Na tarde do dia 17 de abril de 1996, em um trecho da rodovia PA-150 conhecido como curva do S, 19 sem-terra foram mortos e outros 60 saíram feridos em um dos massacres mais impressionantes do Brasil “democrático”.

O grupo que marchava havia feito uma ocupação da fazenda Macaxeira e exigia sua desapropriação para reforma agrária.

Era o tempo das grandes ocupações de terra, do MST com um apoio popular imenso, da reforma agrária pautada em todas as discussões políticas. De uma tremenda polarização no campo, onde sem-terra e trabalhadores de um lado, e latifundiários e burguesia do outro, lutavam para disputar que forma de propriedade e desenvolvimento agrário deveria predominar.

O efeito do massacre na população foi espantoso. Em todo o país houve atos. Em Belém do Pará, estado onde aconteceu o massacre, no dia do protesto, a Polícia Militar foi retirada das ruas para evitar que a população se enfrentasse com ela. E, raridade na história recente do país, a manifestação atacou um quartel sem sofrer nenhuma retaliação.

Nos meses que se seguiram ao massacre, o prestígio do MST cresceu como nunca. Uma marcha convocada por eles levaria ao que seria a Marcha dos 100 mil.
Quinze anos depois, nenhum dos envolvidos no massacre está preso, a reforma agrária continua por fazer e o agronegócio avançou justamente no governo do partido que supostamente era o maior aliado do MST, o PT.

O governo Lula, como nenhum outro, apoio, financiou e defendeu o avanço do capitalismo no campo. Uma contrarreforma agrária, de caráter mercantil e reacionário, foi executada. Uma campanha midiática foi feita para satanizar o MST e toda a luta pela terra. O próprio MST mudou, ao acreditar que o governo Lula era seu governo, ocupou postos na estrutura federal e freou a luta direta pela terra.

É verdade que nenhuma homenagem trará de volta os mortos, nem suprirá a ausência dos que tombaram naquele dia para seus companheiros, amigos e parentes. Os órfãos continuarão órfãos, as viúvas continuarão viúvas. Mas é necessário não deixar cair no esquecimento estes 19 mortos (1). Mais do que artigos e protestos, nós queremos homenageá-los com lutas. Manter viva não apenas na memória, mas nos nossos atos cotidianos, a bandeira que eles defendiam, e reivindicar como mais atual que nunca a luta por uma reforma agrária ampla, radical e sob controle dos trabalhadores.

Nós mantemos viva a certeza cantada naqueles dias, de que “nosso lema é ocupar, resistir e produzir”, e de que só sairá reforma agrária com a aliança camponesa e operária. Esta é a homenagem que queremos fazer a esses mortos, estes são os nossos heróis e mártires. Nós reivindicamos plenamente suas lutas, nós as levaremos adiante.

Até a vitória, companheiros!

*advogado que estava em Eldorado na época do massacre

(1) Adílio Alves Rabelo, 57, Altamiro Ricardo da Silva, 42 anos, Amâncio Santos Silva, 42, Antônio Alves da Cruz, 59, Antônio Costa Dias, 27, Antônio (Irmão), Graciano Olímpio Souza (Badé), 46, Joaquim Pereira Veras, 32, João Carneiro da Silva, João Rodrigues Araújo, José Alves da Silva, 65, José Ribamar Alves Souza, 22, Leonardo Batista Almeida, 46, Lourival Costa Santana, 26, Manoel Gomes Souza (Leiteiro), 49, Oziel Aves Pereira, 17, Raimundo Lopes Pereira, 20, Robson Vitor Sobrinho, 25, Valdemir Ferreira da Silva (Bem Te Vi).