Em seis meses de governo, política de comunicação da presidência aprofunda o Bolsa Imprensa e concentra ainda mais as verbas em publicidade

Desde que assumiu interinamente em maio deste ano, Temer e seu governo privilegiou ainda mais a grande imprensa com os repasses de verbas publicitárias. É o que mostram os números da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República sobre os investimentos diretos em propaganda do governo.

A comparação da política de comunicação dos seis primeiros meses do governo Temer (de maio a outubro) com o mesmo período de 2015, quando Dilma ainda estava no cargo, não mostra nada de surpreendente, embora existam diferenças. Isso porque a chamada “bolsa imprensa” não está na mira dos cortes de gastos.

Pelo contrário. Mesmo considerando apenas as propagandas da presidência, ou seja, sem considerar o que as empresas estatais gastam, os números da Secom mostram que houve um aumento de quase R$9,8 milhões nos gastos com publicidade. Outra diferença com relação ao mesmo período de 2015 é o fato de que essa verba está muito mais concentrada nos grande jornais impressos.

Pagando a conta
Isso mostra que o governo Temer tem pagado bem pelo apoio recebido do jornalismo domesticado. Segundo os dados da Secom, os jornais impressos tiveram um aumento de 95% nos repasses de verba (de R$2,74 milhões para R$5,34 milhões).

O jornal Valor Econômico foi o que teve a maior variação: um aumento de 174% (de R$126 mil para R$347 mil). Para a Infoglobo, que edita o jornal O Globo, o aumento foi de 113% (de R$310 mil para R$660 mil). Estadão aumentou 91% (R$197 mil para R$377 mil). E, por último, a Folha de S. Paulo, com o modesto aumento de 78% no repasse de verbas (de R$240 mil para R$426 mil).

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Internet e mídia alternativa
No ambiente virtual, Temer tem seguido a mesma receita. Houve um aumento de R$3,7 milhões (40%) em publicidade online. Aqui, tal como nos jornais impressos, os grandes beneficiados são os portai tradicionais, como o UOL (ligado ao grupo Folha), Yahoo! e os portais dos grandes jornais.

A concentração é ainda maior se lembrarmos do fato de que, assim que assumiu, Temer mandou “passar o pente-fino” nos gastos com publicidade. Na prática, tratava-se de eliminar o financiamento de todo blog e veículo considerado petista. Nas palavras de Temer, “publicidade não deve financiar opinião, mas sim produtos jornalísticos de interesse público”. Blogs como o de Luís Nassif, o de Paulo Henrique Amorim, portais como o Diário Centro do Mundo e revistas, como a Carta Capital, foram os mais prejudicados.

Rádio e TV
A mesma comparação, entretanto, para rádio e TV mostram uma diminuição dos repasses. Para o rádio, as verbas caíram 20% (R$2,7 milhões) e para a TV, 13% (R$6,8 milhões).

Isso não se deu de forma igual, é claro. Enquanto os repasses caíram para rádio de TV Globo (-59% e -35%, respectivamente), Cultura (-47%), Record (-21%) e SBT (-12%), os pagamentos para a TV Bandeirantes aumentaram 192% (de R$ 1 milhão para R$3 milhões). Temos que lembrar, porém, que ao contrário de Dilma, Temer não insistiu nos pronunciamentos públicos após ser alvo do primeiro panelaço.

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Outdoor financiado pelo governo Temer, logo que assumiu

Os pontos fora da curva
Por fim, as mudanças nas publicidades em revistas e em mídia externa (como outdoors) são as mais gritantes. Sobre essa última, basta dizer que às vésperas da eleição o governo Temer aumentou em 1850% os gastos com cartazes, outdoors e afins. Em agosto de 2015, foram gastos cerca de R$125 mil. Já em agosto de 2016, esse valor salta para R$2,4 milhões.

Maior ainda foi o repasse para as revistas, onde houve um aumento gigantesco. De R$40 mil em 2015, os investimentos em publicidade nas revistas aumentaram para R$5,15 milhões. Aqui, mais uma vez, o grande beneficiado é o oligopólio. A Editora Abril, que mantém revistas como Veja, Exame e Istoé, teve suas receitas engordadas em 286%, chegando a quase R$600 mil. A Editora Globo, que não recebeu nada de maio a outubro de 2015, recebeu R$500 mil em 2016.

O mais inusitado, no entanto, são os repasses para a Revista Caras. Aquela de fofoca sobre gente rica. Os R$ 13,5 mil que recebeu em 2015 nem se comparam ao R$1,34 milhão recebido em 2016. Um aumento de quase 9700%.

As ilusões no PT
Uma análise parecida com essa foi feita pelo jornalista Miguel do Rosário, do blog O Cafezinho. Ela também se apoia nos números da Secom e foi, inclusive, tema de capa de uma edição recente da revista Carta Capital. Mas ao contrário dos defensores do PT, não vemos nisso uma virada política ou a prova cabal de que Temer e a grande imprensa conspiram.

Primeiro porque o argumento do golpe midiático não passa de desculpa para os erros do PT. Em seus três primeiros governos, o PT gastou R$6,5 bilhões de reais com a Globo, postergou as discussões sobre a regulamentação da mídia, a criação de uma TV pública e só beneficiou os grandes grupos empresariais da imprensa.

Segundo, porque a política de comunicação do governo Temer é continuidade da política aplicada pelo PT. Em parte da análise publicada no Cafezinho, 2016 é comparado com 2015, sugerindo uma comparação entre governos. No entanto, isso faz com que os números atribuídos ao governo Temer fiquem inflados justamente pelos primeiros meses de 2016, quando Dilma ainda era presidente. Ou seja, ao invés de provar uma suposta diferenciação, faz o contrário e mostra que a política de comunicação do PT beneficiava a grande imprensa tanto quanto o governo Temer.

Além disso, absolutamente todos os contratos de publicidade executados pelo governo Temer não passam de renovações dos contratos firmados pelo PT, em licitação aberta em 2011. Ou seja, no penúltimo ano do primeiro governo Dilma.

É verdade que s governos Temer e Dilma não são iguais no que diz respeito à politica de comunicação e a relação com a grande imprensa. Não é possível, no entanto, dizer que são completamente diferentes. As medidas de Temer soam gritantes, mas não passam de uma reorientação, muito conveniente, da política do bolsa imprensa aplicada por mais de uma década pelos governos petistas.

 
Repasse de verbas publicitárias por tipo de mídia
MÍDIA 2015 (Mai-Out) 2016 (Mai-Out) Variação
TV R$ 51.091.784,55 R$ 44.277.311,42 -13%
Rádio R$ 13.383.440,52 R$ 10.675.950,14 -20%
Internet R$ 9.305.513,75 R$ 13.039.743,22 40%
Jornal R$ 2.732.526,66 R$ 5.340.045,53 95%
Revista R$ 40.694,40 R$ 5.165.379,83 12593%
Mídia Alternativa R$ 390.622,79 R$ 223.196,87 -43%
Mídia Externa R$ 441.533,50 R$ 8.455.956,51 1815%
TOTAL R$ 77.386.116,17 R$ 87.177.583,52 13%

Fonte: Secom

Repasse de verbas publicitárias por veículo
MÍDIA 2015 (Mai-Out) 2016 (Mai-Out) Variação
TV Globo R$ 27.436.113,65 R$ 17.922.586,48 -35%
SBT R$ 5.187.409,31 R$ 4.572.273,54 -12%
Record R$ 7.058.743,49 R$ 5.598.974,73 -21%
TV e Rádio Cultura R$ 584.784,00 R$ 307.323,20 -47%
Bandeirantes R$ 1.036.879,21 R$ 3.023.697,29 192%
Infoglobo (O Globo) R$ 309.238,37 R$ 659.531,63 113%
Folha de S. Paulo R$ 240.350,28 R$ 426.975,92 78%
Estadão R$ 197.328,07 R$ 377.220,64 91%
Valor Econômico R$ 126.860,99 R$ 347.518,08 174%
Editora Abril R$ 150.676,41 R$ 581.699,73 286%
Editora Caras R$ 13.687,28 R$ 1.340.704,00 9695%
Caros Amigos R$ 77.157,68
Editora Globo R$ 499.992,23
Rádio Globo R$ 554.716,06 R$ 226.169,98 -59%
UOL (grupo Folha) R$ 742.969,03 R$ 691.473,00 -7%

Fonte: Secom

Por Romerito Pontes, da redação