Se não tivesse sido assassinado há 25 anos, o mais poético dos Beatles, John Lennon, teria feito 65 anos em 9 de outubro. Figura marcante no cenário cultural e político durante os anos 60 e 70, Lennon ainda hoje é uma referência para a músicaNascido em 9 de outubro de 1945, John Lennon era filho de um homem do mar, como boa parte da população da cidade portuária de Liverpool, na Inglaterra. Era bastante pobre também, como a maioria. Tanto é que, ainda na infância, ele foi entregue aos cuidados de uma tia, já que seus pais, Julia e Alfred, não consideravam ter condições de criá-lo.

A hoje famosa rebeldia do cantor veio à tona ainda na adolescência, em uma série de tumultuados episódios em sua escola secundária, onde também brotou o interesse por outras áreas, que seriam sua marca registrada: um profundo apreço e conhecimento sobre literatura e, obviamente, o envolvimento com a música.

Sua primeira banda, a Quarry Men (os “homens da Quarry”, o nome da escola onde estudava) foi formada antes que ele completasse 15 anos, fortemente influenciada pelo rock norte-americano, particularmente Elvis Presley. Depois de várias mudanças na formação, a banda ganhou impulso em 1957, quando o também adolescente Paul McCartney entrou para a banda, que passou a se chamar Johnny & The Moondogs (“cachorros da Lua”).

Pouco mais tarde, quando a parceria entre Paul e John já atraía a atenção dos boêmios de Liverpool, a banda adotou o nome de The Beatles, uma palavra que estabelece um poético jogo entre beat (“batida” ou “compasso”) e beetle (besouro).

Em 5 de outubro de 1962, a dupla assinou letra e música do compacto Love Me Do / P.S.: I love you, que em poucas semanas estouraria nas paradas de sucesso britânica. Um sucesso que nos oito anos seguintes (parece inacreditável, mas o último disco da banda, Let it be, foi gravado em 1970) transformou o grupo no maior fenômeno da cultura pop de todos os tempos. E o resto é lenda…

Uma lenda da qual um dos personagens mais mitificados foi John Lennon. Um mito alimentado não só por suas posturas radicais e, muitas vezes, inesperadas, como também por seu brutal e totalmente estúpido assassinato, cometido por um fã, no dia 8 de dezembro de 1980.

Coração e mente dos Beatles
Falar dos Beatles e discutir preferências por algum dos “quatro fantásticos” é sempre uma temeridade. Contudo, é muito difícil negar que, do ponto de vista público, John Lennon sempre foi a figura em maior evidência e responsável pela criação do mito em torno da banda, tanto por aquilo que os Beatles deixaram de legado artístico, quanto pelas polêmicas em que se meteram.

Foi de Lennon, por exemplo, o primeiro sucesso “bombástico” do grupo, I want hold your hand, que ganhou o mundo em 1964. Como também foi através das relações de Lennon que os Beatles incursionaram no mundo da maconha e do LSD que, aliás, foi “homenageado” com Lucy in the Sky with Diamonds, em um dos mais maravilhosos e lisérgicos filmes feito pela banda, Yellow Submarine, que transportava a não menos alucinada Sargent Pepper Lonely Heart Band.

Por fim, também são de Lennon as frases e atitudes mais radicais do grupo. Conhecido por sua militância pacifista contra a Guerra do Vietnã e por seu envolvimento em campanhas de solidariedade das mais diversas ao redor do mundo, John Lennon era um “frasista” e tanto, que utilizava sua facilidade com as palavras para opinar sobre temas que vão da defesa da mais ampla liberdade sexual a uma confusa oposição ao imperialismo, passando por críticas generalizadas à sociedade.
Uma das mais famosas de suas frases, diga-se de passagem, ainda hoje é mencionada como exemplo maior de “heresia e blasfêmia”: “O Cristianismo vai acabar. Vai encolher e desaparecer. Somos mais populares que Jesus Cristo. Não sei quem vai acabar primeiro, O Cristianismo ou o Rock ‘n’ Roll”.

Muitos, inclusive, creditam o fim dos Beatles à “boca larga” de Lennon (e, posteriormente, de sua mulher Yoko Ono). Contudo, essa é uma daquelas polêmicas que, de fato, não dá pra se ter idéia de quando vai acabar.

Um pacifista radical
Polêmicas à parte, suas composições, evidentemente, são seu maior legado. Composições que, inclusive, extrapolaram a fronteira dos Beatles, em uma carreira que Lennon desenvolveu com altos e baixos – marcada por ameaças de deportação dos EUA devido ao envolvimento com drogas e à defesa de campanhas políticas radicais e por umas tantas controvérsias relacionadas ao seu sempre conturbado relacionamento com Yoko.

Naquilo que importa de fato, ou seja, suas letras e músicas, é bom lembrar que, além de enorme poesia, elas sempre foram carregadas de uma preocupação com a vida e com aquilo que o ser humano pode ter de melhor: a liberdade e o amor, o direito a uma vida digna e à denúncia de toda e qualquer forma de opressão.

Em Attica State, por exemplo, Lennon canta em seu refrão que somos todos companheiros dos prisioneiros massacrados Ática, em 1971, uma espécie de versão gringa de nosso Carandiru. Em Give peace a change (“dê uma chance à paz”) apesar do tom obviamente “pacifista”, Lennon espinafra quase todo mundo,
rimando “masturbação” com “nações unidas” ou “ministros” com “sinistros”.
Algo semelhante ao que acontece em Revolution, onde o cantor, mais uma vez, declara sua – equivocada – crença na possibilidade de mudança no mundo sem a destruição do velho, mas também reafirma essa necessidade como único caminho para algum tipo de evolução.

Como também é um radicalismo pouco visto entre os “grandes astros” a letra de Sunday, Bloody Sunday, escrita em homenagem aos irlandeses massacrados pelo exército britânico, em janeiro de 1972. Fazendo comparações entre Londres e Roma, Lennon enfrenta o imperialismo de seu próprio país e sai apaixonadamente em defesa dos que deram sua vida pela liberdade.

Uma postura que muito provavelmente surgiu da própria origem de classe de Lennon, algo que ele transformou em música com Working Class Hero (“herói da classe operária”), onde ele se levanta contra todos aqueles que tentam oprimir, amedrontar e paralisar esses heróis do povo.

Trilha sonora de três gerações
Letras e postura política à parte, o fato é que poucos são os artistas que, há mais de 40 anos – e depois de 25 anos de sua morte – continuam a fazer parte, de forma tão intensa, do imaginário e da “trilha sonora” de tanta gente mundo afora.

Afinal, já são pelo menos umas três gerações que cresceram ao som de Help ou Imagine; que dançaram, se comoveram e amaram ao som de uma infinidade de outras tantas letras e músicas.

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