Pichações, em língua creola, contra o FMI e os EUA
Ana Nascimento

Batay Ouvriye é uma organização de sindicatos, associações de trabalhadores e setores populares que batalha pela construção de um movimento de luta autônomo, combativo e democrático no Haiti, como alternativa ao movimento sindical tradicionalBatay Ouvriye liderou uma grande luta nas fábricas têxteis. Como foi isso?
No noreste do Haiti se estabeleceu, com empréstimo do Banco Mundial, uma empresa de capitalistas dominicanos, o Grupo M, para construir uma zona franca, a Companhia de Desenvolvimento Industrial, para aproveitar a mão-de-obra haitiana, a mais barata do continente. Produzem calças e blusas para as marcas Levis Strauss e Sara Lee. O Grupo M já é bem conhecido na República Dominicana, onde tem várias fábricas, por sua violência anti-operária e anti-sindical. Os trabalhadores sofriam a mais descarada dominação por parte dos supervisores: assédio sexual, perseguições, humilhações e, sobretudo, permanente ameaça de sanções e de demissões arbitrárias e ilegais. Um verdadeiro clima de terror (operárias trabalhavam chorando), com um ritmo infernal de produção.

Os trabalhadores se organizaram e, com nossa Inter-Sindical, formaram um sindicato. Todos os seus membros foram demitidos. Então, a luta começou realmente com mobilizações e greves, apoiadas por uma forte, ativa e eficaz solidariedade nacional e internacional. A patronal e o governo utilizaram uma violência sem nome, chegando a introduzir em território haitiano o próprio exército dominicano para atacar os trabalhadores e molestar violentamente até mesmo as mulheres grávidas. Finalmente, por sua perseverança, os operários mobilizados conseguiram a reintegração dos demitidos.

Como foi isso da vacina que aplicaram nos trabalhadores?
O Grupo M injetou neles uma suposta vacina anti-tetânica, sem autorização do Ministério da Saúde. Algumas operárias chegaram a abortar, logo depois da segunda dose! Seria esterilização? Alertada por nós, a União Médica Haitiana fez uma investigação e percebeu coisas estranhas no processo, como datas contraditórias de aplicação, a mistura do conteúdo de duas ampolas, o que não existe em se tratando de vacina e o fato, confirmado, de não haver sido avisada qualquer autoridade pública, nem ter sido explicado aos pacientes o que iam receber como “vacina”, ou ter-se dado ao trabalho de verificar, por meio de análises médicas, se alguém era alérgico a tal substância. Esse fato é de suma importância e mostra, mais uma vez, o grau de dominação bestial dessas empresas capitalistas sobre nossos países.

Qual é o papel do Brasil no seu país?
Com o argumento de “ajudar” o povo miserável, e apoiado por uma certo aproximação cultural, o Brasil trata de enfatizar o aspecto cooperativo de assistência técnica (agrícola, de educação, de saúde). Mas, na verdade, a presença das tropas brasileiras e argentinas está mesmo é garantindo o projeto macabro do Brasil de conseguir um lugar no Conselho de Segurança da ONU e construir, com a Argentina, um novo pólo de força na América Latina.

Garantir o projeto imperialista no Haiti é preparar o caminho para uma abertura econômica sangrenta das multinacionais, que estão explorando uma mão-de-obra que hoje é, por um atroz processo de desvalorização, a mais barata do hemisfério. Brasil e Argentina estão participando de uma dominação militar e política dos maiores países imperialistas, particularmente os EUA, com vistas a uma exploração extrema por parte das transnacionais, por cima de todos os direitos básicos dos trabalhadores.

A seleção brasileira de futebol participou desse jogo?
Foi uma demagogia típica dos governos populistas. Aristide teria feito o mesmo. O povo haitiano, que vive em uma desgraça profunda, se identifica com o futebol brasileiro, por ser, primeiro, vitorioso, mas também tão bonito e criativo. Cada campeonato que o Brasil ganha é comemorado aqui com festas populares parecidas com o carnaval. Lula sabe dessa identificação. Por isso, aproveitou esse “túnel” para tratar de diminuir o repúdio à ocupação e melhor operar sua própria penetração diplomática e técnica no Haiti.
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