam se transformando em usinas de chantagem e fonte da própria corrupção. Há denúncias de vários esquemas de cobranças de propinas e chantagens funcionando no Congresso Nacional.

O caso mais emblemático é a atual CPI do Banestado, que investiga as maracutaias do sistema financeiro. Nela, tanto os deputados governistas, como os da oposição burguesa, escondem informações para preservar empresários corruptos que financiam suas campanhas eleitorais. São por demais conhecidas as manobras do governo para impedir que o “caminhão de denúncias”, nas palavras do seu relator, José Mentor (PT-SP), atinja os figurões da República.

É preciso apurar as denúncias que atingem as podres instituições do Estado. Somente uma comissão formada por sindicatos, movimentos populares e entidades (OAB, ABI etc.) pode levar essas investigações com transparência. Todos os culpados devem ser punidos com prisão e confisco dos bens.

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