O Opinião Socialista entrevistou os dois sírios membros da resistência que luta contra o ditador Bashar Al Assad, que estiveram no II Congresso da ANEL, em Juís de Fora (MG). Abdullah Zoabi, da cidade Daraa, e Thaer Al Thahle, da cidade de Homs, participam do movimento estudantil sírio e relatam como se encontra a resistência e suas impressões sobre o Brasil

Opinião Socialista – Vocês são do movimento estudantil sírio, de uma nova entidade recém organizada. Falem um pouco sobre isso.
 

Thaer Al Thahle – A União dos Estudantes Livres da Síria (UELS) é uma organização estudantil que foi fundada há dois anos atrás em resposta à repressão do regime Assad aos estudantes universitários depois que o regime passou a utilizar a federação estudantil governista, a União Nacional dos Estudantes Sírios (UNE-S), para policiar os estudantes.
A UELS começou como grupos pequenos pelas diferentes cidades sírias, apenas depois se formou um certo grau de coordenação. Começamos com cerca de mil estudantes universitários. Hoje, estamos muito maiores que isto. Nossas atividades no começo consistiam essencialmente em organizar manifestações nas universidades e também nas ruas. Estamos presentes em todos os lugares nas diferentes províncias sírias e ao longo dos últimos meses, formamos sessões no exterior na Arábia Saudita, nos Estados Unidos, na França, etc.
Abdullah Zoabi – As atividades da UELS incluem ajuda humanitária e propaganda, especificamente tentando ligar a luta política com a ajuda humanitária. Distribuímos, por exemplo, cestas de alimentos que incluem panfletos recomendando as famílias a evitar as zonas que sabíamos que estariam sobre ataque militar. As cestas incluem também propaganda revolucionária, para manter o otimismo entre o povo, enfatizando que a revolução trará justiça e um futuro melhor.

Fale sobre a experiência do povo sírio com o regime de Assad

Thaer Al Thahle – Devido aos 40 anos de repressão, o regime Assad tornou a Síria o seu quintal. Assad transformou o país em sua propriedade, submetendo a economia nacional aos ditames de sua própria família. Todas as leis criadas no país serviam apenas a sua família.
O Partido Baath controla toda a economia nacional. Em todas as esferas da educação, da pre-escola às universidades. O Baath monopolizou todo aparato do Estado. A educação, a indústria, a agricultura, todos os setores que deveriam estar a serviço do povo estão há 40 anosnas mãos de sua família. Não temos direitos individuais algum.
O serviço secreto pode entrar em uma rua, prender 10 pessoas, sem nenhum mandato, ou prova. Para nós, o serviço secreto era uma fonte de terror. Não estava lá para nos proteger, mais sim nos aterrorizar e perseguir na maioria dos países do mundo.
Claro, as grandes potências do mundo tiveram um papel muito importante em garantir a manutenção do regime Assad. Até hoje, nenhum país contribuiu para encerrar o derramamento de sangue ou ajudar o povo sírio. Todos os países, grandes ou pequenos, os que dizem que apoiam o regime ou se opõem a ele. Todos, como se houvesse uma conspiração contra o povo, estão contra a revolução. Até hoje, o povo sírio continua abandonado, lutando sozinho.

Qual é a atual situação da resistência armada?

Thaer Al Thahle – A revolução síria optou por táticas pacíficas em seu início. Em Deraa, o berço da revolução no dia 18 de marco de 2011, o povo sírio saiu às ruas exigindo liberdade com flores e ramos de oliva em suas mãos.
Quando a revolução se espalhou, ela ocorreu de forma inacreditável, tomando norte a sul, Banias, Homs, Deraa. Se espalhou para muitas cidades em muito pouco tempo. Mas, infelizmente, após um ano do início dos protestos, fomos obrigados a pegar em armas como vocês veem hoje. A revolução síria é a resistência armada contra um regime que não poderá ser derrubado senão pela força das armas.
É impossível derrubar o regime Assad senão através das armas. Atualmente, a maioria das armas na Síria vem de ataques aos armazéns de armamento do regime. Ninguém nos dará armas em uma bandeja de prata, e não aguardamos mais as grandes potências para nos armar, porque elas têm seus próprios projetos.
Contamos em receber ajuda de indivíduos que são revolucionários e tem seu coração com a revolução síria – e existem muitos deles. Mesmo assim, a maioria do armamento da revolução vem a partir dos ataques aos armazéns do regime, quando o exército livre consegue liberar uma base militar, ou uma escola de oficiais. As brigadas e os soldados do exército livre, atacam batalhões do exército, confiscando assim suas armas. As armas que vem de fora são muito poucas.
 

Abdullah Zoabi – Não podemos nos esquecer que a revolução síria se manteve pacífica por seis meses. Após oito meses, muitos soldados desertaram depois de terem visto o exército se transformar em uma máquina de matar seu próprio povo. Uma grande quantidade de soldados sírios rompeu com o regime, formado assim o chamado Exército Livre.
Cada família, cada rua, cada beco, juntava uma pequena quantidade de dinheiro para apoiar o recém-formado exército livre da síria para se armarem e se protegerem do exército do regime de Bashar Al Assad.
Temos clareza que os governos que até hoje apoiam o regime sírio têm também o sangue do povo em suas mãos. Eles são diretamente responsáveis pela morte e a destruição na síria.

Qual é a avaliação de vocês sobre o congresso na ANEL?
 

Abdullah Zoabi – Nossa experiência aqui no congresso foi muito poderosa. Sentimos de outra forma o que significa a solidariedade internacional. O forte apoio dos estudantes brasileiros da ANEL à revolução, juntos à solidariedade dos estudantes chilenos, canadenses, espanhóis e costa-riquenhos é muito importante. Vimos eles expressarem grande solidariedade com a revolução síria. Foi uma sensação muito bela ver os estudantes vir nos dizer que a vitória da revolução síria é uma vitória para o mundo. Algo importante que sentimos também foi a importância da organização, com a democracia sendo praticada em todos os níveis.

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