Segundo o dicionário Michaelis, machismo é “um comportamento de quem não admite a igualdade de direitos para o homem e a mulher”. No campo político, definir o machismo exige mais complexidade. Para nós, o machismo é uma ideologia criada pela sociedade de classes para manter a propriedade privada, servir à dominação e também à exploração.

Uma forma de opressão
Chamamos de opressão toda conduta ou ação para transformar as diferenças em desigualdades, de forma que estas sejam utilizadas para beneficiar um determinado grupo em relação a outro. Quando isso se dá entre brancos e negros, chamamos de racismo. Entre homens e mulheres, denominamos machismo.

A opressão se expressa de várias formas. Na piada que ridiculariza as mulheres por sua condição de mulher: “dirige mal, só podia mesmo ser mulher”. Na diferença salarial entre homens e mulheres: hoje, em nosso país, uma mulher ganha até 30% menos que um homem. Na agressão física, verbal ou psicológica. No Brasil, a cada dois minutos, cinco mulheres são agredidas.

Uma ideologia
Mas o machismo não é só fruto de uma conduta individual. É uma ideologia, ou seja, um sistema de ideias falsas que criam uma falsa verdade utilizada pelo sistema para manter a dominação e ampliar a exploração. A principal ideia é a de que as mulheres são inferiores aos homens e, portanto, não podem assumir determinadas tarefas ou ter determinados comportamentos.

É através dessa ideologia que se naturaliza o fato de que as mulheres são as “rainhas do lar”, têm por obrigação cuidar dos filhos, da casa e dos maridos sem nada receberem por isso. Essa ideologia é transmitida pela escola, pelas famílias, pelas igrejas, pelos meios de comunicação e por todas as instituições que reproduzem o sistema capitalista. De tanto ser reafirmada passa a ser natural, comum, imutável.

No caso de Eliza Samúdio, que se relacionou com o jogador Bruno (que está preso sob a acusação de tê-la matado), a delegada que a atendeu em uma de suas primeiras denúncias de ameaça de morte não enquadrou o caso na Lei Maria Penha, alegando que a lei tinha sido feita para “defender a família”. Como ela não se encaixava nos padrões (era uma “maria chuteira”), tratava-se de violência comum. Esse é um bom exemplo de como a ideologia é utilizada e reproduzida.

Uma criação da sociedade de classes
A opressão (o machismo) não existiu sempre. Foi criada para justificar a divisão da sociedade em classes. Nas sociedades comunistas primitivas, as mulheres, junto com os homens, cuidavam das atividades domésticas e participavam da produção social.

Com o aparecimento da sociedade de classes, a instauração da propriedade privada e a necessidade de acumulação e herança, era preciso dividir as famílias e instituir a monogamia para preservar a propriedade privada. Com isso, as mulheres foram retiradas dos espaços públicos, da produção e da sobrevivência, e jogadas no espaço doméstico. Assim, foram proibidas de trabalhar, estudar e participar de atividades políticas.

O machismo sustenta o capitalismo
A luta das mulheres por igualdade de direitos obrigou o capitalismo a trazer as mulheres para a produção social novamente. A possibilidade de as mulheres se libertarem do espaço doméstico foi uma grande conquista. Mas, como toda conquista no capitalismo, foi por ele apropriada de maneira a favorecer a exploração e seus lucros. E as ideologias que antes eram utilizadas para manter a “mulher no lar” passaram a ser utilizadas para justificar jornadas excessivas de trabalho e salários mais baixos.

Ao mesmo tempo, o capitalismo se apropriou do papel que a mulher cumpria antes, fazer as tarefas domésticas, e o naturalizou. Assim, a mulher manteve a obrigação de cuidar dos afazeres domésticos e também passou a trabalhar fora. Isso faz com que elas tenham dupla ou tripla jornada. E quem se beneficia disso é o capitalismo.
Essa mecânica é muito positiva para os patrões, pois, enquanto as mulheres cuidam dos filhos e têm essa responsabilidade, o Estado e os patrões se desobrigam e economizam. Não precisam construir restaurantes, creches e lavanderias públicos.

Transferem para os trabalhadores – neste caso, mais especificamente, para as trabalhadoras – a responsabilidade que seria do Estado. Trabalham de graça não para o marido, mas para o sistema.

Quando o homem trabalhador trata sua mulher, também trabalhadora, como uma empregada, que tem a obrigação de cuidar das tarefas da casa sozinha, está reproduzindo essa ideologia do patrão, a serviço de manter o lucro dele. Se faz isso de maneira grosseira, usando a violência física ou psicológica, é pior ainda. Reproduz, com o uso da força, o poder da ideologia, deixando claro que as mulheres têm de obedecer e se resignar frente às agressões. Portanto, essa mentira do capitalismo é um falso privilégio para os homens, pois os grandes privilegiados são os patrões.

É certo que os homens podem imediatamente se beneficiar dessa condição. Porém, se são socialistas e querem derrubar o sistema, precisam também enfrentar a mão do capital dentro do lar, porque o que se reproduz não é uma relação entre duas pessoas, mas sim os interesses do capitalismo.

Combater o machismo é necessário
Para que a luta contra os patrões e governos seja vitoriosa, ela não pode ser feita com apenas metade dos trabalhadores. Hoje as mulheres já são metade da classe trabalhadora, e no Brasil são a maioria. Não conseguiremos nunca unificar todos os trabalhadores se desqualificamos as mulheres, se não observamos que há demandas específicas, se não incorporamos suas reivindicações e não as ganhamos para a luta.

A ideia de que essa discussão “divide a classe” ou que tem de ser feita “depois da revolução” é falsa e serve apenas para manter o capitalismo. O que divide a classe é o machismo, porque ele desqualifica as mulheres, coloca os homens contra as mulheres e as mulheres contra as próprias mulheres.

Superação do machismo é a superação da sociedade de classes
Marx, Lênin e Trotsky colocaram a luta pelas reivindicações das mulheres como uma das principais tarefas dos trabalhadores, desde o Manifesto Comunista. Isso continua atual.

É necessário dar um combate permanente ao machismo, dentro dos partidos políticos, das entidades de luta do movimento e em nossa vida cotidiana para que possamos ser vitoriosos.

Mas é também preciso não ter a ilusão de que podemos acabar com ele no capitalismo. Nessa luta temos duas tarefas: combatê-lo, corrigi-lo e buscar evitá-lo com todas as nossas forças. A outra é nos organizarmos, homens e mulheres, para derrotar a sociedade de classes e, com ela, o machismo.

Post author Ana Pagamunici, da Secretaria Nacional de Mulheres do PSTU
Publication Date