As últimas eleições foram um duro teste para as organizações e partidos que estão na oposição de esquerda ao governo Lula. Continua existindo até agora uma conjuntura de crescimento econômico, embora a crise internacional se aproxime cada vez mais, e sem grandes lutas. Isso levou a uma maré eleitoral que favoreceu tanto o governo federal como as prefeituras, diminuindo o espaço para a oposição de esquerda.

A resposta a esse tipo de situação é um teste importante para qualquer partido que queira ser uma real alternativa pela esquerda tanto contra o governo Lula como perante a oposição de direita. Vale a pena ver como se saíram o PSTU e o PSOL nesse teste.

Em algumas cidades foi possível uma frente de esquerda, mas em outras…
O PSTU propôs uma frente de esquerda, independente da burguesia, sem a participação de partidos da direita nem financiamento das empresas. Uma frente com um programa antiimperialista, expressando as necessidades dos trabalhadores e de oposição aos governos (tanto federal como estaduais e municipais). Essa frente se concretizou em 11 capitais e várias outras cidades de peso no país, e teve importância para apresentar uma alternativa perante os dois pólos dominantes da burguesia.

Em outras tantas cidades foi impossível fazer uma frente de esquerda porque o PSOL rompeu o critério de independência de classe e fez alianças com partidos burgueses como em Macapá (com o PSB de Camilo Capiberibe) e em Porto Alegre (com o PV). Em outras, ainda, foi impossível porque o PSOL simplesmente quis impor critérios inaceitáveis como impedir o acesso do PSTU à TV (Maceió) ou não reconhecer o peso do PSTU na definição das candidaturas (Natal e Florianópolis).

O PSTU sai destas eleições fortalecido em sua estratégia e em suas relações políticas com setores importantes da vanguarda e das massas dos trabalhadores e estudantes. Ampliamos nosso peso político e, além disso, tivemos boas votações em algumas cidades, apesar de não termos eleito nossos candidatos.

O PSOL que sai das eleições
O PSOL que sai das urnas de outubro tem o fortalecimento claro de sua ala direita dominante. O núcleo dirigente do PSOL, que inclui as correntes MTL-MES-APS, foi quem bancou a aliança com o PV em Porto Alegre e com o PSB em Macapá. Essa direção sai fortalecida com a votação de Luciana Genro em Porto Alegre (quase 9%, a maior que o partido obteve) e a passagem em primeiro lugar da candidatura de Capiberibe para o segundo turno.

O PSOL elegeu alguns vereadores nestas eleições, embora bem menos do que planejavam. A quase totalidade dos eleitos está ligada a esse bloco majoritário, incluindo Heloísa Helena em Maceió. A ala esquerda do PSOL teve pouco espaço no partido e sofreu também uma derrota eleitoral.

Isso só fortalece o caminho desse partido de se transformar num “novo PT”. O vale-tudo eleitoral foi reafirmado pelas urnas? Então está legitimado.

Isso significa a aceitação pelas outras correntes do financiamento da candidatura de Luciana Genro pela Gerdau, que causou uma crise no meio da campanha, logo abafado pelo “sucesso” eleitoral. A Gerdau é uma grande empresa, que sempre investe muito no financiamento das campanhas eleitorais.

Em 2006, a Gerdau fez uma bancada de 27 deputados federais, segundo levantamento do jornal Valor Econômico, incluindo candidaturas da base do governo Lula e também da oposição de direita. Tem a mesma postura dos bancos, das grandes empresas da construção civil e das multinacionais automobilísticas de financiar campanhas. Assim, influencia no programa e depois nos mandatos.

A relação entre dependência financeira e dependência política é inevitável. A burguesia faz isso há centenas de anos com sucesso. Os partidos, para manter as contribuições, vão moderando o programa e a política, para evitar qualquer choque com os financiadores. Negar isso é desconsiderar a compreensão marxista de que a existência material determina a consciência. Mais ainda, é deixar de lado a experiência trágica vivida por dezenas de milhares de ativistas com a trajetória do PT.

A própria campanha de Luciana é uma demonstração dos efeitos políticos e programáticos desse rumo. Pegando a onda governista, Luciana usou e abusou das imagens de Tarso Genro, seu pai e ministro de Lula. Defendeu mais polícia nas ruas para acabar com a violência e evitar que Porto Alegre se transformasse no Rio de Janeiro, bem ao gosto de um setor da classe média gaúcha.

O segundo turno com um partido governista em Macapá
Em Macapá, a presença do PSOL com o candidato a vice-prefeito, Randolph Rodrigues, na chapa de Camilo Capiberibe é outro grande passo à direita.

A família Capiberibe é uma das mais tradicionais na política do Amapá. O pai, João Capiberibe, foi prefeito da capital, governador do estado por dois mandatos e depois senador, tendo sido cassado por compra de votos em uma jogada de um grupo político adversário.

O PSB é um partido que está na base de sustentação do governo Lula e Camilo Capiberibe fez sua campanha apoiando o governo federal. Passou para o segundo turno em primeiro lugar e existe uma chance real de chegar à prefeitura.

A presença do PSOL nessa aliança, e provavelmente na gestão Capiberibe, colocará este partido em uma prefeitura governista, na base de sustentação do governo Lula.

Diferenças dentro da Frente de Esquerda
Em outras cidades, mesmo com a existência da Frente de Esquerda, as diferenças entre a campanha do PSTU e do PSOL foram claras. Havia uma diferença fundamental porque não existiam alianças com partidos burgueses nem financiamento de grandes empresas. Mas nem por isso não houve grandes diferenças.

Enquanto a campanha do PSTU tinha um conteúdo anticapitalista e de apoio às greves, o eixo da campanha de Ivan Valente, em São Paulo, foi o “Valente”, algo completamente despolitizado. O de Chico Alencar, no Rio, era que ele “faz a diferença”. Pior ainda, em Belém, a campanha do PSOL fez a defesa intransigente do mandato na prefeitura de Edmilson Rodrigues (hoje no PSOL, antes no PT), e não se diferenciou do governo federal “porque tem muita popularidade”.

Essa é a perspectiva do PSOL?
O financiamento pela Gerdau da campanha de Luciana e a aliança com um partido burguês e governista em Macapá foram dois passos no curso à direita do PSOL. Ambos foram legitimados pelas urnas. Agora podem ser, com mais facilidade, aceitos pelas outras correntes do partido.

Esse seria um erro gravíssimo porque foi exatamente o rumo do PT, em que tudo se justificava pelo crescimento eleitoral. As vitórias na realidade são sinais de adaptação ao nível de consciência da maioria das massas (que por sua vez é determinada pelas classes dominantes) e pelas regras da democracia burguesa, como a aceitação das alianças com qualquer um e o financiamento das grandes empresas. Tudo em nome do realismo eleitoral.

É assim que a democracia burguesa vai moendo e incorporando partidos. Foi assim com o PT e está sendo assim com o PSOL.

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