Como tudo na vida, o calor tem um impacto para os ricos, e outro para os pobres


O verão ainda nem chegou, e a temperatura já está nas alturas. Nos últimos dias, os termômetros em Porto Alegre chegaram a marcar 42°C. Segundo os institutos de pesquisa, o verão de 2014/15 promete ser o mais quente desde 1880, quando se começou a medir a temperatura. Isso mesmo, o mais quente desde mais de um século atrás.
 
Como tudo na vida, o calor tem um impacto para os ricos, e outro para os pobres. Os patrões não sofrem, como os trabalhadores, as consequências do calor. Os graúdos da sociedade não pegam ônibus e trem lotado sem ar condicionado. Não precisam esperar em filas, às vezes no sol. Não enfrentam os apagões de energia elétrica e de água, comuns no verão. Para a classe operária, até quando vem chuva, que é um alívio, depois vêm os problemas dos temporais de verão, que são outro pesadelo: enchentes, casas destelhadas, móveis e eletrodomésticos perdidos.
 
Mas o pior é o trabalho. A classe trabalhadora, que passa quase 12 horas do seu dia trabalhando pra sobreviver e ganhar o pão de cada dia, precisa enfrentar o inferno todos os dias. O que acontece nas fábricas é o maior exemplo disso, com sensação térmica chegando até 60ºC na linha de produção. Quem sofre é a peãozada, pois a chefia trabalha no ar condicionado.
 
Entre nós, operários, há também os superprejudicados: aqueles que trabalham no tratamento térmico, forjaria, fundição etc. Trabalhando à beira de fornos e caldeiras de cerca de 1.000°C, o parâmetro de calor é outro. Essa semana mesmo, um colega brincou: “se a fábrica é o inferno de quente, o tratamento térmico é a cozinha do capeta”.
 
Toda a classe trabalhadora sofre muito com o calor. A classe operária, em particular forneiros e pedreiros, sofrem muito mais. As mulheres operárias sofrem ainda mais. Vítimas do calor terrível do chão de fábrica, são ainda vítimas de dezenas de preconceitos e machismo praticado por colegas e chefes. Ao menor sinal de levantarem a blusa ou arregaçarem as mangas, são taxadas de “vagabundas”, por estarem “se mostrando”, e ficam expostas aos olhos da peãozada bárbara e bruta e, também, da chefia. Muito mais comum que no inverno, no verão, em que as roupas são mais curtas, as mulheres operárias precisam enfrentar mais esse terrível obstáculo.
 
O fato é que a classe operária é submetida a condições de trabalho desumanas. Trabalha porque não tem alternativa. Muitos preferem se submeter ao terror das cozinhas do capeta porque algumas empresas pagam um pouco mais de insalubridade. O que dói é saber que poderia ser diferente. Há tecnologia suficiente para automatizar boa parte das forjarias, fundições etc., diminuindo a exposição às mais altas temperaturas. E isso não é tudo: existe muita tecnologia para atenuar os efeitos do calor em ambientes como esse, tal como revestimento duplo e isolante térmico especial para as caldeiras e roupas autoclimatizantes.
 
Além dessas medidas, há outras muito simples que já melhorariam, ao menos um pouco, a vida do peão. Trocar as telhas de zinco e Brasilit* por telhas de barro, aumentar o pé direito dos pavilhões, permitindo uma maior circulação de ar, instalar sistemas de climatização ou, ao menos, ventilação e umidificação. Muitas vezes, é uma briga para conseguir coisas mínimas, como água gelada no bebedouro ou um ventilador. Para os operários que trabalham em situações especiais, é preciso também algumas medidas imediatas especiais, como isotônico gelado liberado e intervalo remunerado de dez minutos a cada hora trabalhada.
 
Porém, no sistema em que vivemos, de um lado estão os patrões, do outro os peões. Temos interesses opostos que nunca se combinarão. Assim, para termos melhores condições de trabalho, precisamos impor isso aos patrões. Eles não nos darão de mão beijada. Eles, por outro lado, se puderem, vão nos impor um ritmo cada vez maior nas piores condições e com os menores salários.
 
Nós operários devemos exigir dos patrões medidas para atenuar o calor. Todas as medidas possíveis, desde a água gelada até um sistema de climatização nas fábricas. Devemos ter consciência de que eles só pensam no lucro. Para eles, o peão bom é o peão que produz. Nada mais importa. A lógica deles é o lucro e a ganância. Tudo que conseguirmos será obra de nossa luta contra eles.
 
A nossa guerra contra os patrões é muito maior do que a batalha para atenuar o calor. Mesmo que consigamos impor aos empresários que comprem alguns míseros ventiladores para a linha de produção, eles darão um jeito de tirar na outra ponta, como no plano de saúde, na alimentação, na PLR ou seja lá no que for.
 
Assim, não há saída senão lutar até o fim para derrotar os patrões e deles tomarmos as fábricas e toda sociedade. Mesmo sendo nós que, com nossas mãos e corposm, produzimos tudo o que existe na sociedade, do alfinete ao avião, eles exploram a gente e ficam com praticamente tudo que produzimos, e nós vivemos uma vida miserável.
 
A nossa guerra contra os patrões é uma guerra de classe contra classe, de peão contra patrão. Nós somos a esmagadora maioria e podemos vencer. Mas, para isso, devemos nos organizar e lutar! Operários e operárias, se organizem! Lutem contra os patrões! A nossa classe unida pode e vai vencer!
 
 
* Telhas de Cimento Reforçado com Fios Sintéticos