Movimento de operários no Rio de Janeiro por emprego e direitos aposta na unificação das lutas

Essa é a palavra de um trabalhador que não tem mais nada a perder porque já nos roubaram tudo: nosso salário, nossa condição de sustentar nossas famílias, só não nos roubaram nossa dignidade, porque isso carregamos com a gente“. A fala marcada pela indignação e ao mesmo tempo uma impressionante disposição de luta do soldador Bruno Oliveira, 32, mostra bem um processo que vem ocorrendo no Rio de Janeiro desde 2015 e que cresce a cada dia.

O movimento SOS Emprego começou a partir da mobilização de operários das terceirizadas do Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro) demitidos sem receber salários ou qualquer direito. “Quando fechamos a ponte Rio-Niteroi em fevereiro de 2015, reivindicando que a Alusa pagasse nossos salários, vimos a necessidade de nos juntarmos para lutar por nossos direitos“, explica ao Opinião Socialista o também soldador Alexandre Lopes, 40. Ele se refere à mobilização que parou a ponte e foi notícia nacional no ano passado.

O movimento, cujo nome “SOS” é inspirado no movimento grevista dos bombeiros do Rio em 2012, foi se organizando e se espalhou para outras categorias. Hoje, reúne centenas de operários demitidos do Comperj, dos estaleiros fechados recentemente no estado, operários da Reduc, pescadores, de cidades como Duque de Caxias, Volta Redonda, Itaboraí, Niterói, além da capital.

As reuniões realizadas nos bairros costumam aglutinar dezenas de trabalhadores. “A princípio nossa luta era contra o calote, mas fomos vendo a necessidade de lutar também por emprego, por direitos, contra as injustiças, contra o próprio governo e o Ministério do Trabalho que só ajuda o patrão“, conta Lopes.


Operários do Comperj fecham a ponte Rio-Niteroi em fevereiro de 2015

“Se não lutarmos, viramos escravos”
Os ataques vinham de todos os lados, a gente via o trabalhador passar fome, muitos colegas doentes, caindo de depressão“, relata o encanador industrial Antônio Pedro, de 61 anos, desempregado há 1 ano e oito meses. “A gente achou então que tinha que construir um instrumento de luta, que é o SOS Emprego“, explica. “Aqui no Brasil, se a gente não lutar, vai voltar a escravidão, mas a escravidão legalizada, aquela que você trabalha, mas não recebe“.

Longe de ser um exagero, o termo escravidão resume bem a situação de milhares de trabalhadores submetidos a condições subumanas e mandados para a rua de uma hora para outra com meses de salário atrasado. E quando se trata de uma trabalhadora, a situação é ainda pior. “Somos nós, mulheres, as mais prejudicadas“, afirma Núbia Lemos, 39, ex-trabalhadora terceirizada dos estaleiros Brasa e Mauá, que se define como “mãe e pai” dentro de casa.

Cipeira do estaleiro Brasa, Núbia foi expulsa duas vezes. A primeira, quando reclamou das condições de trabalho. Conseguiu voltar, mas foi expulsa uma segunda vez quando uma colega de trabalho desmaiou ao seu lado por falta de ventilação na cozinha. Conseguiu emprego no estaleiro Mauá, mas também foi demitida sem nenhum direito. “Não tinha ventilação, tínhamos que descer o lixo por quatro andares porque não podia usar o elevador“, relata. Com o nome na “lista de exclusão” das empresas, não consegue mais trabalho.

O dia 6 de julho no Rio
Para além da luta contra o calote e por trabalho, o SOS Emprego vem cumprindo um importante papel de unir as diversas categorias em luta no Rio. Exemplo disso ocorreu no último dia 6. “Fomos nas assembleias das categorias, conversamos com os professores do Sepe, porque a nossa luta é de todo mundo“, afirma Bruno. “Precisamos é construir uma greve geral, e ampliar esse movimento para todo o país“, opina Núbia.

No dia 6 de julho, o movimento encabeçou um dia de mobilizações e paralisação no estado que reuniu diversas categorias. “Tinha gente que chegou pra mim e disse: eu me lembro de vocês lá atrás com o carro de som protestando, e agora estou na mesma situação!”, conta Alexandre. “Nosso movimento está abrindo os olhos da classe operária“, diz.

A pauta do SOS Emprego hoje vai da retomada das obras no Rio, contra os calotes, a lista de exclusão da Petrobrás, até os altos salários dos parlamentares. “Dizem que não tem dinheiro para pagar os servidores no Rio, mas ninguém fala que não tem dinheiro para pagar os salários dos deputados”, reclama o assessor do Sindipetro-RJ, Moreno, que acompanha o movimento desde o início. Os operários também fazem questão de afirmar a disposição de nacionalizar essa luta. “Não é o problema do Rio, o desemprego, a fome, a injustiça, é do Brasil”, denuncia Alexandre.

Já existe um calendário de luta nas Olimpíadas que prevê manifestação e o corte de estradas.

Exemplo
O movimento reúne operários de várias regiões e categorias, mas com um ponto em comum: a certeza de que a união da classe trabalhadora, a auto-organização e a luta são o único caminho para resolver essa situação. Isso que garante a disposição de luta de pais e mães de família obrigados a sobrevivem de cestas básicas e doações de sindicatos, alguns há mais de um ano.

Quando eu vou para a luta, não sou eu sozinho, é minha família toda comigo, a nossa força é maior que um leão e um urso juntos“, exemplifica Bruno.

Publicado no Opinião Socialista nº 521