Redação

Passado um ano do criminoso rompimento da Barragem de Fundão, na mina de Germano, da empresa Samarco, pouca coisa foi feita em toda a região atingida. O empreendimento era realizado pela Samarco em conjunto com a BHP Billiton, a maior mineradora do mundo, e a Vale, a segunda maior.

Após a comoção causada e a repercussão internacional, lentamente as empresas e os setores do Estado ligados à mineração foram tomando conta do processo e, como sempre, descarregando nas costas dos trabalhadores e da população todas as consequências do crime que eles cometeram.

A Samarco, por conta da comoção pública causada por sua irresponsabilidade, se viu obrigada a alugar casas para os moradores de Bento Rodrigues, distrito de Mariana (MG). A partir daí, todos os prazos que a empresa se comprometeu para reconstruir um novo Bento Rodrigues foram descumpridos. Hoje, a promessa é entregar as 600 casas para os moradores em 2018.

Tão desrespeitoso quanto isso é o fato de a empresa, finalmente, alcançar um de seus objetivos: o de fazer uma barragem de contenção sobre o que antes foi o distrito de Bento Rodrigues.

Por anos, a Samarco propôs aos moradores daquela localidade que eles vendessem seus lotes para que a região fosse usada para este fim. Sempre teve sua proposta negada. Agora, com a tragédia, a empresa conseguiu seu objetivo, e já tramita a autorização nos órgãos fiscalizadores.

Rio morto
O Rio Doce continua morto. Serão necessárias décadas para sua recuperação. Pescadores, famílias camponesas e pequenos agricultores perderam seu sustento. A presença de metais pesados, como chumbo e alumínio, contamina o abastecimento de cidades e a agricultura. Até agora, a mineradora nada fez para reverter a situação.

Além disso, passado um ano do desastre, ninguém foi punido, e a empresa recorreu das multas irrisórias a que foi condenada. A recente notícia de que 26 executivos da Samarco responderão criminalmente pelo acidente é uma resposta tardia a um fato conhecido de todos: o de que a empresa não cumpriu os requisitos técnicos para a construção da Barragem do Fundão e lançou na mesma uma quantidade de rejeitos muito superior ao declarado.

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FOTO: Leo Fontes


Mais de dois mil foram demitidos depois do acidente

Não foram só os moradores de Bento Rodrigues que arcaram com as consequências do crime da Samarco. Mais de dois mil trabalhadores terceirizados foram demitidos nos três meses subsequentes ao rompimento da barragem. No início de 2016, a empresa fez um acordo de lay-off com o sindicato que representava os trabalhadores da empresa, em que se comprometeu a garantir estabilidade por mais três meses após o fim do acordo. A Samarco simplesmente não cumpriu o acordo. Preferiu pagar uma multa e abrir um processo de demissão vountária (PDV) que levou outros 700 trabalhadores, desta vez da própria empresa, a perderem o emprego.

Tudo isso foi feito sob as barbas do Ministério do Trabalho e com sua conivência. A fiscalização do ministério concluiu que havia razão para a interdição da empresa por razões de segurança no trabalho. Porém isso não foi feito sob a alegação de que a empresa já estava embargada por razões ambientais. O embargo ou interdição da empresa por razões de segurança no trabalho garantiria a estabilidade no emprego, como mínimo a todos os trabalhadores diretos, pelo período da interdição. Contudo, o mesmo não ocorre no caso da interdição por problemas ambientais.

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O que fazer com a mineração no Brasil

O acidente da Samarco gerou três tipos de reações distintas entre a população e os setores de esquerda, em especial sobre o que se deveria fazer.

Um setor importante daqueles que militam no setor de mineração, em especial nos movimentos sociais mais ligados a ONGs e de setores populares, como o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Atingidos pela Mineração (MAM) e Atingidos pela Vale, aprofundaram seu discurso antimineração.

Não é uma posição exclusiva do Brasil. No Peru, no Chile e no Equador, como mínimo, existe um amplo movimento que defende que as grandes mineradoras, os chamados mega-projetos, devem ser proibidos em nome da preservação da natureza e de se impedir acidentes como o que ocorreu em Mariana.

No polo oposto, uma parcela razoável do movimento sindical da Vale, e junto com ele a prefeitura de Mariana e, num primeiro momento, o governo do Estado de Minas, defenderam que a Samarco também era vítima e deveria continuar funcionando a qualquer preço para defender os empregos da região e garantir a renda oriunda da mineração e, consequentemente, o funcionamento da prefeitura e do comércio local.

No entanto, depois que a Samarco atacou os trabalhadores, o sindicato foi obrigado a reconhecer que a empresa era culpada, mas defendendia que ela voltasse a funcionar para garantir emprego e renda para os trabalhadores.

O grande problema dessas posições é que elas ignoram os interesses dos trabalhadores.

Por um lado, defender hoje o fim de todos os projeto minerais significa jogar milhares de trabalhadores numa situação de penúria, pobreza e desemprego.

Por outro lado, defender a volta do funcionamento da empresa e a continuidade do funcionamento da Vale nas atuais condições é ignorar que desastres como o da Samarco podem voltar a acontecer, ceifando vidas e destruído cidades, poluindo rios e solos.

Nós defendemos que, na atual situação, é impossível que os grandes projetos mineradores sejam paralisados. Se fossem, os trabalhadores e a população mais pobre das cidades mineradoras seriam os principais atingidos. A mineração, como é praticada no Brasil e em boa parte do mundo, é extremamente poluente e predatória.

A tragédia em Mariana ocorreu porque as mineradoras só estão interessadas em lucrar e, por isso, não realizam manutenção das barragens, burlam medidas de segurança e utilizam técnicas mais baratas para extração do minério, o que causa enormes problemas ambientais. Não é verdade, porém, que esta é a única forma de minerar. É possível empregar outros métodos mais seguros e com menos impactos ambientais que preservem a vida dos trabalhadores. 

SAÍDA

PUNIR RESPONSÁVEIS E ESTATIZAR A MINERAÇÃO

justice PUNIÇÃO
EXEMPLAR
Em primeiro lugar, é preciso punir todos os responsáveis pela Samarco e seus sócios da Vale e da BHP, sejam altos executivos, sejam altos funcionários responsáveis pela fiscalização. Tem de ser garantido, também, o ressarcimento e a indenização a todas as vítimas (moradores do Bento Rodrigues e das comunidades e cidades atingidas pela destruição e trabalhadores que foram demitidos).
justice-scale READMISSÃO
E DIREITOS
É necessário exigir que todos os trabalhadores, diretos e terceirizados, sejam readmitidos, tenham seus direitos reconhecidos retroativamente, desde a data do acidente, e tenham estabilidade no trabalho até que a empresa volte a funcionar.
mechanic FISCALIZAÇÃO PELOS
TRAALHADORES
É necessário que as grandes minas tenham comissões de trabalhadores eleitos com poder para exercer o direito de recusa coletiva toda vez que constatarem que uma operação põe em risco os funcionários. Também defendemos que as comunidades diretamente atingidas pela mineração tenham o direto de opinar sobre o funcionamento das empresas mineradoras.
capitol ESTATIZAÇÃO
O desastre deixou claro que os altos executivos da Samarco não têm a menor condição de administrar qualquer tipo de projeto de mineração. Sua sede por lucros resulta na diminuição dos custos de produção (infraestrutura, segurança, contratação e qualificação da mão de obra). Por isso, defendemos a imediata estatização da mina de Germano.
Para impedir novas tragédias, também defendemos a estatização de todo o sistema de mineração do país. É preciso lembrar que a mineração brasileira foi privatizada nos anos 1990 a preço de banana num dos negócios mais fraudulentos da história. A estatização da Samarco e a reestatização das empresas de mineração (Vale e CSN) sob controle dos trabalhadores, ou seja, com os trabalhadores decidindo sobre o ritmo e a forma de trabalho e com as comunidades afetadas participando e opinando, é a única forma de garantir que crimes como estes nunca mais voltem a acontecer.

 

Por Jerônimo Castro