Quem não ficou com medo do fantasma de 1994 após o anúncio da lista de convocados para a Copa? O primeiro ponto de ligação com aquela Copa foi a clara demonstração de que Dunga, assim como Carlos Aberto Parreira, é testa curta, avesso a ousadias. O técnico ignorou solenemente os apelos da torcida brasileira por Ganso e Neymar.

Durante toda a entrevista coletiva concedida para justificar a escalação, o técnico tentou explicar a “coerência” da não-convocação dos meninos de ouro da Vila Belmiro. Disse que eram muito novos e que “não houve tempo para testes”. Contudo, não seria mais “coerente” convocar os dois maiores craques em atuação no país, e levar para Copa a fabulosa (e rara) sintonia do ataque do Santos?

Pode-se sintetizar o futebol como uma combinação da genialidade do boleiro, seu domínio dos fundamentos, com a mais perfeita sintonia dentro da equipe. Isso é precioso, mas só funciona quando treinadores têm a sensibilidade necessária e bom senso de oportunidade, o que é exatamente a antítese da teimosia.

Por outro lado, a escalação de Kleberson (reserva do Flamengo) e Grafite (que atuou em apenas um jogo da seleção e não mostrou muita coisa) contradizem toda a coerência lógica de Dunga. Ao contrário do que diz o treinador, não foram convocados apenas aqueles que “ralaram”.

Como disse um jornalista na entrevista coletiva criticando a falta de ousadia do técnico, Pelé não seria convocado em 1958 se Dunga estivesse no lugar de Vicente Feola.

O segundo elo com a seleção de Parreira de 1994 é a ameaça de a seleção não ter um meio de campo digno. Naquela época, a falta de rendimento de Raí deixou a seleção acéfala, sem um meia-armador. Ficamos com o futebol burocrático de Zinho, Mauro Silva, Dunga e Mazinho…(que, diga-se de passagem, são superiores à maioria dos meias convocados por Dunga).

Dessa vez, o perigo de Kaká se machucar ou não render o futebol esperado pode levar a uma situação semelhante. “Mas ganhamos mesmo assim”, diz Dunga. Infelizmente a situação hoje é pior do que em 94. Dessa vez, não temos a genialidade dos pés de Romário e Bebeto, na época veteranos que carregaram literalmente aquela seleção nas costas.

Quem está à altura da posição de Kaká, caso seja necessário substituí-lo? Julio Batista, reserva do Roma? Ou a opção será um improviso de laterais com volantes, descartando definitivamente um meia-armador de verdade? Talvez Dunga e Jorginho queiram mostrar ao país que seria possível vencer aquela Copa apenas com a mediocridade de seu meio de campo.

Dunga está certo em cobrar raça e compromisso dos jogadores da seleção. Mas só isso não afasta o fiasco de 2006. Esperamos que a seleção apresente na Copa um futebol livre das limitações de uma estratégia burocrática, mecânica, defensiva, tão a gosto das escolas europeias.